quinta-feira, 18 de fevereiro de 2016

ANO C – SEGUNDO DOMINGO DA QUARESMA – 21.02.2016

Escutemos o Filho de Deus e sigamos seu caminho de doação!
No segundo domingo somos convidados a perguntarmo-nos: Onde erguemos a tenda do nosso encontro com Deus? O brilho atraente dos momentos de êxtase e dos grandes e festivos encontros, podem nos afastar da exigente missão de encarnar a fé na vida cotidiana.  A oração inicial nos convida a ouvir o Filho Amado do Pai, a purificar o nosso olhar e a buscar a verdadeira face de Deus. E Paulo nos adverte insistentemente, e em lágrimas: não nos comportemos como inimigos da cruz de Cristo, ou seja: não corramos atrás de facilidades, sucessos, prosperidades... Deus usa roupas de servo, porque essa é sua essência. Por isso, nada de tendas longe da luta por um mundo fraterno, casa de todos...
A cena do Evangelho de hoje é precedida por uma catequese muito exigente de Jesus aos discípulos. Depois de ter sido reconhecido formalmente por Pedro como “o Cristo de Deus”, Jesus acrescentara:  “É necessário o Filho do Homem sofrer muito e ser rejeitado pelos anciãos, sumos sacerdotes e escribas, ser morto e, no terceiro dia, ressuscitar” (Lc 9,22). E dissera, voltando-se aos que o seguiam: “Se alguém quer vir após mim, renuncie a si mesmo, tome sua cruz, cada dia, e siga-me. Pois quem quiser salvar a sua vida a perderá, e quem perder sua vida por causa de mim a salvará” (Lc 9,23).
Parece que os discípulos não conseguem entender e aceitar este caminho proposto por Jesus. Sentem-se envergonhados e desconcertados diante de um Messias servidor e perseguido. Resistem a um caminho que os levará a ser companheiros dele no anúncio do Reino e na perseguição. Não passa pela cabeça dos discípulos carregar a cruz da rejeição e da criminalização, imposta a quem ousa se rebelar contra os poderes do Império. Eles lutam desesperadamente contra essa posibilidade. Segundo Lucas, esta luta interior dos discípulos se prolongava por mais ou menos oito dias.
É neste contexto que Jesus, pressionado pelos próprios discípulos, sente necessidade de se retirar para rezar e discernir o caminho que deve seguir para revelar o rosto do Pai e realizar sua vontade libertadora. Chama e leva consigo Pedro, Tiago e João, os primeiros discípulos que havia chamado a segui-lo, mas também os mais resistentes ao caminho que propunha e os mais aferrados às ambições de poder e à imagem de um Messias potente e vitorioso. O medo e a resistência dos discípulos se mostra também no sono, como aconteceria de novo mais tarde, no Jardim das Oliveiras (cf. Lc 22,45)...
O sono expressa o desejo de fugir, de dar as costas, de voltar atrás, de não escutar nada senão as próprias ideias e ambições... Os discípulos simplesmente não suportam escutar o diálogo de Jesus com Moisés e Elias, respectivamente, guia e profeta do povo, ambos duramente perseguidos e não muito bem-sucedidos. O diálogo é sobre o êxodo de Jesus que aconteceria mais tarde em Jerusalém: o enfrentamento com os poderes opressores e a saída das malhas de uma religião estreita e sedenta de sucesso, discriminadora e opressora dos mais fracos. Essa conversa não interessava aos discípulos...
O trio resistente e sonolento é despertado pelo brilho de Jesus e seus convidados, não pelo conteúdo da conversa. A glória e o poder estão sim no horizonte do interesse deles, tanto que desejam reter o tempo, separar os espaços e eternizar esta agradável visão. Estando todos atordoados e sem saber o que dizer, Pedro toma a iniciativa: “Mestre, é bom ficarmos aqui. Vamos fazer três tendas...” Não lhes interessa acolher e compreender nem as palavras de Jesus, nem a memória do êxodo e da profecia. O que desejam é lugares nos quais possam encontrar paz e sossego, longe dos desafios da missão.
Mas a glória e o esplendor do poder não são expressões inequívocas de Deus e da realização da sua vontade. É a sombra tenebrosa de uma nuvem – imagem daquela nuvem que acompanhara o povo na caminhada através do deserto e envolvera a montanha na celebração da Aliança – que desfaz o entusiamo dos discípulos e os conduz à verdade à qual resistem: “Este é o meu filho, o eleito. Escutai-o!” É a profecia e o serviço, e não as vestes de glória, que manifestam o esplendor de Deus... Nenhum discípulo pode fechar os ouvidos a esta exigente Palavra!
Jesus de Nazaré, companheiro de Moisés e de Elias, filho amado do Pai. Por vezes tua liberdade nos causa vertigens e tua compaixão nos assusta. Ajuda-nos a contemplar teu rosto nesta terra povoada de gente que deseja ardentemente viver. Ensina-nos a escutar tua Palavra sussurrada nas atitudes inquietas e nas ações indignadas e até violentas das pessoas e grupos a quem foram roubados os sonhos. E dá-nos a humilde e a sabedoria para acompanhá-las no caminho de descida que possibilita o verdadeiro encontro contigo. Tu que és vida, lealdade e caminho. Assim seja! Amém!

Itacir Brassiani msf
(Livro do Gênesis 15,5-12.17 * Salmo 26 (27) * Carta aos Filipenses 3,17;4,1 * Evangelho de Lucas 9,28-36)

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