O amor vence a indiferença, e a cooperação vence a competição!
Algumas pregações de
alguns padres e pastores deixa a impressão de que o mundo se divide entre pessoas
de bem, que são aquelas que aceitam explicitamente Jesus Cristo e uma Igreja, e
pessoas maliciosas ou perigosas, que são as pessoas religiosamente indiferentes
e as outras igrejas ou confissões religiosas. Daí a importância de escutar e
acolher com abertura e inteligência a Palavra de Deus proposta na liturgia
desse domingo. Precisamos ultrapassar o muro dos ciúmes e invejas e dar as mãos
a tantos grupos e Igrejas que cooperam na superação dos males deste mundo e na
construção de um mundo outro e melhor.
A fato narrado pelo
evangelho de Marcos traz a questão da inveja e da competição para o centro da
nossa espiritualidade. É paradoxal que os mesmos discípulos que resistem em
seguir Jesus pelas vias da compaixão e não conseguem expulsar um espírito mau que
amordaça um jovem (cf. Mc 9,14-29) queiram proibir que outros o façam. “Mestre,
vimos um homem que expulsa demônios em teu nome. Mas nós lhe proibimos, porque não nos segue”. Parece que os discípulos
querem manter o monopólio do exorcismo, e desejam que todos sigam a eles, os
discípulos oficiais, e não o próprio Jesus.
A resposta de Jesus à
tortuosa e inoportuna iniciativa dos discípulos é um contundente chamado à
abertura e à colaboração ecumênica: “Não lhe proíbam, pois ninguém faz um
milagre em meu nome e depois pode falar mal de mim. Quem não está contra nós,
está a nosso favor”. Ou seja: quem tem um coração grande, um olhar abrangente e
uma fé confiante não pode se imaginar cercado/a de concorrentes por todo lado.
Só uma mente imatura e institucionalizada pode se mostrar incapaz de reconhecer
o bem que outros fazem e alimentar o desejo de que todos/as peçam sua aprovação
para tomar qualquer iniciativa.
Por que esta
incapacidade que muitos temos de respeitar, valorizar e cooperar com as demais
Igrejas cristãs? Será que aquilo que temos em comum não é mais importante que
as picuinhas que nos diferenciam? Se elas estão a favor do Evangelho e de Jesus
Cristo, poderiam estar contra nós? É também passado o tempo de ver em todas as
iniciativas e projetos sociais e políticos o gérmen do confronto. Projetos que
nascem sem as bênçãos eclesiásticas podem trazer a marca do Espírito de Deus e
realizar um grande bem à humanidade. O Vaticano II ensina que o Espírito de
Deus dirige a história e é a fonte dos anseios de liberdade e solidariedade.
Jesus enfrenta
corajosamente este e outros problemas, vividos pelas comunidades cristãs de
ontem e de hoje. Sob a pressão da perseguição, alguns cristãos abandonavam o
Evangelho, o que era uma pedra de tropeço que afastava muitos outros
‘pequeninos’. O corpo eclesial tinha membros que escandalizavam os outros. E a
proposta de Jesus é vigilância e firmeza. É melhor ser uma comunidade pequena e
coerente que uma multidão, cheia de contradições. A comunidade eclesial não
pode limitar ou perder sua missão de ser sal, de fazer a diferença. As traições
e incoerências precisam ser evitadas, cortadas e queimadas.
Hoje, uma destas
contradições que escandalizam os pequeninos é o acúmulo de riquezas à base de
relações injustas. A riqueza acumulada egoisticamente e subtraída ao serviço do
bem-estar da humanidade é sempre injusta, e não importa se pertence a
comunidades, paróquias, dioceses, congregações ou Igrejas. Precisamos ter a
coragem de implantar uma economia do dom, capaz de viabilizar e visibilizar a
solidariedade entre comunidades, movimentos, paróquias, dioceses e
Congregações. Sem isso, estaremos tolerando uma traição que continuará
escandalizando e provocando sofrimento.
São Tiago enfrenta
esta questão com palavras muito duras. Dirigindo-se aos ricos ele diz: “Suas
riquezas estão podres, suas roupas foram roídas pelas traças. O ouro e a prata
de vocês estão enferrujados, e a ferrugem deles será testemunha contra vocês, e
como fogo lhes devorará a carne”. A questão não é a riqueza em si, mas o modo injusto
de consegui-la: “Os salários dos trabalhadores que fizeram a colheita nos
campos de vocês; retido por vocês, este salário clama, e os protestos dos
cortadores chegaram aos ouvidos do Senhor...”
Jesus de Nazaré, coração sem fronteiras e Palavra que
constrói relações ecumênicas e inclusivas: fecunda nossas palavras e ações com
teu Espírito, a fim de que possamos cumprir nossa missão no respeito, no apreço
e na cooperação com aqueles/as que creem diversamente. Ajuda-nos a administrar
nossos bens segundo os princípios do dom e da gratuidade, e não sob a regência
do acúmulo e da indiferença. E que nossas contradições não sejam pedras nas
quais os pequenos tropeçam. Assim seja! Amém!
Itacir
Brassiani msf
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