Proclamemos nossa fé em
Jesus de Nazaré com a própria vida!
As luzes natalinas continuam acesas, ainda há doces que esperam pela nossa
degustação, mas a festa do Natal de Jesus parece terminar em tragédia: no dia
26 fizemos memória do primeiro mártir cristão (Santo Estêvão) e no dia 28
recordamos o martírio das crianças de Belém pelas mãos do fraco, prepotente e
sanguinário Herodes. Na festa dos Santos Inocentes, somos chamados a proclamar
com a vida aquilo que professamos com os lábios, convocados a participar da
eucaristia com um coração simples e puro, com uma fé feita mais de ações que de
palavras e promessas.
São João nos diz que Deus é Luz e que nele não há
trevas. O evangelista também nos convida a caminhar na luz de Cristo, e isso
significa assumir serenamente nossos limites e pecados e viver em solidaria comunhão
com nossos irmãos e irmãs. Mediante a comunhão viva e ativa com próximo, que é
pecador como nós somos pecadores, abrimo-nos solidariamente a eles, o sangue de
Jesus Cristo purifica os nossos pecados e sua luz resplandece em nosso corpo,
em nossas relações. “Se caminhamos na Luz, então estamos em comunhão com
os outros”.
O Evangelho nos ensina que, nos sonhos, José reforça a consciência da
própria vocação: tomar conta da vida do Menino e protegê-lo de todos os riscos
e ameaças. A vida, em todas as suas formas e expressões, é santa e precisa ser
cuidada. A vida dos pobres e pequenos é mais santa ainda, e merece um cuidado
redobrado. Em vista disso, precisamos estar prontos a arriscar nossa própria
vida em favor de quem de nós necessita e a desprezar as aparentes e frágeis
seguranças. Nisso José, Maria e (mais tarde) Jesus são nossos mestres, desde
sempre.
Mateus nos mostra também que José, o carpinteiro de Nazaré e marido de
Maria, se inspira noutro José, aquele que fora vendido pelos próprios irmãos aos
comerciantes do Egito. É com ele que o carpinteiro de Nazaré aprendeu a sonhar.
As preocupações e esperanças que o envolvem inteiramente durante o dia se transformam
em sonhos noturnos. E mediante os sonhos, o pai e protetor de Jesus toma
consciência da urgência das situações, mostra-se pronto e faz-se obediente à
vontade de Deus. “José levantou-se, de noite, com o menino e a mãe,
e retirou-se para o Egito.”
O risco escondido no ventre das posições de poder é o obscurecimento da
mente e a idéia de que a coisa mais transcendente a ser feita é assegurar a sua
própria continuidade. Assim o fez Herodes e muitos outros que o seguiram, nos
palácios reais ou eclesiásticos, nas cúrias de todos os nomes e em todas as latitudes.
Herodes fica furioso porque os magos o fazem de bobo. Acostumado a se impor
pelo medo, Herodes não consegue admitir que alguém desobedeça suas ordens. A
fúria que dorme sob o disfarce da complacência é acordada pelo mais simples e
inocente sinal de insubmissão.
A raiva de Herodes contra os magos heroicamente desobedientes acaba se
voltando contra as crianças. Com medo de um concorrente ao trono, o rei opta pelo
extermínio dos inocentes. Aqui não importam tanto os acontecimentos históricos,
mas a serena constatação de que o medo e a prepotência dos poderosos sempre
fazem vítimas, e as crianças são atingidas em primeira linha, tanto pela fuga,
pela fome, pela morte ou pela orfandade como por outras consequências da
violência. Como diz o evangelista, citando o profeta Jeremias, a violência
sofrida pelos inocentes é um grito que brada aos céus.
A Igreja acolhe o testemunho das crianças anônimas de Belém e as
reconhece como mártires. Elas nem mesmo haviam conhecido Jesus e, menos ainda,
tinham aderido ao seu caminho. Mas tiveram a vida estraçalhada por causa de
Jesus Cristo. Mesmo sem dizer uma só palavra, essas inocentes crianças
confessaram com o sangue a chegada do Filho de Deus, abriram com seus pequenos
corpos os caminhos do Reino de Justiça e de Paz, e testemunharam a violência
mórbida e desumanizadora de Herodes. Mas, apesar das aparências contrárias, a
liturgia de hoje não é um lamento, mas um convite à confiança, e o salmista
deixa isso suficientemente claro.
Deus pai e mãe das vítimas, dos migrantes, dos órfãos e das viúvas: no
Menino da manjedoura mostraste ao mundo a glória da compaixão, e na fuga para o
Egito partilhaste o destino de todos os perseguidos por causa do teu Nome.
Aprendemos do livro santo que é da boca dos pequeninos que recebes o
perfeito louvor. As anônimas crianças de Belém anunciaram com o próprio sangue
a glória de teu Filho nascido na manjedoura. Faz com que nossa vida, tanto nos
grandes momentos como nas práticas cotidianas, testemunhe nossa fé em Jesus de
Nazaré e na aurora invencível do teu Reino. Assim seja! Amém!
Itacir Brassiani msf
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