sexta-feira, 14 de agosto de 2020

ANO A | TEMPO COMUM | SOLENIDADE DA ASSUNÇÃO DE MARIA | 16.08.2020

Maria é símbolo profético da humanidade liberta e solidária.
A Assunção de Nossa Senhora é uma festa mariana que, para as comunidades católicas do Brasil, está ligada à semana dedicada às vocações à vida consagrada. Mas aquilo que cremos sobre Maria não tem a ver exclusivamente com os religiosos e religiosas: de alguma forma, se refere a todos os homens e mulheres, à Igreja, ao povo de Deus. A glorificação de Maria, que é a plena realização de sua vida e sua vocação, é uma interpelação e uma promessa extensivas a todos os homens e mulheres.
Lucas nos apresenta Maria como uma mulher que sabe ouvir a Palavra de Deus e está pronta a dar o melhor de si para que ela se realize na história. Maria ousou acreditar na força da Palavra e na fidelidade daquele que a pronuncia. Deus pôde realizar grandes coisas através de Maria porque encontrou nela a base humana madura. Não fazemos bem quando a idealizamos, tirando-a da história. Para fazer-se humano, o Filho de Deus precisou de uma pessoa humana, não de uma criatura angélica e desencarnada do mundo!
Depois da experiência de ser amada e de ser chamada a gerar e dar à luz aquele que é a Luz do mundo, Maria vai apressadamente à casa de Isabel. Busca um sinal que confirme a parceria de Deus com os humildes, sua aliança com os pobres e a veracidade de suas promessas. A discípula se faz serva, a serva se faz peregrina e a peregrina experimenta a hospitalidade de Isabel. Abraçadas pelo amor de um Deus que não esquece sua misericórdia, duas mulheres profetizam publicamente. A discípula, serva e peregrina se transforma em profetiza destemida. Maria contempla a história do seu povo e proclama a intervenção libertadora de Deus.
É importante destacar que Maria de Nazaré, esta mulher que foi elevada e assunta ao céu, não é apenas uma humilde trabalhadora do lar, uma pessoa discreta que acredita em Deus, uma doce e recatada esposa de um carpinteiro. Deus assume em corpo e alma e eleva à glória do céu uma mulher que rompe com os costumes que menosprezam a mulher e a mantêm calada, que diz uma palavra profética na arena pública, que proclama uma revolucionária intervenção de Deus num mundo patriarcal e opressor. Ela já havia usurpado o título masculino de “Servo de Deus” e agora abre a boca para falar em nome de Deus, como os profetas.
Por isso, Maria simboliza uma Igreja com traços femininos. Nela e com ela, a Igreja é chamada a construir-se como corpo social diversificado que acolhe, aquece, alimenta, ensina, respeita e favorece o crescimento e o amadurecimento dos filhos e filhas. Uma Igreja institucionalmente rígida, fechada, autoritária, legalista e doutrinária tem pouca relação com a figura feminina de Maria. Com Maria e suas companheiras mulheres é possível construir uma Igreja que viva intensamente a alegria do Evangelho, que deixe de ser alfândega e tribunal para ser lar e enfermaria que sai para acolher e cuidar, como quer o Papa Francisco.
Inspirada em Maria, a vida consagrada, e a Igreja como um todo, precisa criar espaços e condições favoráveis ao desenvolvimento de homens e mulheres maduros, livres, despojados, solidários e comprometidos com a salvação do mundo. Um corpo ou uma instituição que se impõe pelo medo e pela lei seria um corpo estéril, desprovido da graça de sentir os filhos e filhas saltarem de alegria no seu ventre. Seria um corpo incapaz de conhecer a riqueza da diversidade, e permaneceria um túmulo de homens e mulheres que não chegam a nascer verdadeiramente. Deus nos livre de uma Igreja com nome feminino mas com estruturas masculinas!
Na origem da vocação à vida consagrada está a experiência de um Deus que olha nos olhos e, sorrindo, chama homens e mulheres pelo nome. Ou uma experiência como aquela de Maria e de Isabel: “Alegra-te, cheia de graça! O Senhor está contigo!” A partir dessa experiência, os pés percorrem caminhos e os corpos estremecem de alegria por terem recebido inesperadamente a visita de Deus na própria casa. A vocação à vida religiosa não é primariamente um caminho de purificação moral ou de desprezo do mundo, mas a experiência de plenitude de uma graça que não cobra méritos: dar de graça aquilo que de graça se recebeu.
Maria, profetiza corajosa, mãe amorosa e discípula fiel do teu Filho: intercede junto a ele para que as pessoas que se consagram a Deus sejam ouvintes e servidoras da Palavra, cresçam no serviço aos pobres e amadureçam na profecia. Que sejam fiéis ao chamado de proclamar com a vida e com palavras que nada pode ser colocado acima do amor pessoal a Jesus Cristo e aos pobres nos quais ele vive. Assim, elas ajudarão Jesus a vencer a morte que ameaça seus irmãos e irmãs, que não se reduz à luta contra a corrupção. E que se façam ativa e corajosamente presentes nos desertos, nas periferias e nas fronteiras. Assim seja! Amém!
Itacir Brassiani msf
Livro do Apocalipse 11,19.12,1-6 | Salmo 44 (45)
Primeira Carta de Paulo aos Coríntios 15,20-27| Evangelho de São Lucas 1,39-46

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