segunda-feira, 3 de dezembro de 2012

Uma destruição massiva: a geopolítica da fome (24)


A ONU incluiu o direito à alimentação entre os Direitos Humanos (cf. artigo 25). É na perspectiva da luta por esse direito, um dos mais violados, que publico aqui uma série de breves textos sobre o escândalo da fome e o direito humano à alimentação. São informações e reflexões que simplesmente traduzo e resumo do recente livro Destruction massive. Géopolitique de la faim, de Jean Ziegler, relator especial da ONU para o direito à alimentação, de 2000 a 2008.
O livro foi publicado em outubro de 2011, pela editora Seuil (Paris).

Agrocombustíveis, a obsessão de Barck Obama.
São todas empresas multinacionais norteamericanas as produtoras mais poderosas de agrocombustíveis. Todos os anos elas recebem bilhões de dólares de ajuda estatal. Barack Obama tem declarado que, para os EUA, o programa de bioetanol é uma questão de segurança nacional.

Em 2011, subvencionados por 6 bilhões de dólares de fundos públicos, os conglomerados norteamericanos queimaram 38% da colheita nacional de milho (contra 30% em 2008). Esta é uma das causas do aumento do preço do milho no mercado mundial: desde 2008, subiu quase 50%.

Apesar de ter uma população de apenas 300 milhões de habitantes, os EUA produzem aproximadamente 25% de todos os bens industriais do planeta. A matéria-prima dessa impressionante máquina industrial é o petróleo. Os EUA queimam uma média diria de 20 milhões de barris de petróleo, 25% da produção mundial. Praticamente 60% desse combustível é importado.

É esta dependência energética que preocupa Barack Obama. E como a maior parte desse combustível vem do Oriente médio, onde a instabilidade politica é endêmica e os norteamericanos não são benquistos, essa importação nunca está garantida. A consequência é que os EUA devem mater nessa área uma força militar (aérea, terrestre e naval) extremamente dispendiosa.

“Em 2009, pela primeira vez, as despesas dos Estados membros da ONU com armamentos (fora do orçamento militar propriamente dito) superaram 1 trilhão de dólares. Desse total, 41% corresponde aos EUA. A China, que é a 10ª potência militar do mundo, gastou 11%. Os contribuintes norteamericanos financiam anualmente também 3 bilhões de dólares de ajuda militar a Israel. E também as caríssimas bases militares na Arábia Saudita, no Kwait, no Bahrein e no Qatar. Apesar de revolução do povo egipciano em janeiro de 2011, o Egito continua sendo um protetorado norteamericano, e o custo anual dessa sustentação militar passa de 1,3 bilhões de dólares” (p. 258).

Dá pra entender a dificuldade que Barack Obama encontra para sustentar os programas sociais no seu próprio país, especialmente o programa de saúde pública. Para financiá-los, ele teve que reduzir o orçamento militar. Mas isso só será possível manter reduzindo a dependência energética e desenvolvendo os agrocimbustíveis. Já em 2007 Bush havia estabelecido as metas: em 20 anos, os EUA deveriam reduzir em 20% seu consumo de energia e aumentar 700% a produção de agrocombustíveis.

“A queima de milhões de toneladas de alimentos quando a cada cinco segundos uma criança de menos de 10 anos morre de fome é, no mínimo, revoltante. O tanque de um veículo de porte médio à base de etanol contém 50 litros. Para fabricar 50 litros de etanol é preciso destruir 358 km de milho. No México, na Zâmbia, o milho é ingrediente essencial na alimentação. Nesses países, com 358 kg de milho uma criança pode viver mais de um ano. A Anistia Internacional resume essa situação: ‘Agrocombustíveis: tanques cheios de ventres vazios’” (p. 259-260).

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