SÍNODO: A ESPERANÇA DE UMA ABERTURA
A primeira fase do Sínodo da família
iniciou-se em Roma ao mesmo tempo em que o Brasil fervilhava com o primeiro
turno das eleições. O clima tenso e agressivo não permitia pensar em nada mais.
Agora, uma vez apuradas as urnas e enquanto se respira para começar a peleja do
segundo turno – que promete ser pior do que o primeiro – há tempo para voltar
os olhos para o Vaticano, onde se realiza tão importante reunião.
A família é há muito tempo uma pedra no
sapato da Igreja. Embora seja a célula mater da evangelização, a pastoral
familiar encontra-se há anos, sobretudo, eu diria, desde os anos 60, lutando
com obstáculos e impedimentos que dificultam à Igreja um diálogo franco e
aberto com os fiéis sobre as questões da vida familiar.
Entre as mais polemicas está certamente a
da volta à vida sacramental dos casais em segunda união. A norma da
indissolubilidade do matrimônio tira do horizonte dos fiéis a possibilidade de
um novo casamento se o primeiro fracassa. E o fato é que desde que a libertação
sexual explodiu como uma bomba atômica nos anos 1960, muitos casais católicos
optaram por separar-se de seus cônjuges e ingressar em uma segunda união. Mais:
muitas vezes esta segunda união tem muito mais evidentes características do que
deveria ser um matrimônio cristão que a primeira: amor, desprendimento, desvelo
pelo outro, etc.
Mais evidente ainda fica essa questão se
se considerarem as realidades cruéis e desumanas que tantas vezes a relação
conjugal fracassada traz para a vida das pessoas e sobretudo dos filhos, se os
há. No entanto, a moral católica tem sempre afirmado, insistentemente, a
excomunhão dos recasados, proibidos de participar efetivamente do sacramento da
Eucaristia. Essa atitude um tanto inflexível – que como tal tem sido denunciada
inclusive por autoridades da estatura do Cardeal alemão Walter Kasper – leva o
novo casal a ver-se declarado em pecado e, pior do que isso, sem perdão. Ou
seja, em uma situação pior do que um assassinato, já que neste caso, se o
assassino se arrepende, é perdoado e pode aproximar-se novamente da comunhão
eucarística.
No Brasil, a situação do matrimônio é bem
grave. O Censo do IBGE de 2010 mostra que as uniões consensuais – ou seja, não
sacramentais nem legais civilmente – são da ordem de 36,4%, ou seja, mais de
1/3 do universo de casais. E todos esses casais – de acordo com as respostas –
desejam participar da Eucaristia, receber a absolvição e a comunhão.
Não admira que a expectativa em relação ao Sínodo e suas conclusões seja enorme. Está em questão uma nova maneira de conceber a pastoral familiar, o trato e a relação da Igreja com as famílias católicas. Mas, pode-se esperar que seja efetivada alguma mudança real quanto a este ponto? Uma tradição tão arraigada na vida eclesial pode realmente mudar?
Não admira que a expectativa em relação ao Sínodo e suas conclusões seja enorme. Está em questão uma nova maneira de conceber a pastoral familiar, o trato e a relação da Igreja com as famílias católicas. Mas, pode-se esperar que seja efetivada alguma mudança real quanto a este ponto? Uma tradição tão arraigada na vida eclesial pode realmente mudar?
Pessoalmente, creio que há razão para ter
esperanças. O Papa Francisco, ao abrir o Sínodo, deixou claro o que esperava
dos seus membros: sinceridade para falar, respeito, humildade para escutar. E
uma atitude pastoral que seja realmente dedicada e misericordiosa para com os
fiéis.
Um grande bispo teólogo, Monsenhor Bruno
Forte, afirmou, em entrevista, que os aspectos doutrinais não podem ser
minimizados, mas que a doutrina não tem valor abstrato em si mesma nem pode ser
uma arma pesada. Pelo contrário, pode e deve ser sempre uma mensagem de
salvação. Pois seu centro é o amor de Deus, a misericórdia. Isso é a fé da
Igreja e esta, sim, é imutável. Uma fé que deve expressar-se olhando a
realidade das pessoas concretas, reais, não como juízo inclemente, mas como
amor e misericórdia em ato.
Tomara que o sentir de Monsenhor Bruno
Forte seja certeiro e corresponda realmente às conclusões e resultados deste
Sínodo, que apenas começa e ainda tem outra etapa para o ano que vem.
Certamente será de extrema importância para que os casais em segunda união e as
famílias que formaram se sintam acolhidas, acompanhadas e bem-vindas, e não
rejeitadas e marginalizadas como se fossem criminosas.
Para que isso aconteça, confiemos no Espírito
Santo, que nunca abandona a Igreja e está certamente presidindo os trabalhos
deste sínodo. Amém.
Maria Clara Lucchetti Bingemer
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