Eu sou o pão que desceu do céu (Jo 6,
41-51)
O texto deste 19º domingo do Tempo Comum é Jo 6,41-51 e continua o discurso de Jesus sobre o pão que desceu do céu.
Conteúdo
e contexto
No domingo
passado a multidão havia pedido a Jesus: “Senhor, dá-nos sempre desse pão” (v.
34). Neste, ele faz a grande declaração: “Eu sou o pão da vida. Quem vem a mim
não terá mais fome, e quem acredita em mim nunca mais terá sede” (v. 35).
Portanto, a narração se dá ainda junto ao Mar da Galileia onde Jesus havia
multiplicado os pães (cf. v. 19). Nos vv. 41-51 acontece toda uma situação de
crítica a este Jesus que se declara Pão Vivo, enviado pelo Pai. Podemos
destacar três momentos nesta perícope:
1) Os adeptos
da instituição criticam Jesus (v. 41-42)
A perícope
começa introduzindo novas personagens, os adeptos da instituição, diante da
declaração anterior de Jesus apresentam como objeção a sua origem humana, que
para eles é incompatível com a sua qualidade divina (cf. vv. 41-42), pois
“conhecem” sua origem e não conseguem ver nele a divindade. Assim como os
hebreus murmuraram no deserto (cf. Ex 16,7-8), querendo retornar ao Egito,
terra da escravidão e da morte, eles também murmuram. Não admitem que Jesus
venha de Deus. Jesus, plenamente humano, vem de Deus e é a revelação perfeita
de Deus. Por que separar Deus do humano?
Com o prólogo
(1,14) aprendemos que o humano Jesus é o ponto de encontro de Deus com a
humanidade. O próprio Deus conduz as pessoas a essa descoberta. Só resta
deixar-se guiar por Deus que se dá a conhecer plenamente humano na pessoa de
Jesus. Estar do lado da vida é estar do lado de Deus. Jesus garante que quem
está a favor da vida que nele se manifesta terá vida para sempre. A humanidade
de Jesus é pedra de tropeço para os líderes. Já para a comunidade joanina a
glória está justamente em Jesus de Nazaré, feito homem: “A Palavra se fez homem
e habitou entre nós. E nós contemplamos sua glória: glória do Filho único do
Pai cheia de amor e fidelidade” (Jo 1,14).
Quando Jesus
assume a expressão "Eu sou" (v. 41b) está assumindo o Nome do Deus
libertador do AT (cf. Ex 3,14-15). É ele o presente-pão de Deus para a vida da
humanidade. A expressão “Quem vem a mim...” recorda o convite da Sabedoria no
AT que convocava todas as pessoas ao banquete da vida (cf. Pr 9,1-6). É a vida
presente em todas as coisas que Deus criou. Jesus se revela como a Sabedoria
que produz vida sem fim, superior à Sabedoria do AT.
2) Os
verdadeiros motivo da oposição a Jesus (v. 43-46)
Jesus revela,
em primeiro lugar, qual é o motivo de sua oposição a ele, a falta de interesse
pelo homem, por não conhecerem a Deus como Pai (cf. vv. 43-46). A beleza do
projeto de salvação está justamente no fato de Deus ter assumido a humanidade
na pessoa de Jesus. Ele se tornou o ponto de referência indispensável para
entendermos quem é Deus. Aderindo à humanidade de Deus em Jesus, as pessoas
passam da morte à vida. “Eu o ressuscitarei no último dia” (v. 44b).
Os fariseus
chegaram a admitir a ressurreição como fruto da observância da lei. Jesus
garante que a ressurreição depende da adesão a ele e a seu projeto. Ele é a
nova lei que Deus oferece à humanidade. Esta afirmação é confirmada quando o
texto diz: ‘Todos serão discípulos de Deus’ (v. 45a), citação esta que se
encontra também em Is 54,13 e Jr 31,33. O evangelho confirma este anúncio
profético quando diz que Deus inscreveu a nova lei na pessoa de Jesus, e “todo
aquele que escuta o Pai e aceita seu ensinamento adere a Jesus” (v. 45b),
porque ele é o único que está junto de Deus (cf. Jo 1,18) e vê continuamente o
Pai (v. 46; cf. 1,2).
3) O Pão da
vida Jesus, em contraposição ao maná (v. 47-51)
Em seguida,
ele se declara pão de vida em lugar do maná que não conseguiu levar o povo do
Egito à terra prometida (cf. vv. 47-51). Jesus comunica a vida doando-se a si
mesmo, em sua realidade humana, até à morte. A aceitação deste seu dom e a
assimilação vital dele (comer a sua carne e beber o seu sangue) são para o
homem fonte de vida (novo maná) e norma de vida (nova Lei).
Para os
fariseus, porém, a ressurreição seria o prêmio que Deus daria aos que
observassem a Lei. Jesus garante que a ressurreição é o prêmio para os que
aderem à vida que ele comunica. A nova lei é dar adesão a Jesus, aquele que
comunica vida em plenitude. Aderindo a Jesus, o doador da vida, nós conhecemos
o Pai; e reconhecemos que ele nos atrai a partir daquilo que temos em comum: o
desejo de vida plena. Jesus, portanto, é caminho: trouxe a vida de Deus para
dentro da nossa caminhada e endereça nossa caminhada para a vida plena em Deus.
Crer em Jesus
doador da vida, provoca um novo êxodo, um direcionamento novo para toda a
existência. Abre-nos os olhos para perceber que vivemos num mundo em que a
morte procura sufocar a vida a todo custo; une nossas forças para que a vida se
manifeste do jeito que Deus quer: para todos.
Dentro desse
esforço de fazer a vida acontecer, Jesus se torna alimento que sustenta para
sempre: "Eu sou o pão vivo que desceu do céu. Quem come deste pão viverá
para sempre. E o pão que eu vou dar é a minha própria carne, para que o mundo
tenha vida" (v. 51). É ele o Cordeiro da nova Páscoa. Morre na hora em que
os cordeiros eram imolados para a páscoa dos judeus. Vai dar sua carne morrendo
por amor. Seu sangue preservará da morte para sempre. A melhor resposta que
podemos dar ao dom de Deus é acolher Jesus como aquele que se doa totalmente a
nós.
Concluindo
Para os cristãos, a Eucaristia é o memorial da doação plena de Jesus. Comer sua carne e beber seu sangue provoca entre ele e as pessoas uma união inseparável, capaz de suscitar a vida que não termina. A expressão: “comer sua carne e beber seu sangue”, era sinônimo de assimilação da pessoa de Jesus na sua totalidade: aceitá-lo como dom do Pai e dar-se como dom de vida para a humanidade. Comungar, portanto, é acolher Jesus na sua totalidade.
Com esta
expressão o evangelho se abre à dimensão universal. A nova lei não é inscrita
só num povo, mas em todos os que desejam ser discípulos de Deus. A comunidade
dos que crêem, portanto, é comunidade aberta, como o projeto de Deus, que é
proposta feita a todos. Deixemos que a Palavra nos transforme em verdadeiros
discípulos missionários e como Jesus, pão doado, pão partilhado, colaboremos
para que a vida reine em plenitude em nossas comunidades.
Ir. Florinda Dias Nunes
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