quinta-feira, 24 de setembro de 2020

ANO A | TEMPO COMUM | VIGÉSIMO-SEXTO DOMINGO | 27.09.2020

Acolher a Palavra de Deus não nos faz ricos, mas fortes!

Estamos finalizando o mês de setembro, que a Igreja dedica, há várias décadas, à recuperação da relevância da Palavra de Deus na vida cristã. Jesus Cristo, a Palavra de Deus feita carne e história, é sempre convite e apelo que traz a força daquele que a pronuncia. Este convite tem autoridade e mobiliza porque vem de Alguém que se faz um de nós, se torna igual a nós em tudo, assume e pronuncia a palavra do simples ser humano, com seus sonhos e necessidades. Jesus é palavra que nos convoca à responsabilidade pela nossa própria emancipação, mas também a assumir nossa missão no mundo e na história.

A crítica de Jesus aos fariseus, sacerdotes e doutores da lei é paradigmática, e nos coloca de sobreaviso. Aqueles que se sentem orgulhosamente os primeiros ouvintes e os exemplares praticantes da Palavra de Deus na verdade são como filhos que dizem sim à ordem do pai mas se recusam a fazer o que ele pede. Todos corremos o risco de ficar na superfície, na aparência deslumbrante e cômoda. Não faltam homens e mulheres de igreja que estudam a Palavra de Deus, celebram como minuciosa atenção a liturgia, mas não conseguem levar o Evangelho para fora do templo ou das suas casas.

E há outros que dizem não à Jesus Cristo e ao Reino de Deus, mas só aparentemente: não frequentam muito assiduamente as celebrações; se opõem abertamente à Igreja e às religiões; amargam experiências de pobreza, marginalização e exclusão... Mas tantos deles se empenham de corpo e alma na tarefa de humanizar o que lhes sobra de vida e de evitar que a sociedade se corrompa ainda mais. Começam pelo círculo de pessoas que se congregam na família e militam em associações, movimentos, sindicatos e organizações solidárias. O não inicial e público deles se revela um sim prático, coerente e anônimo.

E há outras tantas pessoas que sequer conseguem crer em si mesmas. Não se consideram merecedoras de nada e parecem uma negação absoluta de tudo o que possa ser bom e desejável. São como as prostitutas e os publicanos do tempo de Jesus. A estas pessoas, o próprio Deus que diz um sim claro e retumbante: sim à sua dignidade, sim à sua inclusão, sim ao seu desejo de uma vida mínima. Jesus Cristo é o sim de Deus às aspirações profundas da humanidade, especialmente das diversas categorias de oprimidos! Essas pessoas são acolhidas na primeira classe do Reino, tem primazia no sonho de Deus!

Vemos estarrecidos hoje em nosso país o crescimento ostensivo de grupos religiosos e políticos que gostam de anunciar, a torto e a direito, oportuno e inoportunamente, sua identidade cristã, evangélica ou católica. Querem rebatizar o país e a política, como se para isso bastasse dizer que cremos em Jesus. Muitos deles, entretanto, não tem o mínimo escrúpulo de disseminar e preconceito ódio em todas as suas manifestações, e, o pior, propor ou apoiar medidas políticas, econômicas e sanitárias que jogam todo um povo e seus meios naturais nas cinzas ou no limite da sobrevivência. O sim que eles dizem é um não terrível e mortal!

E há outros que imaginam e ensinam que aderir ao que o Evangelho de Jesus nos propõe significa pavimentar um caminho de prosperidade e sucesso, como se Jesus fosse um empresário bem sucedido ou um sortudo a ganhar na mega-sena e não tivesse sido perseguido, torturado e executado na cruz. Na carta aos Filipenses, Paulo não deixa dúvidas: seguir o caminho de Jesus e desenvolver os seus sentimentos significa percorrer o belo caminho do despojamento e da solidariedade, partilhando os clamores e lutas dos últimos da sociedade.

Em Jesus de Nazaré, Deus se faz avalista dos sonhos de dignidade, igualdade e liberdade que nos habitam. Mas ele é também um sim ao Pai, e isso se expressa, como ensina Paulo. No esvaziamento de toda superioridade prepotente, na eliminação de todo “distanciamento prudente”, no movimento de fazer-se próximo e ocupar um lugar ao lado dos últimos.  Este esvaziamento não é uma ascese vazia que despreza a vida, mas um movimento de aproximação de tudo o que é humano, de amor ativo e solidário, de verdadeira humanização. Somos convidados a assumir esta postura, este sentimento de Jesus.

Deus pai e mãe, através do teu filho e nosso irmão Jesus continuas dirigindo-nos tua palavra-convocação. Às vezes esta palavra nos desconcerta e inquieta. Teu filho parece exagerar quando afirma que as pessoas tratadas como pecadoras precedem as ‘pessoas de bem’ no teu Reino. Isso às vezes não nos parece justo. Que Ezequiel nos convença que errados estamos nós, e não tu. Que os santos e santas, e a nuvem de testemunhas nos ensinem de que a Justiça do Reino é um caminho possível, pois eles o percorreram. Assim seja! Amém!

Itacir Brassiani msf

Profecia de Ezequiel 18,25-28 | Salmo 24 (25)

Carta de Paulo aos Filipenses 2,1-11 | Evangelho de São Mateus 21,28-32

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