Desafio 6: Viver a minoridade com alegria e convicção
O Evangelho é um caminho que, quando percorrido com
fidelidade lúcida e criativa, nos leva a descer, a ceder o lugar, a servir, a
deixar os primeiros e ocupar os últimos lugares. E assim foi desde o início,
desde Jesus, e nas melhores páginas que o cristianismo escreveu na história e
nas testemunhas mais verdadeiras que gerou. Como no episódio do batismo de
Jesus, quando Deus contempla seus filhos e filhas no meio da multidão pecadora
mas desejosa de preparar estradas para o Messias, ele fala: “Estes são os
filhos e filhas que eu amo e que me dão prazer!”
Infelizmente o cristianismo ocidental, e com ele a
vida religiosa, adquiriu status e
importância social e política. A hegemonia estatística entre os movimentos
religiosos, temperada pelo elitismo dos seus membros, pouco a pouco levou o
cristianismo e a vida religiosa ao sentimento e à postura de superioridade, de
grandeza. Mesmo depois da devastadora crise do século XVIII, a vida religiosa
conheceu um renascimento espiritual e numérico que confirmou sua ilusão de
potência social e eclesial que ainda hoje é recordado entre suspiros e
saudades.
Por aqui podemos compreender o sentimento de angústia
e a preocupação que anda tirando o sono e o vigor dos religiosos e religiosas,
especialmente da Europa e das Américas, diante da vertiginosa queda numérica
que vem experimentando a partir da segunda metade do século passado. Mesmo
quando não ocupa a agenda prioritária dos seminários e encontros, o tema
costuma estar presente nas rodas de conversa e se insinua numa espécie de busca
desesperada de vocações, de qualquer tipo e em qualquer lugar.
Mas um segundo fruto deste resvalo para caminhos paralelos
ao Evangelho é a nem sempre bem disfarçada luta por espaços entre os/as
religiosos/as e a hierarquia eclesiástica, entre dioceses e institutos
religiosos. Esta disputa tem muito a ver com a busca de relevância e de poder,
ou seja, de visibilidade e de influência na Igreja e na sociedade. Tudo como se
o reconhecimento e o poder fossem salvo-condutos e garantes para a
autenticidade e a fecundidade da vida religiosa, como se sua condição fosse a
de senhora e não a de serva e como seu o seu lugar fosse entre os maiores e não
entre os menores, entre os primeiros e não entre os últimos.
O mar não está para peixes grandes... O tempo que se
chama hoje não está para triunfalismos. E isso não apenas por uma questão de
respeito à sensibilidade social, mas principalmente por fidelidade ao
Evangelho, a Regra suprema da vida religiosa. A vida religiosa é desafiada a
recuperar criativamente sua condição de servidora da humanidade e seu lugar
entre os menores e despojados de poder, inclusive na Igreja. Sem nenhum maniqueísmo,
seu lugar é mais caminhando junto dos leigos e leigas que inclinada aos pés da
hierarquia ou dos altares. Se não resgatar esse espírito, perderá sua
capacidade e missão de fermento e sal.
Discutindo as crises e possibilidades da vida
religiosa apostólica, o Pe. Carlos Palacios nos interpela, com sua costumeira
capacidade provocativa: “Somos capazes de aceitar que a pobreza do ser a que está reduzida sob
muitos aspectos a vida religiosa apostólica possa ser uma palavra que Deus nos
dirige hoje, tenha um sentido e possa ser fecunda? Podemos conceber e acolher
em paz que a situação humilhada da vida religiosa apostólica hoje pode nos
aproximar do evangelho e de Jesus mais que o triunfalismo histórico da vida
religiosa apostólica no passado? E que a diminuição quantitativa possa ser o
caminho para crescer em qualidade e para uma maior vitalidade espiritual?”
Itacir Brassiani msf
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