Ideais sem força
É inegável que da descoberta de valores, mormente
quando vividos e experienciados, emanam convicções, certezas e motivações que levam
a traçar ideais consistentes e suscitam uma forte mística, capaz de imprimir
dinamismo invulgar no ser humano. Os avanços em qualquer dimensão da nossa vida
dependem de ideiais fortes, e para estabelecer tais ideais é necessária a
descoberta de valores. A eleição e a decisão por determinados valores supõe e
requer que estes sejam discernidos com suficiente conhecimento (coleta de
informações), com reflexão crítica e com objetividade (valores objetivos), e
que sejam significativos para a pessoa (valores subjetivos).
Para buscar, definir e, especialmente, abraçar tais
valores é necessário, primeiro: ter a coragem de administrar a própria vida,
de ser autônomo (independente) frente ao julgamento alheio; de assumir a responsabilidade
pessoal na condução da própria vida e de pagar o preço pelas opções feitas. Em
segundo lugar: superar o medo à liberdade, este medo instalado no nosso
inconsciente e que pode nos tolher a coragem de assumir valores transcendentes
(a entrega de si mesmo a Deus e ao próximo, o amor solidário, etc.) e gerar o
medo frente às exigências aparentemente excessivas dos valores e dos
compromissos definitivos.
A emancipação e o rompimento com todas as formas de
dependência nos comprometem profundamente, exigem a coragem de “ser quem somos”,
de assumir a própria identidade, de enterrar posturas de ódio, de superar
individualismos, narcisismos e egoísmos, de pôr fim a apegos e dependências que
nos dão a falsa sensação de segurança interior e nos levam a evitar a mudança e
a conversão.
O fato é que não nascemos livres, mas tornamo-nos
livres, somos chamados à liberdade. A liberdade não é apenas um direito
de cada pessoa: antes, é uma tarefa, um processo de libertação, de autonomia,
de construção de uma personalidade adulta, consciente, emancipada, responsável.
Quanto mais livres formos, mais capazes seremos de assumir valores exigentes e
de administrar a própria vida segundo os valores eleitos. Tudo isso, porém, é
condicionado e ameaçado pelo medo inconsciente à liberdade. Por isso, as opções
e ideais de vida podem tornar-se anêmicos, podem perder a força, tornarem-se inconsequentes
e inconsistentes, expostos à mercê dos ventos e marés das nossas emoções, das
paixões incoscientes.
Seria viável uma vida consagrada sem um ideal forte e
maduro? Creio que somente um forte ideal torna possível uma autêntica vida
religiosa: uma vida celibatária pobre, casta e obediente; o zelo e o ardor
pastoral e a disponibilidade missionária; a presença solidária e a atuação
junto aos excluídos; a inserção evangélica como pobre e com os pobres; a
dioturna fidelidade ao projeto pessoal e comunitário de vida; a busca e a
aceitação de entreajuda fraterna; a vivência do discipulado no seguimento
apaixonado de Jesus Cristo.
Quando nossos ideiais não têm ou perdem sua força,
nossa vida corre o risco de tornar-se vazia de sentido; passamos a viver sem
ânimo, sem brilho nos olhos, sem alegria no rosto; a pastoral se torna
cansativa, simples obrigação e ofício; a vida religiosa vira um mar de amargas
renúncias, uma frustração existencial; o auto-cultivo e o PV (Projeto de Vida) parecem
uma imposição externa, e o PEP (Plano Estratégico da Província) dá a sensação
de ser uma intromissão indesejável na nossa vida.
Então, o que fazer para que assim não seja, e para que
sejamos pessoas com ideais com grande força, capazes de mover montanhas? O que
fazer para recuperar o vigor dos nossos ideais de vida?
Pe. Rodolpho Ceolin msf
(Pelas referências ao PV e ao PEP, assim como o
fenômeno da falta de ideiais fortes, estas notas manuscritas parecem ter sido
preparadas pelo Pe. Ceolin para a formação dos junioristas, no início da década
passada.)
Nenhum comentário:
Postar um comentário