Arregaçar as mangas e colocar-se a serviço do bem comum!
A tempo
quaresmal se abre como um tempo de
concentração e de busca do essencial, como um convite a voltar a Deus de
todo o coração, a vencer a tendência à
fragmentação e à indiferença, a verter todas as as energias para o único
objetivo realmente decisivo: acolher a oferta de reconciliação que o próprio Deus
nos faz; refazer as relações fraternas e avançar na construção de uma sociedade
justa. E, neste ano, pensar e viver de forma responsável a relação entre fé e
sociedade, entre o seguimento de Jesus Cristo e a necessidade de contribuir
para a construção de um país mais justo e solidário
Escrevendo
aos cristãos de Corinto, Paulo sublinha que o próprio Deus toma a iniciativa de
refazer a aliança e consertar a ruptura que provocamos com a sua proposta: em
Jesus Cristo, ele reconciliou definitivamente
cosigo o mundo e cada um de nós. É deste dom incondicional, desta amizade
reatada unilateralmente, que brota para nós a exigência de reconciliação com o
Pai e com os irmãos e irmãs. E isso não é algo secundário, mas uma tarefa
essencial. É coisa para hoje, para agora! “É agora o momento favorável, é agora
o dia da salvação!”, sublinha São Paulo.
A
tradição das comunidades cristãs privilegiou três ações para expressar a
mudança de direção e a convergência das forças que marcam o tempo quaresmal: a esmola, a oração e o jejum. Mas, em
relação a estas práticas de piedade, Jesus Cristo pede vigilância e auto-crítica,
pois nem mesmo estas ações estão livres da falsificação e do faz-de-conta. Por
mais piedosos que pareçam, estes gestos podem ser motivados apenas pela busca
de aprovação, de estima e de reconhecimento e, então, nos afastam da lógica de
Deus, pois ele aprecia aqueles que o mundo não vê, aquilo que fica escondido...
Em
relação à esmola, Jesus não a
descarta, mas também não se entusiasma ingenuamente. De fato, ele questiona a motivação
e disposição com a qual costumamos dar esmola. “Não mande tocar trombeta na
frente... Que a sua mão esquerda não saiba o que a sua direita faz.” O sentido autêntico
da esmola é a solidariedade e a partilha daquilo que temos com as pessoas
mais necessitadas que nós. Mais que dar daquilo que sobra ou não faz falta,
trata-se do chamado a partilhar aquilo que é fruto da terra e do trabalho da
humanidade e que, por isso mesmo, não pode ser privatizado.
Para a
maioria das religiões, a oração é uma
expressão de fé e de comunhão com a divindade. Não faltam grupos e pregadores
que insistem na necessidade de rezar muito, de multiplicar terços, ladainhas,
missas e promessas. Mas Jesus insiste mais na qualidade e na motivação
que na quantidade da oração. Para ele, a
oração é abertura radical a Deus e à
sua vontade; superação dos estreitos limites dos nossos gostos, preferências e
necessidades; diálogo íntimo e amigo com Aquele que quer nosso bem e que não
descansa enquanto todos os seus filhos e filhas não estejam bem.
Quanto ao
jejum, hoje ele está de novo na moda,
e recebe o simpático nome de dieta.
Mas quem a pratica está muito preocupado consigo mesmo – com a saúde ou com a aparência – e pouco
interessado com a compaixão e a partilha. No tempo de Jesus, muitas pessoas
usavam o jejum, sinal de arrepedimento e de mudança, para impressionar os
outros e aumentar a influência e o poder sobre eles. Como cristãos, precisamos
resgatar o sentido pedagógico do jejum:
fazer experiência da própria vulnerabilidade e participar solidariamente das necessidades
dos nossos irmãos e irmãs.
Na
espiritualidade quaresmal, o jejum, a
esmola e a oração estão a serviço do nosso fortalecimento para combater
todas as formas de mal, da nossa conversão ao tesouro do reino de Deus, da renovação
da nossa vida em todas as suas expressões. E isso se mostra cotidianamente na
abertura humilde e reverente a Deus, na
consciência da nossa interdependência em relação aos nossos irmãos e irmãs, na
luta permanente para superar a indiferença e o pragmatismo interesseiro que
pode guiar as igrejas e religiões em suas relações com a sociedade civil e o
estado brasileiro.
Ó Deus, tu sempre ouves o clamor do teu
povo e mostras compaixão com os oprimidos e escravizados. Faz que
experimentemos a liberdade que nos vem da participação na cruz e na
ressurreição de Jesus, de uma vida social pautada pelo serviço gratuito.
Converte-nos pela força do teu Espírito, para que evitemos a globalização da
indiferença e sejamos sensíveis às dores e sofrimentos de todo e qualquer ser
humano, sem fazer caso da sua identidade política ou religiosa. Comprometidos
na luta pela superação da indiferença, queremos viver como teus filhos e filhas
e construir um país solidário. Assim seja! Amém!
Pe. Itacir Brassiani msf
(Profeta
Joel 2,12-18 * Salmo 50 (51) * Segunda Carta aos Coríntios 5,20-6,2 * Mateus
6,1-6.16-18)
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