Uma palavra inicial
Apesar
da indisposição com a qual aceitei a proposta, vivi como um tempo de graça os
30 dias de visita aos coirmãos da Província de Kalimantan. Ainda durante as
viagens, tive a possibilidade de partilhar com coirmãos e amigos/as as
impressões, emoções e reflexões que esta imersão provocava.
Concluído o
percurso, mas ainda sob o calor – que em se tratando de Indonésia é bem mais
que uma metáfora – das experiências, aproveitei os dois dias de permanência em
Jakarta para rever, corrigir, unificar e ilustrar as crônicas desta aventura
fraterna e missionária.
Antes de
entregar (de novo) estas anotações e imagens aos olhares e mentes sedentos de
beleza e de solidariedade – agora, em episódios semanais
neste blog – gostaria de deixar bem claro que estas páginas não contém uma
descrição objetiva e completa da vida e da missão dos meus coirmãos. Este é um
objetivo que não me propus e, ademais, creio ser uma tarefa impossível.
Vemos as coisas sempre a partir das proprias janelas... |
Uma visita,
ainda mais quando se trata de um país e uma cultura tão distintos como é este
caso, é uma caminhada na ponta dos pés num terreno que não nos pertence, que
nos é desconhecido e que devemos ter o cuidado de não des-encantar. Nosso olhar deve permanecer sempre casto, evitando des-cobrir e invadir um mundo que
permanece sempre original e incomparável. A própria originalidade do idioma é
um convite a tomar consciência da necessidade deste respeito.
Em muitos
momentos, lembrei-me da experiência de Moisés, no monte Horeb (cf. Ex 3,1-7).
Precisamos acordar da nossa imersão do mundo das coisas conhecidas e
catalogadas, perceber as novidades falantes e transcendentes que se escondem em
coisas simples (como a sarça que queima sem parar) e tirar as sandálias dos
nossos préconceitos e interesses. Estes podem macular e destruir a
originalidade das pessoas e coisas que vemos e encontramos.
Entrar na
realidade despojado – com os pés descalços, como faz o povo daqui – é uma condição
para deixar o mundo diferente entrar em nós, para a aproximação afetiva que poderá sustentar uma possível e respeitosa distância crítica. É preciso evitar um mal dito distanciamento crítico que,
prescindindo de laços unitivos, analisa, fragmenta, corta e manipula a
realidade, fazendo-a entrar no estreito leimite dos recipientes mentais,
marcados por mundos e interesses tão frios quanto prepotentes.
A própria
necessidade da mediação de um tradutor para entender ao menos a superfície ou a
periferia das palavras, conceitos e e experiências dos coirmãos já deveria ser
uma advertência suficiente para não se apressar nas conclusões. Na verdade, a
tradução possibilita o mínimo entendimento, mas esconde muitíssimo, desvela
algumas coisas mas mantém no mistério muito mais.
Tenho
consciência de que uma espécie de concupiscência
mental não me permitiu a presença e o olhar despojados e acolhedores a que
me referi acima. As recorrentes comparações e as observações curiosas denunciam
essa dificuldade de manter uma relação aberta, dialógica e receptiva. Mas
espero que a leitura que você faz possa superar estes limites e constuir uma
imagem mais aberta e verdadeira de Kalimantan.
Finalmente,
quero dizer que esta partilha tem uma intenção claramente missionária: em
primeiro lugar, fazer uma homenagem agradecida e reverente aos missionários que
atuaram e atuam nessa região; em segundo lugar, despertar e avivar a paixão
missionária que dorme no peito de cada coirmão e amigo/a e que floresce e
frutifica em muitos momentos e de muitas formas concretas.
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