sábado, 22 de setembro de 2012

Uma destruição massiva: a geopolítica da fome (5)


O Papa João Paulo II ensina que a promoção dos Direitos Humanos é um dos novos âmbitos da missio ad gentes (cf. Redemptoris Missio, 37). A ONU incluiu o direito à alimentação entre os Direitos Humanos (cf. artigo 25). É nessa perspectiva que publico aqui uma série de breves textos sobre o escândalo da fome e o direito humano à alimentação. São informações e reflexões que simplesmente traduzo e resumo do recente livro Destruction massive. Géopolitique de la faim, de Jean Ziegler, relator especial da ONU para o direito à alimentação, de 2000 a 2008. O livro foi publicado em outubro de 2011, pela editora Seuil (Paris).

A fome é uma fatalidade?

Até meados do século XX, a fome era considerada um tabu. “O silêncio cobria suas sepulturas. O massacre era visto como uma fatalidade” (p. 103). E foi Thomas Malthus, nascido na Inglaterra em 1766, quem contribuiu decisivamente para esta visão fatalista da história da humanidade. Para ele, a redução da população mediante a fome seria a única saída para evitar a catástrofe econômica final. Portanto, a fome nasce da lei da necessidade.

Uma versão simplificada das teses de Malthus lançaram raízes profundas na opinião pública e sobrevive ainda hoje: a população humana cresce sem cessar, mas o alimento e a terra que o produz são limitados; assim, a fome é uma lei natural que reduz o número de homens e garante o equilíbrio entre suas necessidades e os bens disponíveis.

No seu famoso livro Ensaio sobre o princípio da população, Matlhus ataca violentamente as leis sociais, tímidas iniciativas do governo britânico da época para amenizar a fome. Escrevia sem rodeios que as epidemias eram necessárias e que se um homem não consegue sobreviver com seu trabalho, tanto pior para ele e sua família.

“As leis sociais são prejudiciais, pois permitem que os pobres tenham filhos. A fome é a punição imposta pela natureza. É necessrio que os pobres saibam que as leis da natureza, que são leis de Deus, os condenaram a sofrer, eles e suas famílias” (citado à p. 107). Os pobres são seus maiores inimigos.

Aderindo ao pensamento de Malthus e divulgando-o por todos os meios, a burguesia de ontem e de hoje acalma seus próprios escrúpulos. “A verdadeira ameaça seria a explosão demográfica. Sem a eliminação dos mais fracos pela fome, viria um dia em que o ser humano não poderá mais comer, beber, nem respirar sobre a face da terra” (p. 108).

Até meados do século XX a ideologia malthusiana devastou a consciência ocidental e fez com que a maior parte dos europeus se tornassem surdos e cegos diante dos sofrimento das vítimas, especialmente nas suas próprias colônias. Os famintos se tornaram para eles um verdadeiro tabu. Mesmo sem querer, Malthus libertou os ocidentais da sua má consciência.

“Salvo nos casos de grave doença psíquica, nenhuma pessoa consegue suportar a cena terrível da destruição de um ser humano pela fome. Naturalizando o massacre e vinculando-o à necessidade, Malthus libertou os ocidentais da sua responsabildade moral” (p. 108).

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