quinta-feira, 11 de dezembro de 2014

Vivendo o advento

Testemunho e ação (João 1.6-8, 19-28)

Para o quarto evangelista a figura de João é interessante não só, nem em primeiro lugar, sob a perspectiva histórica. Ela o é, antes, em sentido querigmático: João é protótipo, exemplo, prefiguração da autêntica testemunha de Jesus. Considerando que o ser testemunha faz parte da vocação apostólica da Igreja e de todos os seus membros (cf. At 1.8; 1 Jo 1.1; etc.), João Batista se torna, neste sentido específico, modelo de existência cristã. Isto significa:
1.        A testemunha não salva. Importa resistir às tentações messiânicas que afetam particularmente as pessoas de sucesso religioso. Quem conseguiu constituir uma comunidade de fiéis sabe do perigo. Consiste em atribuir a si próprio a obra do Espírito Santo, colocar-se no lugar de Deus, considerar-se dono do saciado. Ora, a testemunha não é o Cristo! A rejeição de qualquer titulação respectiva por João é, por um lado, demonstração da devida modéstia. Deus resiste aos soberbos.
Portanto, cuidado com pretensões descabidas. E, no entanto, não é somente Humildade que se expressa na atitude de João. Ela documenta, acima de tudo, Verdade: pode o ser humano salvar? Tal pretensão se desmascara como ilusão o mais tardar frente à morte. Ninguém pode substituir o Deus salvador que, em Cristo, se fez carne. Cristãos não salvam ninguém. Quem conta o número de almas que salvou, está blasfemando o nome do Senhor.
2.        A testemunha, isto sim, encaminha as pessoas à salvação. Sabe onde consegui-la. Tem um endereço. Aponta para a luz, assim como a lua aponta para o sol. A humildade de João, que rejeita as glórias messiânicas, de modo algum significa autonegação. Também a lua brilha. Mas ela reflete a luz que recebeu. Está desonerada de produzir luz própria.
Assim o ser humano está dispensado de produzir o divino por forças próprias. Como testemunhas podemos permanecer humanos. Isto não legitima o pecado, mas confere a liberdade para admiti-lo e para buscar perdão. Não temos necessidade de aparentar o que não somos. Temos dignidade, não obstante. Ela resulta do amor de Deus que vem resgatar sua criatura (cf. Jo 3.16).
3. Testemunho se dá por palavra e ação, melhor: por uma maneira de ser. A pregação de João, seu batismo, sua vida no deserto, tudo conflui em seu testemunho. Embora sejam escassas as informações que o quarto evangelho fornece sobre o modo de ser e viver de João, há que se considerar este horizonte. De qualquer maneira, seria errôneo restringir o testemunho a uma questão meramente verbal. O texto colateral de 1 Ts 5.16-24, contendo parênese, lembra dessa verdade. O testemunho inclui a vivência. O que se exige não é a perfeição. Esta não escapa do perigo de ser hipócrita. Importante mesmo é deixar claro o quanto a própria testemunha vive da fonte à qual remete as pessoas.
4. A salvação é obra de Deus, não das testemunhas. Não será esta uma posição por demais cômoda? Poderia desresponsabilizar a Igreja e a comunidade pelo mal que há no mundo. É forte o clamor na América Latina por construtores do reino de Deus, ou seja, por pessoas que se engajem em favor da paz e da justiça, motivadas pelo amor aos fracos e explorados. Ora, o texto não dispensa as testemunhas de sua responsabilidade social. Seria um grosseiro mal-entendido. Verdade é que não se deve confundir o reino de Deus com um projeto humano. Nisto o texto é categórico. Quem tentar implantar o divino neste mundo frustrar-se-á. Vai até mesmo tornar-se cruel e desumano. O ser humano não pode construir o reino de Deus nem salvar o mundo. Mesmo assim, não é pouco o que dele se espera. Resume-se naquele endireitar o caminho do qual fala o v. 23.
Gottfried Brakemeier

http://www.cebi.org.br/noticias.php?noticiaId=5261

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