A missão da Igreja é
uma imensa obra de misericórdia!
No
evangelho de hoje, Jesus fala sobre a oração, tema muito apreciado por muitos
cristãos. Mas Jesus não insiste
propriamente na quantidade da oração, mas na oração perseverante, na confiança
em Deus. Ou seja: não se trata apenas de ‘rezar sempre’, mas de ‘nunca
desistir’ de rezar. O próprio Jesus não foi uma espécie de monge dedicado
exclusivamente à oração, e os discípulos que deram prosseguimento à sua missão,
conjugaram equilibradamente o anúncio do Evangelho com muitas iniciativas em
favor das pessoas da comunidade ou de fora dela e com a prática da caridade e a
oração.
Para
entender a parábola proposta por Jesus no evangelho deste domingo precisamos
dar um passo atrás e situa-la no seu contexto literário. Assim, percebemos que
vários versículos são dedicados à questão da vinda do Reino de Deus (cf. Lc
17,20-37). Misturando a linguagem direta com a linguagem apocalíptica, Jesus
ensina que o Reino de Deus não aparece de forma ostensiva e espetacular, mas é
uma surpresa que se esconde em todas as ações e movimentos de solidariedade. E
a súplica da viúva da parábola tem seu foco implícito na súplica e na expectativa da manifestação da justiça do Reino de Deus.
É
importante lembrar também que, na Bíblia, a viúva é o protótipo da pessoa pobre
e abandonada, do sujeito que está no limite da sobrevivência e não tem com quem
contar. A tais pessoas pertence o direito de clamar a Deus. Quem clama são os
oprimidos e os pobres; os poderosos e ricos apenas reclamam. E Deus jamais se
mostrou indiferente ao clamor de quem, dia e noite, suplica diante dele. A
passagem paradigmática continua sendo aquela do livro do Êxodo: “Os israelitas
continuavam gemendo e clamando sob dura escravidão. E os gritos de socorro
devidos à escravidão subiram até Deus” (Ex 2,23).
Por isso,
podemos afirmar que Jesus não quer propriamente chamar a atenção para a questão
da oração contínua, e nem apenas o seu conteúdo. A parábola está focalizada na
eficácia do clamor dos pobres e injustiçados, daqueles que pedem
perseverantemente a intervenção de Deus. Fazendo referência ao juiz que, mesmo
não tendo fé, atende ao clamor da viúva, Jesus nos interroga: “E Deus, não fará
justiça aos seus escolhidos, que dia e noite gritam por ele? Será que vai
fazê-los esperar?” O próprio Jesus responde à pergunta: “Eu vos digo que Deus
lhes fará justiça bem depressa.”
Jesus é
pessoalmente a mediação da socorro de Deus, mas não é o único. Todas as pessoas
que creem em Deus são mediadoras da sua resposta aos clamores pela vinda do seu
Reino. Mesmo que, muitas vezes, nós mesmos estejamos entre aqueles que clamam
quase desesperadamente, na medida em que aderimos a Jesus Cristo somos
responsáveis também pela resposta de Deus aos clamores dos outros. Continuamos
a pedir “venha o teu Reino”, mas não podemos enterrar os talentos que
recebemos. Jamais podemos esquecer o exemplo do samaritano da conhecida parábola...
“Vai e faze tu a mesma coisa.”
A oração
cristã – tanto aquela que fazemos individualmente como as celebrações
comunitárias dos sacramentos – é sempre um exercício de ruptura com o
fechamento e a confiança absoluta em nós mesmos e de progressiva abertura à
vontade de Deus, que é, ao mesmo tempo, surpreendente e libertadora. A oração é
um exercício humano e espiritual que tenta aproximar a nossa vontade da vontade
de Deus, que procura deslocar o centro em torno do qual gira a nossa vida de
nós mesmos para o advento Reino de Deus, para a vida plena ou do bem viver para
todos.
A eficácia
da oração se mostra claramente não apenas nem principalmente no atendimento
automático desse ou daquele pedido, mas no alargamento e no aprofundamento da
nossa consciência, do nosso modo de ver as coisas. A oração nos ajuda a tomar
consciência da ação de Deus que está em curso na história e das possibilidades
escondidas nela e em nós mesmos. Mas também nos eleva como que ao alto da cruz
para que, assumindo uma perspectiva essencialmente cristã, sintonizemos com
todas as criaturas que clamam por uma libertação que ainda não se realizou.
Dai-nos, Jesus, missionário do Pai, a confiança e a
perseverança orante daquela viúva que não tinha com quem contar. Torna tua
Igreja cada vez mais radicalmente missionária, uma
Igreja que sai de si e vai ao encontro dos irmãos e irmãs empurrados para as
periferias, para testemunhar a eles a tua misericórdia. Ajuda-nos e pedir, sem
cansar, que venha o teu Reino. Envia irmãos e irmãs que sustentem nossos braços
cansados. Leva-nos até o alto da tua cruz para que, sintonizados com todos os
clamores, desçamos aos caminhos da história para iluminá-los com o nosso
testemunho. Assim seja! Amém!
Itacir Brassiani msf
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