Em defesa
dos territórios e dos direitos dos povos indígenas, quilombolas, pescadores artesanais e demais
populações tradicionais
Nós, Bispos do Brasil, reunidos na 50ª Assembleia Geral,
reafirmamos nosso compromisso com os povos indígenas, quilombolas, pescadores artesanais e demais
populações tradicionais, pelo fortalecimento de suas identidades e organizações
próprias, na defesa dos seus territórios, na educação intercultural bilingue dos
povos indígenas e na defesa de seus direitos. “A
partir dos princípios do Evangelho, apoiamos a denúncia de atitudes contrárias
à vida plena em nossos povos de origem e nos comprometemos a prosseguir na obra
da evangelização (...), assim como a procurar as aprendizagens educativas e de
trabalho com as transformações culturais que isso implica” (cf. DAp 530).
A Constituição Federal de 1988, ao confirmar o direito
territorial dos povos indígenas e das comunidades quilombolas, bem como dos
pescadores artesanais e outras populações tradicionais, representou muito mais
do que a necessária reparação do erro histórico da apropriação de suas terras e
da escravidão. É o reconhecimento da sociedade brasileira de que para esses
povos a terra e a
água são um bem sagrado, que vai além da mera produção para sobrevivência, não
se reduzindo à simples mercadoria. É patrimônio coletivo de todo um povo, de
seus usos e costumes, assim como a apropriação dos seus frutos.
Ao
Governo Federal, cabe o dever constitucional de reconhecer, demarcar, homologar
e titular os territórios indígenas, quilombolas e das demais populações
tradicionais, ressarcindo seus direitos, passo fundamental e determinante para
garantir sua sobrevivência. Sem a garantia de acesso à terra, elemento base da
cultura e da economia dessas populações, elas continuarão a sofrer opressão,
marginalização, exclusão e expulsão, promovidas por empresas depredadoras, pelo turismo, a especulação
imobiliária, o agronegócio e pelos projetos governamentais, como as grandes
barragens, que têm invadido áreas
cultivadas, alterando o ciclo de vida dos rios e provocando o
despovoamento de suas margens.
Lamentamos
profundamente o adiamento dos procedimentos administrativos de demarcação, a
invasão e a exploração das terras dos povos tradicionais. Chamamos especial
atenção para as condições de confinamento e os assassinatos que vitimam o povo
Guarani-Kaiowá, no Mato Grosso do Sul. Um verdadeiro genocídio está em curso, maculando
a imagem de nosso País como defensor dos direitos humanos.
Repudiamos,
de modo veemente, o ataque desferido pela bancada ruralista e outros segmentos
do Congresso Nacional aos direitos dos povos indígenas, consignados em nossa
Carta Magna, através de proposta de emenda constitucional, a PEC 215/2000.
Em
relação às comunidades quilombolas, preocupa-nos a morosidade no reconhecimento
dos seus territórios. Rejeitamos a sórdida estratégia de questionar a
constitucionalidade do processo de titulação de suas terras, de modo a impedir
os trâmites legais que atendam aos seus legítimos anseios.
Conclamamos
o Governo brasileiro ao cumprimento da Constituição Federal e dos instrumentos
internacionais dos quais o Brasil é signatário, especialmente a Convenção 169
da Organização Internacional do Trabalho – OIT; à proteção dos direitos dos
indígenas, quilombolas, pescadores artesanais e das demais populações
tradicionais, como forma de pagamento da dívida histórica que o Brasil tem com
esses povos, demarcando e homologando os seus territórios, impedindo sua
invasão, em defesa dos mais pobres e vulneráveis em nosso País.
Sob
a proteção de Maria, a quem invocamos como Rainha e Padroeira, Nossa Senhora
Aparecida, confiamos a proteção do nosso povo que constrói, na fé e esperança, um
Brasil verdadeiramente para todos.
Aparecida –
SP, 23 de abril de 2012
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