AS DORES DA MALÁRIA, O PARTO DA MISSÃO!
A ocorrência de doenças, tanto conosco como com familiares nossos, muito
marcante. Não lembro de ter padecido com alguma enfermidade mais relevante, mas
presenciei a doença da minha avó e também as frequentes convulsões da minha
irmã, e isso marcou me muito a vida. Foram poucas as visitas aos médicos para tratar
de alguma enfermidade ou mal-estar pessoal. Não obstante isso, preciso confessar
uma coisa: o ambiente do consultório médico ou odontológico, assim como do
hospital. sempre me provocaram um certo medo.
Eis que venho para Moçambique, realizar o sonho da missão sempre esteve
vivo dentro de meu coração, mas que não imaginava que se realizasse tão
rapidamente. Mas aqui estou, feliz e animado para continuar a caminhar. Aqui
estou, aprendendo com este povo. E um dos aprendizados que tive por aqui, foi a
solidariedade na hora da doença.
Faz cinco meses que pisei nestas terras, e já passei por três malárias e
um tratamento odontológico. Embora possa parecer estranho, posso dizer que o
tratamento odontológico foi mais cansativo e doloroso que as malárias que
enfrentei. “Ricardo, que você está fazendo aí, pegando essas malárias? Volta
pro Brasil!”. Ouvi muito esse tipo de apelo espantado quando partilhei com
alguns amigos que estava com malária.
O tratamento dura três dias, com duas doses de quatro comprimidos por dia.
Este remédio afeta diretamente meu estômago, e a gente passa os dois primeiros
dias sentindo-se muito mal, sem poder comer quase nada e vomitando. Esse mal-estar
vem acompanhado por calafrios, febre e dores por todo o corpo. Estes são os
sintomas e consequências mais comuns da malária.
Quando fiquei sabendo que eu viria para Moçambique, fui muito alertado
sobre os riscos da malária. Entretanto, gostaria de dizer que estou suscetível
a esta doença como os brasileiros estão suscetíveis à dengue. A malária é uma
doença comum nestas terras, e há tratamento eficaz contra ela. Para não
contraí-la, é preciso se precaver, usar repelente e roupas compridas, impedindo
que o mosquito nos pique. A malária se manifesta quando nossa imunidade está
baixa.
É claro, não podemos negar que não são dias bons esses que a gente passa
com a malária. Porém, aprendi a conviver e tirar forças desta doença. Passo
três dias quase que inteiramente na cama, passando muito mal. Quando os sintomas começam a diminuir e as
minhas forças aumentam um pouco, sinto que tenho mais gana e mais sensibilidade
para continuar na missão! Partilhei isso com o pessoal que mora aqui
comigo, e isso foi motivo de riso, Mas o povo daqui também passa por malárias,
e acho que são até um pouco mais resistentes que eu...
Como disse, a malária causa muitas dores e sofrimentos. Mas pergunto: em
que lugar deste mundo não estamos suscetíveis a doenças ou quaisquer outros
perigos? E uma das qualidades do missionário é aceitar que se está em contato
com dores e sofrimentos que antes não eram passíveis de acontecer.
Sentir essas dores faz
parte da missão! Me fortaleço a cada malária, pois vim a Moçambique com o
objetivo de conhecer as alegrias e sofrimentos deste povo. Ao missionário não pode anunciar as belezas do Evangelho, entregar pão
e conforto, mas viver atordoado pelo medo de partilhar das mazelas deste povo.
Por isso, quero dizer a todos que leem estas linhas – truncadas, doídas
e, até certo, ponto assustadoras –, principalmente àqueles que desejam entregar
a sua vida aos demais, em missão na África ou em qualquer outro lugar, até na
rua da sua casa: Não tenha medo de
enfrentar se expor às mazelas e perigos da missão!
Repito, com todas as forças: quando
nos entregamos de coração e alma à missão, não há dor que impeça o nosso
progredir. As dores da malária são
uma porção mínima do que a missão tem a nos oferecer, e garanto que as belezas,
alegrias, sorrisos, carinhos, abraços são muito maiores em número e em
qualidade.
Não deixemos que as dores das diferentes malárias existentes no mundo
nos paralisem. Avante! Com fé, esperança, felicidade e amor sempre, e, acima de
tudo o amor, como disse São Paulo!
Fr. Ricardo Klock msf
Nenhum comentário:
Postar um comentário