Nossas
igrejas são espaços de encontro da comunidade de fé, da nossa própria família
ampliada. A experiência é mais forte quando os membros dessa família se
conhecem pelo nome, se ajudam em suas necessidades, se amam em sua diversidade.
Sem esses espaços de encontro e de celebração temos a impressão de estar
fragmentados e corremos o risco do isolamento e do desânimo. O próprio Jesus, tendo o hábito de frequentar
a sinagoga em Nazaré, gostava de subir a Jerusalém para contemplar a beleza do
templo do seu povo. “Que alegria quando me disseram: vamos à casa do Senhor...”
Lembro-me
de ter presenciado, no já longínquo ano de 1983, uma acalorada discussão entre
membros de uma comunidade eclesial, dentro de uma pequena capela. As acusações
se sucederam e, num determinado momento, um dos envolvidos na discussão ameaçou
agredir fisicamente o outro, mas se conteve e o chamou para fora da igreja,
dizendo que não praticaria nenhuma violência no interior do templo. Fatos como
este nos fazem lembrar algo muito importante: nossas igrejas e capelas são uma
espécie de asilo no qual as pessoas têm mais garantias de ter sua vida
respeitada!
Mas
nossas igrejas, poequenas ou grandes, são também lugares onde celebramos a
memória dos nossos santos e mártires, começando por Jesus, e onde a Palavra de
Deus ressoa e adquire vida e atualidade. São espaços nos quais Deus puxa a
conversa, chama, propõe, aconselha, estimula, denuncia e até ordena. E essa
Palavra, ouvida pela comunidade reunida, vai, pouco a pouco, se tornando
louvor, prece, oferta e profecia. Por tudo isso, usando a bela imagem do
profeta Ezequiel, podemos dizer que esses lugares se tornam sagrados, e deles
sai um rio de água que espalha Vida por onde passa.
Infelizmente
essa não é toda a verdade sobre os nossos templos. Às vezes as pessoas que os
procuram parecem absolutamente surdas a qualquer Palavra que possa provocar ou
desinstalar. Neles muitas pessoas se comportam como estranhas e até inimigas
umas das outras. E há até quem procure os templos apenas para cumprir
obrigações ou promessas, para pagar dívidas ou fazer negócios com Deus. Importam-se
mais com seus próprios desejos e necessidades que com a santa vontade de Deus.
Apagam a memória incômoda dos mártires e das testemunhas e se fecham à voz dos
profetas.
E o que
dizer quando aqueles que dirigem os templos e religiões trocam a Palavra
libertadora de Deus por doutrinas e leis que pesam, aprisionam, amedrontam e
condenam os fiéis? E quando usam dos cultos e celebrações para arrecadar
dinheiro, vender serviços, atrair votos e acumular vantagens? Ou quando o
silêncio omisso frente às opressões e violências perpetradas contra os pobres
se torna escandaloso e criminoso? Jesus nos ensina que, em situações como essa,
precisamos ser responsáveis e corajosos. Ele mesmo não duvidou em fazer um
chicote e usá-lo contra esse tipo de gente...
Jesus não
admite que um lugar destinado a afirmar a dignidade e a liberdade do seu povo
seja transformado em um mercado global no qual a vida dos pobres e fracos é
negociada por um par de sandálias, uma dúzia de velas, um sacramento ou uma
garrafa de água-benta... Ele não tolera o culto que acoberta a indiferença ou a
exploração que se traveste de serviço sacerdotal, e, por isso, abandona o lugar
que escolhera como morada. A sacralidade do templo deriva da sacralidade da
pessoa humana. Nosso credo reza que em Jesus de Nazaré Deus se fez carne, e não
templo!
Por isso,
podemos encontrar Jesus quando socorremos os corpos violentados, chagados ou
debilitados dos nossos irmãos e irmãs; ou então quando temos a coragem de fixar
o olhar e afinar o ouvido com os desejos mais belos e profundos que habitam
nossos corpos. Como o corpo de Cristo, também o nosso é vocacionado a ser o
templo glorioso e indestrutível de Deus. Esse corpo é mais que uma realidade
material ou sociológica: é o templo no qual o Espírito de Deus fez morada, o
corpo mediante o qual Jesus Cristo continua a acolher pecadores, curar doentes,
libertar os oprimidos...
Jesus de Nazaré, Tenda de Deus no mundo,
Palavra feita carne e Encontro! A festa de hoje proclama a dignidade do teu povo,
desse povo que se reúne em comunidades espalhadas pelo mundo inteiro e é
enviado como uma torrente de água que, por onde passa, suscita e sustenta a
Vida. Faz com que nossaa comunidadea eclesiais sejam o verdadeiros templos e
casas de Deus, espaços de acolhida solidária e corpos vivos no quais continuas
a realizar as ações libertadoras que realizaste no passado. E leva o nosso
olhar de Latrão à nossa pequena igreja local, à comunidade que é teu corpo
vivo. Assim seja! Amém!
Pe. Itacir Brassiani msf
(Profeta Ezequiel 47,1-12 * Salmo 45 (46) * 1ª Carta aos Coríntios
3,9-17 * João 2,13-22)
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