quarta-feira, 31 de outubro de 2012

Uma destruição massiva: a geopolítica da fome (14)


A ONU incluiu o direito à alimentação entre os Direitos Humanos (cf. artigo 25). É na perspectiva da luta por esse direito, um dos mais violados, que publico aqui uma série de breves textos sobre o escândalo da fome e o direito humano à alimentação. São informações e reflexões que simplesmente traduzo e resumo do recente livro Destruction massive. Géopolitique de la faim, de Jean Ziegler, relator especial da ONU para o direito à alimentação, de 2000 a 2008.
O livro foi publicado em outubro de 2011, pela editora Seuil (Paris).

As políticas hediondas patrocinadas pelo FMI.

“Há duas décadas, as privatizaçõers e a liberalização do movimento de mercadorias, serviços, capitais e patentes cresceram de modo impressionante. De um golpe, os Estados pobres do Sul se viram profundamente destituídos de suas prerrogativas em termos de soberania. As fronteiras comerciais desapareceram, os setores públicos – inclusive hospitais e escolas – foram provatizados. E por todo o mundo, as vítimas da subalimentação e da fome aumentam.

Um estudo sério e respeitado da Oxfam (Oxford Commitee for Famine Relief) demonstra que em todos os lugares onde o FMI aplicou, no curso dos anos 1990 a 2000, seus ‘planos de ajustamento estrutural’, novos milhões de de seres humanos foram precipitados no abismo da fome.

A razão é simples: o FMI é o organismo encarregado pela dívida externa de 122 países do terceiro mundo. Esta dívida atingiu, em 31 de dezembro de 2010, a cifra de 2,1 trilhões de dólares. Para pagar os juros e parcelas dessa dívida junto aos bancos credores ou ao FMI, os países tinham necessidade de divisas. Os grandes bancos financiadores se recusavam a receber o pagamento em moeda haitiana, boliviana, etc.

Como um país do Sul da Ásia, dos Andes ou da África negra pode assegurar os valores dos quais necessita? Exportanto bens manufaturados ou matérias-primas, cujo pagamento será em moeda estrangeira.

Periodicamente, o FMI concede aos países endividados uma moratória temporária ou um refinanciamento das dívidas. Mas a condição é que os países devedores se submetam ‘planos de ajustamento estrutural’. Todos estes planos impõem ao orçamento dos países devedores, a redução das despesas com saúde e educação, e a supressão dos subsídios aos alimentos básicos e de ajuda às famílias necessitadas.

Os serviços públicos são as primeiras vítimas dos ‘planos de ajustamento estrutural’. Milhares de funcionários públicos – emfermeiras, educadores e outros – foram assim demitidos nos países sujeitos aos planos de ajustamento do FMI. (...)
A segunda tarefa do FMI é abrir os mercados dos países do Sul às empresas multinacionais privadas que atuam no ramo da alimentação. É por isso que, no hemisfério Sul, o livre mercado se apresenta com o rosto hediondo da fome e da morte” (p. 179-181). Veremos isso no próximo fragmento, considerando o caso do Haiti.

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