quarta-feira, 24 de junho de 2020

ANO A | TEMPO COMUM | DÉCIMO-TERCEIRO DOMINGO | 28.06.2020


Seguir Jesus é acreditar no mistério da vida escondida na semente.
Neste domingo, a Igreja propõe à nossa reflexão mais uma parte da exortação missionária que Jesus apresenta aos seus discípulos no décimo capítulo do Evangelho segundo Mateus. Nestes versículos, Jesus questiona nossos vínculos e lealdades com instituições autoritárias e caducas, nossos secretos sonhos de dar a volta por fora ou por cima para salvar a própria pele, e a nossa tentação de tratar a profecia como se fosse coisa de museu. Jesus nos propõe um caminho paradoxal: é quando perdemos que realmente a ganhamos.
Para bem entender a mensagem clara e contundente do Evangelho de hoje, não podemos esquecer que o trecho do Evangelho que é parte da segunda ou catequese formativa que Jesus oferece aos discípulos, conforme a estruturação oferecida por Mateus.  Como sabemos, a primeira etapa deste breve curso de formação é conhecida como sermão da montanha (capítulos 5-7) e o seguinte apresenta as parábolas do Reino (capítulo 13). Cada uma dessas catequeses é precedida pela narração de ações libertadoras de Jesus.
Nos versículos que precedem o texto de hoje, Jesus recomenda que seus discípulos/as missionários/as deem prioridade às ovelhas perdidas (pessoas em situação de risco), anunciem a proximidade do Reino de Deus, curem doentes (resgatem sua plena cidadania), atuem publicamente e gratuitamente, sejam simples e prudentes, e não se preocupem com a própria defesa. Lembra também que a missão pode causar divisão até no seio da própria família, e que a violência não tem forças para inibir ou extinguir o dinamismo do Reino.
A lealdade dos/as discípulos/as missionários/as de Jesus Cristo não pode ser senão com a urgente e permanente missão de testemunhar sua humana pessoa e construir o Reino de Deus. A única obediência ou submissão que os cristãos realmente devem é a Jesus Cristo, o mestre missionário do Pai. Tudo o mais, inclusive a obediência às autoridades eclesiásticas, está subordinada a esta lealdade incondicional. A obediência às autoridades religiosas está condicionada ao anúncio e à construção do Reino de Deus.
É disso que trata a primeira parte do evangelho que nos é proposto para hoje. Jesus relativiza de forma clara e contundente a lealdade ou obediência aos pais, uma das principais instituições do mundo judaico. E continua, desabsolutizando a dedicação aos filhos e filhas como único imperativo irrevogável. Jesus sabe que a família, especialmente no seu modelo patriarcal, também é atravessada por contradições e ambiguidades. A luz do Reino de Deus, que brilha na prática de Jesus, não faz mais que evidenciar as divisões que existem.
Quem não subordina a fidelidade aos pais e a dedicação aos filhos/as à adesão a Jesus Cristo e à novidade do Reino de Deus não pode ser reconhecido/a como seu discípulo/a. A veracidade e a dignidade dos discípulos/as missionários/as se mostra na atitude de assumir a cruz e seguir os passos de Jesus. E isso significa assumir um projeto de vida alternativa e solidária que deve contar com a humilhação, a rejeição, a vergonha e a condenação social, e não a via do aplauso e do sucesso às custas da verdade.
Pegar a cruz e seguir Jesus significa escolher um estilo de vida à margem do poder e do sucesso, uma vida de proximidade e solidariedade com as pessoas e grupos sociais mais vulneráveis, arriscando nisso a própria vida. Como não lembrar aqui o eloquente testemunho dos/as missionários/as que se embrenham no misterioso continente africano, ousando reaprender a fé, enfrentando malárias que se contam às dezenas por ano, arriscando a saúde e a vida? Neste horizonte, o Evangelho nos diz que são os mártires revelam a pessoa humana e o missionário autêntico. “Quem perder a sua vida por causa de mim, a encontrará.”
A vida merece este nome quando cria condições favoráveis para que as diferentes forma de vida se desenvolvam de forma adequada e plena. É nesta perspectiva que podemos compreender o profundo sentido de uma vida ‘perdida’ para promover e sustentar a vida de outros. Não tem medo do No confronto, nem se se cala diante de ameaças. Temos consciência da nossa pequenez e das nossas contradições, mas cremos que Jesus Cristo pode falar mediante nossas palavras e agir mediante as nossas ações.
Deus, amor fiel e incondicional do qual nascemos e ao qual queremos ser fiéis, dá-nos força e coragem para romper com as velhas e estéreis lealdades, com sonhos egoístas e mortais. Ilumina nossa mente e move nossas mãos para que possamos compreender as consequências do seguimento do teu Filho e multiplicar iniciativas que promovam a vida em suas diversas expressões, especialmente em favor das pessoas mais vulneráveis. E que nossa vida seja enraizada em Cristo e iluminada pelo sonho dele. Assim seja! Amém!
Itacir Brassiani msf
Segundo Livro dos Reis 4,8-16 | Salmo 88 (89)
Carta de Paulo aos Romanos 6,3-11 | Evangelho de São Mateus 10,37-42

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