Jesus nos dá vida, seu estilo de vida, sua própria vida!
Depois
de 40 dias de preparação, eis que se abrem as portas de uma semana que vale uma
vida. Com ramos e flores, faixas e bandeiras e cânticos reunimo-nos nas ruas e
templos para aclamar nosso líder manso e humilde. “Bendito aquele que vem em
nome do Senhor!” Só alguém infinitamente grande é capaz de fazer-se tão pequeno
e próximo. Na celebração que abre a Semana Santa somos convidados acompanhar
Jesus no seu caminho de fidelidade, de oferta generosa da sua vida e realização
plena da vontade do Pai. Deus se recusa a dar uma esmola à humanidade: ele se dá
a si mesmo em Jesus de Nazaré e, no seu corpo e sangue, assina uma parceria com
prazo indeterminado.
Para
entender o relato da entrada de Jesus em Jerusalém temos que abandonar todas as
fantasias de poder e de sucesso. Ela não tem nada de triunfal. Jesus vem da
Galiléia e entra na capital do seu país, economicamente e politicamente
dominado por Roma, montado num jumento. Nada de cortejos de honra, nem de
generais e cavalos vistosos ou de gestos de cortesia a grandes senhores. Como
diz o hino de Paulo, Jesus chega a Jerusalém como sempre foi: um servidor, um
simples homem, esvaziado de interesses egoístas e radicalmente obediente às
necessidades dos outros.
Depois
de uma longa caminhada, o profeta galileu chega à capital do país caminhando à
frente de um numeroso, entusiasmado e, às vezes, desconcertado grupo de
discípulos e discípulas. O povo do campo o aclama como filho e herdeiro de
Davi. “Bendito o Rei que vem em nome do Senhor!” Era um coro de pessoas que,
como o velho Simeão, sabiam reconhecer num indignado e revolucionário Aquele
que vem em nome de Deus e atualiza sua ação libertadora. Mas isso contrasta com
a fria acolhida por parte do povo de Jerusalém e com o medo indisfarçável dos
próprios discípulos.
O
grupo que acolhe e acompanha Jesus na entrada nada triunfal em Jerusalém saúda
o despontar do reino messiânico inspirado em Davi e a chegada do líder enviado
por Deus. Ele, porém, não realiza as ações impressionantes que muitos
esperavam. Chegando perto da capital amada e cantada em prosa e verso, Jesus a
contempla de longe e chora, lamentando o fechamento à profecia e o apego às
leis e demais instituições. Ele é o servo paciente e o ouvinte atento da
Palavra do qual fala Isaías. E é dessa escuta que brota uma palavra que
desperta os adormecidos e encoraja os acorrentados pelo medo.
A
entrada de Jesus montado num jumento é uma poderosa sátira aos libertadores
militares, conhecidos no passado, temidos no presente ou esperados para o
futuro. Mas o entusiasmo suscitado naquele pequeno grupo de gente interiorana
não durará muito tempo. Os gritos de ‘hosana’ logo serão substituídos pelo
insolente ‘crucifica-o’, fruto da frustração do povo e da manipulação das
autoridades. O grupo mais exaltado dos discípulos solta a voz e o proclama o
Messias esperado, mas Jesus faz questão de demonstrar seu messianismo pobre e
manso e entra montado muito a gosto num jumento.
A
divisão entre os discípulos e a possibilidade de traição não fazem Jesus mudar seu
plano. É verdade que ele se sente abatido e chega a se perguntar sobre o rumo a
seguir. No momento crucial, depois da festa de acolhida e da ceia de despedida,
enfrenta um discernimento difícil e pede aos discípulos que fiquem com ele e
vigiem. É um exercício de confronto
profundo com a vontade do Pai, com a missão escrita em caracteres confusos e
exigentes. Para os discípulos de todos os tempos, a oração continua sendo um
espaço para discernir com retidão e coerência os caminhos que levam à vida em
abundância.
Aclamemos
com jovial alegria e convincente esperança o mestre e profeta Jesus de Nazaré.
Acompanhemos de perto seus passos, acolhamos seus gestos, escutemos suas
palavras. Superemos a tentação de segui-lo de longe e de evitar maiores riscos,
como fizeram Pedro e os outros. Não esqueçamos que tantos discípulos e
discípulas pelos séculos a fora permaneceram com ele, comungaram seu destino e
se tornaram semente. Entre estes está o nosso querido e incompreendido Dom Oscar Romero, cujo martírio recordaremos
no próximo dia 24 e cuja santidade o povo já reconheceu.
Jesus de Nazaré, filho e herdeiro de
Davi, messias servidor e humilde: diante de ti dobramos os joelhos e estendemos
nossas vestes e ramos. Te oferecemos nosso corpo para que entres hoje em nossas
praças e cidades, para anunciar com timbre de sino a dignidade daqueles que não
a têm reconhecida e assegurada. Não deixes que a aclamação que fazemos na
liturgia seja negada pelas nossas atitudes. Ensina-nos de novo a sagrada lição
da Ceia e da Paixão: que não existe maior prova de amor que cuidar da casa
comum e doar a vida por quem amamos. E dai-nos a graça da vigilância e da
perseverança. Assim seja! Amém!
Itacir Brassiani msf
(Profecia de Isaías 50,4-7 * Salmo 21 (22) * Carta aos Filipenses 2,6-11
* Lucas 19,28-40 e 22,14-23,56)
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