quinta-feira, 24 de setembro de 2015

VIGÉSIMO-SEXTO DOMINGO DO TEMPO COMUM (ANO B – 27.09.2015)

A Palavra de Deus está acima dos nossos grupos e Igrejas!

Às vezes a pregação de alguns padres dá a impressão de que o mundo se divide entre os bons, que são aqueles que aceitam explicitamente Jesus Cristo e uma Igreja, e os maus, que são as pessoas religiosamente indiferentes e as Igrejas evangélicas ou néo-pentecostais. Daí a importância de escutar e acolher com abertura e inteligência a Palavra de Deus proposta na liturgia de hoje. Precisamos ultrapassar o muro dos ciúmes e invejas e dar as mãos a tantos grupos e Igrejas que cooperam na superação dos males deste mundo e na construção de um mundo outro e melhor.
A fato narrado pelo evangelho de Marcos traz a questão da inveja e da competição para o centro da nossa espiritualidade. É paradoxal que os mesmos discípulos que resistiam em seguir Jesus pelas vias da compaixão e não haviam conseguido expulsar um espírito mau que amordaçava um jovem (cf. Mc  9,14-29) queiram proibir que outros o façam... “Mestre, vimos um homem que expulsa demônios em teu nome. Mas nós lhe proibimos, porque não nos segue.” Parece que eles querem manter o monopólio do exorcismo, e desejavam que todos seguissem a eles, os discípulos oficiais, e não o próprio Jesus...
A resposta de Jesus à tortuosa e inoportuna iniciativa dos discípulos chama à abertura e à colaboração ecumênica: “Não lhe proíbam, pois ninguém faz um milagre em meu nome e depois pode falar mal de mim. Quem não está contra nós, está a nosso favor.” Quem tem um coração grande, um olhar abrangente e uma fé confiante não imagina estar cercado de concorrentes por todo lado. Só uma mente imatura e institucionalizada pode se mostrar incapaz de reconhecer o bem que outros fazem e alimentar o desejo de que todos peçam sua aprovação para tomar qualquer iniciativa.
Por que esta incapacidade de muitos de nós em respeitar, valorizar e cooperar com as demais Igrejas cristãs? Será que aquilo que temos em comum não é mais importante que as picuinhas que nos diferenciam? Se eles estão a favor do Evangelho e de Jesus Cristo, poderiam estar contra nós? É também passado o tempo de ver nas iniciativas e projetos sociais o gérmen da discórdia e do confronto. Projetos que nascem fora das sacristias e sem as bênçãos eclesiásticas podem trazer a secreta marca do Espírito de Deus e realizar um bem enorme à humanidade. O Vaticano II ensina que o Espírito de Deus dirige o movimento da história e é a fonte dos anseios de liberdade e solidariedade.
Jesus enfrenta corajosamente este e outros problemas, vividos pelas comunidades cristãs de ontem e de hoje. Sob a pressão da perseguição, alguns abandonavam o Evangelho, o que era uma pedra de tropeço que afastava muitos outros ‘pequeninos’. O corpo eclesial tinha membros que escandalizavam os outros. E a proposta de Jesus é vigilância e firmeza. É melhor ser uma comunidade pequena e coerente que uma multidão, cheia de contradições. Ela não pode limitar ou perder sua missão de ser sal, de fazer a diferença. As traições e incoerências precisam ser evitadas, cortadas e queimadas.
Hoje, uma destas contradições que escandalizam os pequeninos é o acúmulo de riquezas à base de relações injustas. A riqueza acumulada e subtraída ao serviço do bem-estar da humanidade é sempre injusta, e não importa se pertence a comunidades, paróquias, dioceses, congregações ou Igrejas. Precisamos ter a coragem de implantar na Igreja uma economia que viabilize e visibilize a solidariedade entre comunidades, movimentos, paróquias, dioceses e Congregações. Sem isso, estaremos tolerando uma traição que continuará escandalizando e provocando sofrimento.
São Tiago enfrenta esta questão com palavras muito duras. Dirgindo-se aos ricos ele diz: “Suas riquezas estão podres, suas roupas foram roídas pelas traças. O ouro e a prata de vocês estão enferrujados, e a ferrugem deles será testemunha contra vocês, e como fogo lhes devorará a carne.” A questão não é a riqueza em si mesma, mas o modo injusto de consegui-la: “Vejam: os salários dos trabalhadores que fizeram a colheita nos campos de vocês; retido por vocês, este salário clama, e os protestos dos cortadores chegaram aos ouvidos do Senhor...”
Jesus de Nazaré, coração sem fronteiras e Palavra que liberta e constrói relações ecumênicas e inclusivas: fecunda nossas palavras e ações com teu Espírito, a fim de que alcancemos a sabedoria que nos ajuda a cumprir nossa missão no respeito, no apreço e na coorperação com aqueles que crêem diversamente e cumprem, mesmo sem saber, tua vontade santa e libertadora. Ajuda-nos a administrar nossos bens segundo os princípios do dom e pela gratuidade, e não sob a regência do acúmulo e da indiferença. E que nossas contradições não sejam pedras nas quais os pequenos tropeçam. Assim seja! Amém!

Itacir Brassiani msf
(Livro dos Números 11,25-29 * Salmo 18B (19B) * Carta de Tiago 5,1-6 * Evangelho de São Marcos 9,38-48)

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