Em Deus vivemos,
caminhamos, amamos e esperamos.
A festa
da Santíssima Trindade nos convida a mergulhar no mistério de Deus, deixando que
ele nos envolva, abrace e dinamize. Dialogando com os intelectuais de Atenas,
Paulo afirma que em Deus “vivemos, nos movemos e existimos” (At 17,28). Deus é
o fundamento de todas as formas de
vida, o dinamismo de todas as
transformações, o horizonte do
sentido definitivo. Nossa vida se desenrola no Filho, o Caminho; sob o Espírito
Santo, o Guia; em direção ao Pai, Origem e meta. Celebremos e meditemos sobre o
mistério de Deus revelado em Jesus Cristo, conscientes de que falar sobre Deus
é falar sobre o mistério mais profundo do ser humano. E esta é uma tarefa tão
difícil quanto necessária.
No
Evangelho de hoje, Jesus fala aos discípulos no clima de apreensão que envolve
sua última ceia. Ele não está preocupado em falar sobre Deus de forma abstrata.
Seu objetivo é prevenir os discípulos a respeito das dificuldades que deverão
enfrentar e encorajá-los frente às perseguições. Sublinha que sua vida e seu
ensino têm consequências que eles ainda não são capazes de compreender. “Tenho
ainda muitas coisas para vos dizer, mas não sois capazes de compreender agora.”
E acena para o dom do Espírito da Verdade, à luz do qual eles saberão entender
o caminho do amor e da compaixão.
Como
discípulos e discípulas, precisamos efetivamente viver, caminhar e nos inspirar
em Deus. Deus é um horizonte e um caminho de vida, e não uma equação matemática
ou uma muralha inexpugnável. Ao elaborar o conceito ‘trindade’ ou ‘tri-unidade’,
a tradição cristã não está propondo uma charada ou um enigma a ser decifrados.
Sobre Deus é preciso falar em termos de profundidade e de intimidade, e não em
termos de quantidade. Não há porque quebrar a cabeça na tentativa de conjugar
as três pessoas com uma única natureza. Esta não é a questão fundamental!
O
conceito ‘trindade’ pretende sublinhar, em primeiro lugar, que Deus é mistério de comunhão que acolhe,
confirma e liberta. E isso é muito importante no contexto de uma cultura que
reduz tudo a fragmentos isolados e a relações fluídas, e numa visão de Igreja
centrada na autoridade hierárquica e na obediência submissa. Sendo dinamismo
vivo de comunhão mediante o reconhecimento do outro e o dom generoso de si,
Deus é caminho e imagem de uma humanidade aberta, relacional e solidária, como
também de uma Igreja que se organiza como uma comunidade de dons e ministérios.
É a
partir desta comunhão essencial que podemos entender e realizar nossa vocação à
liberdade. Na Trindade, a liberdade se expressa como força de ação e dinamismo
de doação que não se submete ao imperativo da preservação de si mesmo e dos
próprios interesses, mas se rege pelo princípio da afirmação da dignidade e da
integridade do outro. Daqui emerge uma proposta de Igreja liberta da tentação
de agir mediante o medo e a imposição, e uma imagem de pessoa humana centrada
no reconhecimento da dignidade do próximo. É livre quem afirma e multiplica
liberdades!
Em outras
palavras, o conceito ‘trindade’ sublinha que Deus é dinamismo de amor e de
lealdade. Mas só conseguimos compreender o que o verbo amar realmente significa
olhando para a vida concreta de Jesus Cristo. “Compreendemos o que é o amor
porque Jesus deu a sua vida por nós...” (1 Jo 3,16). Esta é a glória e o brilho
de Deus e, ao mesmo tempo, a honra e a celebridade conferidas à pessoa humana
pelo Espírito Santo. Paulo não hesita em afirmar que nossa honra está na glória
de um Deus que, por causa do seu amor leal, não foge à cruz. A qualidade do nosso amor se manifesta na
lealdade às pessoas e causas.
O Pai é a
Fonte e origem de um amor que se comunica no Filho e permanece com Ele na sua
compaixão pela humanidade. O Filho é o Amado do Pai, aquele que responde amando
sem medida Aquele que o ama e os seres humanos, gerados neste mesmo amor. O
Espírito é este dinamismo pessoal de Dom de si, comum ao Pai e ao Filho e
derramado em todas as criaturas. O Filho e o Espírito, cada um a seu modo, são
como que as duas mãos abertas do Pai, que nos asseguram que este amor perdura
no tempo. Deus nos ama desde o seio materno e mesmo depois das nossas muitas e
reiteradas faltas.
Glória a ti, Deus Pai e Mãe, fonte de todas as formas
de vida! O louvor que a ti devemos ressoa na boca dos mais pequeninos, pois os
lábios dos prepotentes e orgulhosos frequentemente te insultam, na medida em
que humilham, desprezam e condenam os pobres. Mas nós também ousamos dizer: Glória
a ti, Deus-conosco, libertador de todas as prisões, caminho de vida! Glória a
ti, Espírito Santo, motor da integral libertação, derramado gratuita e abundantemente
em todas as criaturas como bondade e beleza. Glória a ti, Deus-comunidade de
quem tudo e todos recebem a vida, o movimento e a existência. Assim seja! Amém!
Itacir
Brassiani msf
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