domingo, 22 de setembro de 2013

40 anos sem Pablo Neruda

Pablo Neruda: 40 anos da sua morte

No dia 23 de setembro de 1973, poucos dias depois do golpe de estado, patrocinado pelo general Pinochet , que interropeu o governo socialista de Salvador Allende e o assassinou,  morria o poeta, diplomata, humanista e militante chileno Pablo Neruda. Nascido aos 12 de junho de 1904 como como Neftalí Ricardo Reyes Basoalto, assumiu o psudônimo de Pablo Neruda, em homenagem ao escritor tcheco Jan Neruda.
Durante as eleições presidenciais do Chile nos anos 70, Neruda abriu mão de sua candidatura para que Allende vencesse, pois ambos eram esquerditas e acreditavam numa América Latina mais justa.. De acordo com Isabel Allende, Neruda teria morrido de "tristeza" em setembro de 1973, ao ver dissolvido o governo de Allende.  Sua história foi ao cinema em 1994, com o filme O Carteiro e o Poeta. Eis uma bela crônica de Eduardo Galeano (O Século do vento. Memória do fogo, vol. 3, L&PM, Porto Alegre, 2010, p. 293-294).

No meio da devastação, em sua casa também despedaçada a golpes de machado, jaz Neruda, morto de câncer, morto de pena. Sua morte não era suficiente, por ser Neruda homem de meuito sobreviver, e os militares assassinaram suas coisas: transformaram em lascas de madeira sua cama feliz e sua mesa feliz, estriparam seu colchão e queimaram seus livros, arrebentaram seus lustres e as garafas coloridas, suas cerâmicas, seus quadros, seus caracóis. Arrancaram os ponteiros e o pêndulo do seu relógio de parede; e no retrato de sua mulher, cravaram uma baioneta num olho.

De sua casa arrasada, inundada de água e barro, o poeta parte para o cemitério. Parte escoltado por um cortejo de amigos íntimos, encabeçados por Matilde Urrutia. (Ele tinha dito a ela: “Foi tão belo viver quando você vivia”).

Quarteirão após quarteirão, o cortejo cresce. De todas as esquinas somam-se pessoas, que se põem a caminhar apesar dos caminhões militares cheios de metralhadoras como pontas de um espinheiro, e de guardas e soldados que vão e vêm, em motociletas e carros blindados, metendo ruído, metendo medo. Atrás de uma janela, uma mão saúda. No alto de um terraço, ondula um lenço.

Hoje faz doze dias do golpe, doze dias de calar e morrer, e pela primeira vez ouve-se a Internacional no Chile, a Internacional sussurrada, gemida, soluçada mais que cantada, até que o cortejo se faz procissão, e a procissão se faz manifestação, e o povo, que caminha contra o medo, desanda a cantar pelas ruas de Santiago a viva voz, com voz inteira, para acompanhar como se deve Neruda, seu poeta, em sua viagem final.

Terminemos com um poema do nosso grande poeta, que deu como título à auto-biografia, que foi publicada em 1975, após a sua morte, algo que é como um testemunho e um programa de vida: “Confesso que eu vivi”.

Foi sangrenta toda a terra do homem.
Tempo, edificações, rotas, chuva,
Apagam as constelações do crime,
O certo é que um planeta tão pequeno,
Foi mil vezes coberto de sangue,
Guerra ou vingança, armadilha ou batalha,
Caíram homens, foram devorados,
Depois o esquecimento foi limpando
Cada metro quadrado: alguma vez
Um vago monumento mentiroso,
Às vezes uma cláusula de bronze,
Depois conversações, nascimentos,
Municipalidades e o esquecimento.
Que artes temos para o extermínio
E que ciência para extirpar lembranças!
Está florido o que foi sangrento.
Preparar-se, rapazes,
Para outra vez matar, morrer de novo,
E cobrir as flores com sangue.

(Últimos Poemas. Porto Alegre: L&PM, 1997)

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