João 7,1-13: Os irmãos de Jesus lhe disseram: Tu deves sair daqui...
Antes de acolher e compreender o texto em questão quero me deter num breve texto do capítulo anterior (Jo 6,42), pois ele pode iluminar nossa reflexão sobre Jo 7,1-13. Quando Jesus se apresenta como ‘pão que desceu do céu’, as autoridades o criticam e questionam: "Esse não é o filho de José? Nós conhecemos o pai e a mãe dele. Como é que ele diz que desceu do céu?" Qual é o problema das autoridades do judaísmo? O que é que provoca escândalo?
A pedra de escândalo é a humanidade concreta de Jesus. E é precisamente nesta carne e neste sangue, recebido de sua família, de sua condição humilde e de sua linhagem que está o Espírito que faz dele a presença ativa de Deus na terra. As autoridades, fixadas na Lei, separam Deus do homem e são incapazes de reconhecer um Deus encarnado, próximo e vizinho. Para eles, a condição familiar e humana de Jesus é um problema.
A perícope de Jo 7,1-14 está literariamente situada na parte maior do ‘sexto dia’, que apresenta a obra messiânica realizada por Jesus (Jo 2-19). Mais proximamente, se localiza na terceira seção dessa primeira parte, seção que mostra Jesus chamando à vida em mais uma festa fadada ao fracasso. E isso acontece depois da multiplicação dos pães, da autoapresentação de Jesus como pão da vida e da debandada de muitos discípulos (cf. Jo 6,66).
João nos informa que, por causa dos repetidos enfrentamentos com o judaísmo em geral e com as autoridades do templo em particular, Jesus evita andar pela Judéia e que as autoridades querem matá-lo (v. 1). Ele prefere andar discretamente pela Galiléia, onde se sente mais à vontade e seguro. O relato diz que "os irmãos de Jesus" (a expressão grega adelphos pode ser traduzida por: parente próximo ou colateral; sua gente; seu pessoal; sua família) pressionavam-no a ‘sair’ da Galiléia e subir para a Judéia e tornar-se famoso. Parece que ‘seu pessoal’ é gente da Galiléia, judeus de raça, que não crêem em Jesus. Contrastam com a figura da mãe, que representante do Israel que esperava a realização das promessas.
Os parentes propõem que Jesus entre na instituição velha e estéril do judaísmo e atue a partir do estreito horizonte dela. Mas Jesus sabe que o caminho que leva à vida em abundância só pode ser a sua kénosis pessoal e o ‘êxodo’ das malhas do judaísmo, esgotado e incapaz de produzir liberdade e vida. Propõe este caminho aos discípulos, e eles, com todas as dificuldades e incompreensões previsíveis, se dispõem a percorrê-lo. ‘O pessoal de Jesus’ não pertence ao grupo dos discípulos e nada espera de Jesus, a não ser fama e sucesso, mesmo quando a popularidade de Jesus estava em baixa: fora abandonado por muitos discípulos, desacreditado pelos próprios parentes e perseguido pelas autoridades.
No final do capítulo 7, depois de um discurso empolgado e ousado dentro do templo, no dia mais solene da festa (cf. Jo 7,37-39), algumas pessoas reconhecem o messianismo e o profetismo de Jesus. Mas levantam objeções porque sabem que ele vem da Galiléia, e isso é mau sinal e desautoriza qualquer pretensão. Lembremo-nos que os fariseus chamam Nicodemos de galileu, atribuindolhe com isso uma condição vulgar e desprezível (cf. Jo 7,52).
Com que traços poderemos caracterizar a família de Jesus a partir do texto analisado? É uma família que não consegue compreender e aceitar o messianismo de Jesus. Uma família que pertence ao judaísmo fechado e inflexível e está em função de sua reprodução. Uma família que está em contradição com a mãe que, representando o resto fiel de Israel, é capaz de fazer a passagem para o novo povo, nascido da nova aliança selada no corpo e no sangue de Cristo.
Pe. Itacir Brassiani msf
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