Nas mãos dos cristãos
estão algemas, e não as armas!
Para concluir
o mês das festas juninas e dos santos populares, somos convidados a celebrar com
reverência o testemunho de Pedro e Paulo, nossos irmãos maiores e colunas que
sustentam as comunidades cristãs. Para chegar à vida real destes personagens talvez
seja necessário escutar com bastante atenção o testemunho das Escrituras. Se é
verdade que Pedro é o primeiro líder dos cristãos e Paulo é o apóstolo dos
povos, também é certo que ambos, cada um a seu modo e a seu tempo, foram
discípulos de Jesus e passaram por sucessivas crises e dificuldades, provaram a
prisão e passaram pelo martírio.
Esqueçamos por
um instante a cena contada por Mateus e centremos nossa atenção no
acontecimento narrado nos Atos dos Apóstolos. Pedro, o primeiro Papa foi
presidiário! “Para que servem as chaves prometidas por Jesus Cristo se não
ajudam a soltar as algemas que o prendem ou abrir a porta da prisão, mantida
sob rigorosa vigilância?” Pedro estava imerso na penumbra desta e outras
perguntas quando uma luz iluminou sua cela, uma mão tocou seu ombro e uma voz
ordenou que se levantasse. As algemas caíram, os guardas não viram nada, e a
porta que separava a cela da cidade se abriu sozinha...
Paulo, depois
de ter sido um fariseu zeloso e violento e de ter acumulado muitos méritos e
honras por causa disso, fez a experiência de ser conquistado por Jesus Cristo
e, diante do bem supremo desta acolhida gratuita e imerecida, considerou tudo o
mais como lixo e déficit na contabilidade da vida (cf. Fil 3,1-14) e se lançou,
livre e incansável, no anúncio desta boa notícia, especialmente às pessoas e
grupos de origem pagã. O zelo e o ardor que Paulo demonstrara pelo judaísmo se
transformou em zelo pela fé e pela autonomia e liberdade recebidas em Jesus
Cristo. Com isso, perdeu de vez a tranquilidade.
Esta complexa
trajetória de vida atraiu contra Paulo o ódio dos seus irmãos judeus e, por ter
sido perseguidor dos cristãos, também a desconfiança dos próprios irmãos na fé.
Depois de sucessivos enfrentamentos e perseguições, ele também acabou na
prisão. Sendo cidadão romano, exigiu o direito de ser julgado pelo imperador, e
foi conduzido a Roma. Mas ninguém conseguiu colocar sob algemas aquilo que o
fazia livre: o Evangelho de Jesus Cristo. “Por ele, eu tenho sofrido até ser
acorrentado como um malfeitor. Mas a Palavra de Deus não está acorrentada”,
escreveu ele ao fiel amigo e companheiro Timóteo (2Tm 2,9).
Pedro e Paulo
são filhos, irmãos e pais da fé numa Igreja que confirmou com a vida aquilo que
anunciou com as palavras. Pedro, Paulo e os demais cristãos detidos mantêm
contato com as suas comunidades de base, inclusive através de cartas, e as
comunidades não ficam indiferentes, apesar da crise de fé provocada por uma
perseguição feita em nome de Deus e da religião, assim como pelos riscos
políticos e sociais que estas relações implicavam. O vínculo entre a comunidade
dos discípulos e seus líderes presos se mostra de um modo singelo e comovente
no relato dos Atos dos Apóstolos proposto pela liturgia de hoje (cf. 12,1-11).
As escrituras
dizem que “enquanto Pedro era mantido na prisão, a Igreja orava continuamente
por ele.” É neste contexto que Pedro experimenta a presença fiel de Deus também
na prisão. Logo que é libertado do cárcere, vai à casa da mãe de João Marcos,
onde a comunidade está reunida em oração. Quando Rosa, a mãe de Marcos, abre a
porta e vê que é Pedro, é tomada de tanta alegria que acaba deixando-o plantado
do lado de fora e vai anunciar a surpreendente e boa novidade à comunidade
reunida, a qual pensa que Rosa está doida. Aberta a porta, Pedro entra e conta,
entusiasmado, o que havia acontecido.
O que sustenta
as Igrejas e comunidades cristãs é o encontro com Deus em Jesus Cristo. É
substancialmente isso que o evangelho de hoje nos propõe. Num lugar marcado
pelo domínio estrangeiro, Jesus interroga seus discípulos sobre o que pensam
dele. E Pedro é o primeiro dentre todos os seguidores a reconhecê-lo e
proclamá-lo Messias. Só quem está aberto e sintonizado com a lógica de Deus
pode reconhecer a presença de Deus nas ações e palavras deste filho da
humanidade e irmão de todos os seres humanos.
Queridos Pedro e Paulo, apóstolos e irmãos
na fé! Com vocês aprendemos que crer, confiar, partilhar e anunciar são verbos
essenciais na gramática cristã. Ajudem-nos a viver de tal modo que, chegando ao
entardecer da existência, também nós possamos dizer: “Chegou o tempo da minha
partida. Combati o bom combate, terminei a corrida, guardei a fé.” Suportando
os sofrimentos e incertezas presentes, jamais nos envergonhemos ou desanimemos,
pois sabemos em quem acreditamos! Assim seja! Amém!
Itacir Brassiani msf
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