Trabalhemos pelo pão que tem sabor de partilha e de justiça!
As comunidades
católicas teimam em desdizer algumas crenças populares que veem o mês de agosto
como portador de azar, e o consagram às vocações eclesiais, dedicando uma
semana às vocações ao ministério ordenado, uma semana aos pais e às famílias,
uma semana à vida religiosa consagrada e uma semana às vocações à vida leiga,
especialmente aos catequistas. Então, celebremos hoje a vocação e a missão do ministro
ordenado à luz da Palavra que a Igreja sugere para o primeiro domingo de
agosto.
Com a ajuda de Felipe,
dos demais discípulos e de um adolescente anônimo, Jesus havia saciado a fome
da multidão contando apenas com alguns pães e peixes. Depois de pedir que as
sobras não fossem desperdiçadas, Jesus, se retirara sorrateiramente, pois o
povo, entusiasmado, queria entroná-lo como rei. Ainda chocados com o que Jesus
havia feito, os próprios discípulos se surpreendem quando percebem que Jesus
não está mais com eles. Desconcertados com o sinal realizado pelo mestre e com
sua recusa do poder, tiveram que empreender sozinhos a travessia do lago,
enfrentando o vento, a noite e a agitação das águas.
Confusos, os
discípulos abandonam à própria sorte o povo carente e sofrido. Mas, dando-se
conta de que Jesus e os discípulos haviam partido, este mesmo povo consegue
vaga em outros barcos e vai procurar Jesus do outro lado do lago. Jesus é para
eles a uma última tábua de salvação, aquele que pode assegurar a eles o humano
direito à alimentação. Entretanto, a atitude de Jesus diante da multidão parece
rude e desconcertante. “Vocês estão me procurando, não porque viram os sinais, mas porque comeram os pães e
ficaram satisfeitos...” Sua discordância com as motivações que moviam o povo é
mais do que clara.
Será que a compaixão
de Jesus diante de um povo cansado e abatido se havia esgotada? Será que vem
desta compreensão errônea que vem a frieza com que recebemos o povo pobre que,
alentado por sua fé tradicional, vem às nossas capelas, paróquias e santuários
pedindo sacramentos e bênçãos? O que Jesus faz é chamar a atenção para algo
mais fundamental que a simples ação de matar a fome de um dia: pede o empenho
de todos/as numa prática alternativa, a única capaz de garantir para todos/as
um pão que não se corrompe. Jesus aponta para o projeto do Reino de Deus, centrado
na partilha, e não na esmola.
Está claro que Jesus
não se limita a reprovar o povo que conta resignadamente com sua ajuda material
e não consegue entender que ela apenas sinaliza algo mais importante e
fundamental. Ele exorta: “Não trabalhem pelo alimento que se estraga; trabalhem
pelo alimento que dura para a vida eterna... É este o alimento que Filho do
Homem dará a vocês, porque é ele que Deus marcou com seu selo”. Jesus não veio
distribuir o duro e amargo pão das sopas populares, mas aquele fermentado,
cozido e multiplicado pela Justiça, obra coletiva do povo organizado e seus
apoiadores. E confia esta obra de Deus aos seus discípulos e discípulas...
Fazer a obra de Deus,
ou agir como Deus age, significa acreditar naquele que enviou Jesus, dar
crédito àquele que achou bem não enviar alguém sabido e poderoso, mas uma
pessoa vulnerável, incapaz de oferecer pacotes de soluções, mas que coloca
sinais e metas de mudança, e dá o melhor de si pelos outros. O pão que não se
estraga e dura para sempre é o dom de si mesmo, o dom da própria vida. E é essa
é a obra que glorifica a Deus. Não podemos esquecer que doutrina religiosa dá
segurança mas também escraviza, e que o alimento distribuído sem custos também
embota a inteligência, acomoda e humilha.
Quem pergunta a Jesus
“qual é a tua obra?” tem dificuldades reais de reconhecer na ação solidária e
compassiva de um/a simples filho/a de homem a potente e transformadora ação de
Deus. Jesus não está preocupado apenas distribuir pão para matar a fome. O
sinal que ele oferece é a cooperação e a articulação dos dons e possibilidades
que estão escondidas no próprio povo, inclusive nas pessoas aparentemente mais
fracas e mais humildes. É aqui que reside o fermento que resulta num pão que
não se estraga. E é a serviço que disso que os ministros são primordialmente
ordenados.
Jesus, mestre nos caminhos da vida, ajuda-nos a
compreender os sinais que realizas, a começar pela Eucaristia. Não deixes que a
transformemos em ritualismo mágico e intimista. Ajuda os ministros ordenados,
generosos e limitados como todos nós, a continuarem tua obra, tornando visíveis
teus sinais de compaixão e de solidariedade. Que eles sejam homens novos. E
ajuda-nos a vencer a tentação de canonizar os poderes e poderosos e menosprezar
a mística do fermento e da semente, própria dos pobres. Assim seja! Amém!
Itacir
Brassiani msf
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