sábado, 12 de agosto de 2023

O Evangelho dominical (Pagola) - 13.08.2023

ANTES QUE NOS AFUNDEMOS

É surpreendente a atualidade que ganha nestes tempos de crise religiosa o relato da tempestade no Lago da Galileia. Mateus descreve com traços muito concretos a situação: os discípulos de Jesus estão sozinhos, longe de terra firme, no meio da insegurança do mar; o barco é sacudido pelas ondas, dominado por forças adversas; o vento é contrário, tudo se volta contra ele; é noite cerrada, as trevas impedem de ver o horizonte.

Assim vivem não poucos crentes o momento presente. Não há segurança nem certezas religiosas; tudo se tornou obscuro e duvidoso. A religião está sujeita a todo o tipo de acusações e suspeitas. Fala-se do cristianismo como uma religião em fase terminal, que pertence ao passado; diz-se que estamos entrando numa era pós-cristã. Na consciência de alguns, emerge a interrogação: não será a religião um sonho irreal, um mito ingênuo destinado a desaparecer? Este é o grito dos discípulos ao vislumbraram Jesus no meio da tempestade: “É um fantasma”.

A reação de Jesus é imediata: “Coragem, sou eu, não tenhais medo”. Encorajado por estas palavras, Pedro faz a Jesus um pedido sem precedentes: “Senhor, se és tu, manda-me ir a ti andando sobre as águas”. Pedro não sabe se Jesus é um fantasma ou alguém real, mas quer comprovar que se pode caminhar até ele, não sobre terra firme, mas na água, não confiando em argumentos seguros, mas na debilidade da fé.

Assim vive o crente a sua adesão a Cristo nos momentos de crise e escuridão. Não sabemos se Cristo é um fantasma ou alguém vivo e real, ressuscitado pelo Pai para a nossa salvação. Não temos argumentos científicos para o provar, mas sabemos, por experiência, que se pode caminhar pela vida sustentados pela fé n’Ele e na sua palavra.

Não é fácil viver desta fé despida. O relato evangélico diz-nos que Pedro sentiu a força do vento, ficou com medo e começou a afundar-se. É um processo muito conhecido: fixarmo-nos apenas na força do mal, deixarmo-nos paralisar pelo medo e afundarmo-nos na desesperança.

Pedro reage e, antes de se afundar completamente, grita: “Senhor, salva-me!” A fé é muitas vezes um grito, uma invocação, um apelo a Deus: “Senhor, salva-me”. Sem saber como nem porquê, é então possível perceber Cristo como uma mão estendida que sustenta a nossa fé e nos salva, ao mesmo tempo que nos diz: “Homem de pouca fé, por que duvidas?”

José Antonio Pagola

Tradução de Antonio Manuel Álvarez Perez

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