“Bem-aventurados
os que promovem a paz, porque serão chamados filhos de Deus” (Mt 5,9)
O debate sobre a redução da maioridade
penal, colocado em evidência mais uma vez pela comoção provocada por crimes
bárbaros cometidos por adolescentes, conclama-nos a uma profunda reflexão sobre
nossa responsabilidade no combate à violência, na promoção da cultura da vida e
da paz e no cuidado e proteção das novas gerações de nosso país.
A delinquência juvenil é, antes de tudo, um
aviso de que o Estado, a Sociedade e a Família não têm cumprido adequadamente
seu dever de assegurar, com absoluta prioridade, os direitos da criança e do
adolescente, conforme estabelece o artigo 227 da Constituição Federal.
Criminalizar o adolescente com penalidades no âmbito carcerário seria maquiar a
verdadeira causa do problema, desviando a atenção com respostas simplórias, inconsequentes
e desastrosas para a sociedade.
A campanha sistemática de vários meios de
comunicação a favor da redução da maioridade penal violenta a imagem dos
adolescentes esquecendo-se de que eles são também vítimas da realidade injusta
em que vivem. Eles não são os principais responsáveis pelo aumento da violência
que nos assusta a todos, especialmente pelos crimes de homicídio. De acordo com
a ONG Conectas Direitos Humanos,
a maioria dos adolescentes internados na Fundação
Casa, em São Paulo, foi detida por roubo (44,1%) e tráfico de
drogas (41,8%). Já o crime de latrocínio atinge 0,9% e o de homicídio, 0,6%. É,
portanto, imoral querer induzir a sociedade a olhar para o adolescente como se
fosse o principal responsável pela onda de violência no país.
O Estatuto
da Criança e do Adolescente (ECA), ao contrário do que se
propaga injustamente, é exigente com o adolescente em conflito com a lei e não
compactua com a impunidade. Ele reconhece a responsabilização do adolescente
autor de ato infracional, mas acredita na sua recuperação, por isso propõe a
aplicação das medidas socioeducativas que valorizam a pessoa e lhe favoreçam
condições de autossuperação para retornar a sua vida normal na sociedade. À
sociedade cabe exigir do Estado não só a efetiva implementação das medidas
socioeducativas, mas também o investimento para uma educação de qualidade, além
de políticas públicas que eliminem as desigualdades sociais. Junta-se a isto a
necessidade de se combater corajosamente a praga das drogas e da complexa
estrutura que a sustenta, causadora de inúmeras situações que levam os
adolescentes à violência.
Adotada em 42 países de 54 pesquisados pela UNICEF, a
maioridade penal aos 18 anos “decorre das recomendações internacionais que
sugerem a existência de um sistema de justiça especializado para julgar,
processar e responsabilizar autores de delitos abaixo dos 18 anos” (UNICEF).
Reduzi-la seria “ignorar o contexto da cláusula pétrea constitucional –
Constituição Federal, art. 228 –, além de confrontar a Convenção dos Direitos da
Criança e do Adolescente, as regras Mínimas de Beijing, as Diretrizes para Prevenção da
Delinquência Juvenil, asRegras Mínimas para Proteção
dos Menores Privados de Liberdade (Regras de Riad), o Pacto de San José da Costa Rica e o Estatuto
da Criança e do Adolescente” (cf. Declaração da CNBB contra a
redução da maioridade penal – 24.04.2009).
O Conselho
Episcopal Pastoral da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB),
reunido em Brasília, nos dias 14 a 16 de maio, reafirma que a redução da
maioridade não é a solução para o fim da violência. Ela é a negação daDoutrina
da Proteção Integral que
fundamenta o tratamento jurídico dispensado às crianças e adolescentes pelo
Direito Brasileiro. A Igreja no Brasil continua acreditando na capacidade de
regeneração do adolescente quando favorecido em seus direitos básicos e pelas
oportunidades de formação integral nos valores que dignificam o ser humano.
Não nos cansemos de combater a violência que
é contrária ao Reino de Deus; ela “nunca está a serviço da humanidade, mas a
desumaniza”, como nos recordava o papa Bento XVI (Angelus, 11 de março de
2012). Deus nos conceda a todos um coração materno que pulse com misericórdia e
responsabilidade pela pessoa violentada em sua adolescência. Nossa Senhora
Aparecida proteja nossos adolescentes e nos auxilie na defesa da família.
Brasília, 16 de maio de 2013
Dom José Belisário da Silva, Arcebispo de São Luís do Maranhão, Presidente da CNBB em exercício
Dom Sergio Arthur Braschi, Bispo de Ponta Grossa, Vice-Presidente
da CNBB em exercício
Dom Leonardo Ulrich Steiner, Bispo Auxiliar de
Brasília, Secretário Geral da CNBB
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