quarta-feira, 18 de dezembro de 2019

ANO A | TEMPO DE ADVENTO | 4° DOMINGO – 22.12.2019


Sejamos capazes de ler os pequenos e eloquentes sinais de Deus!
Na intensa agitação que envolve a preparação para o Natal, o episódio que envolve o profeta Natã e o rei Davi nos lembra que a pressa é vizinha da superficialidade, e que ambas são um perigo para a fé lúcida e operante. O Advento é um convite à escuta despojada e ao diálogo aberto: escuta de Deus que fala, inclusive à margem dos livros e canais de TV, no silêncio do recolhimento e na contemplação profunda dos sinais dos tempos; diálogo tecido com os fios do intercâmbio, dos encontros com os diferentes, das ações solidárias, das preces engajadas. E é aqui, na espiritualidade do Advento, que brilham as figuras de José e de Maria.
À margem dos grandes acontecimentos, na periferia dos lugares importantes, no anonimato suspeito de Nazaré, Maria e José são capazes de discernir a Palavra de Deus na tenda da sua casa e na penumbra luminosa dos sonhos. Deus se revela apreciando a beleza daquela que seria sua desejada morada, da arca que abrigaria o sacramento da sua Aliança definitiva. “Alegre-se, cheia de graça! O senhor está com você!” E convida José a não ter medo, a acolher Maria e o mistério que carrega no seu ventre, a mostrar sua justiça e retidão descumprindo a lei que lhe dava a possibilidade de abandoná-la e denunciá-la.
Maria e José mostram-se disponíveis a engajarem-se de corpo e alma no desejo de Deus. Maria discute apenas o modo como isso poderá ser feito, pois sua preocupação não é construir um templo para que Deus habite no mundo, ou decorar uma bela árvore de natal. Ela aceita ser a morada de Deus e coloca-se a serviço dele. José não diz nada, não discute. Sua palavra é sua atitude. “Fez conforme o anjo do Senhor havia mandado e aceitou sua esposa”. Deus não esquece de ser misericordioso, e cumpre aquilo que promete! Em José ele encontra um colaborador ativo e fiel, que abre as portas para que Deus seja Emanuel, Deus conosco.
Mas o poder de Deus se mostra em mediações frágeis e pobres. Ele cumpre suas promessas através das pessoas que nele confiam e a ele se entregam. É isso que nos mostram José e Maria, a vida das comunidades dos primeiros discípulos e discípulas, e milhões de homens e mulheres pelos séculos a fora. Deus faz sua parte e cumpre o que promete, mas espera que façamos a grande parte que nos toca. Não nos preocupemos em construir templos, palácios e presépios. Deus prefere morar em nós, mesmo que sejamos pouco mais que pobres estábulos. Ele vem a nós como criança, e assim desperta em nós a ternura a solidariedade.
A preparação do Natal é uma tarefa que nos envolve da cabeça aos pés. Mas as luzes só têm sentido se forem expressão de um coração iluminado. Os presépios adquirem beleza na humana hospitalidade que acolhe indistintamente. Os presentes significam algo na medida em que nos transformam em dom, em presença gratuita e solidária, e nos fazem lembrar Aquele que é a Presença de Deus na carne humana. O Natal é sim uma festa familiar, mas jamais pode restringir-se ao aconchego de quatro paredes, ao cálido clima doméstico, fechado ao mundo, indiferente aos outros. Nossos sonhos, assim como nossos desejos, devem ir muito além!
Que as malhas e algemas de ideologias nefastas não nos impeçam de ver os sinais da visita de um Deus que não se apropria de todos os poderes, não tolhe a liberdade e a iniciativa dos humanos, nem se coloca acima de todos. “Deus acima de todos, e o Brasil acima de tudo” é um slogan pernicioso que não pode encontrar guarida nos lares e mentes dos cristãos. Tanto a gruta de Belém como a casa de Nazaré nos ensinam outras lições. Os direitos de Deus são os direitos dos humanos. Nada de morrer pela pátria ou viver sem razões!
Com Paulo, demos glória Àquele que pode nos confirmar na fidelidade ao Evangelho anunciado e realizado na carne de Jesus Cristo. Aquilo que estava escondido em doutrinas e ritos complicados, separados da vida ou opostos a ela, se tornou claro no mistério da encarnação e se tornou acessível a todos os povos e religiões. Deus é parceiro da humanidade, faz nela sua morada e suscita e sustenta iniciativas de humanização. Ele não se importa com a pureza moral dos indivíduos ou com os nacionalismos, mas com as dores e necessidades dos seus filhos. A ele prestamos serviço e culto, cuidando dos nossos semelhantes.
Deus pai e mãe, tu que fecundas nossa generosidade e fazes surgir água da rocha mais dura: suscita em nós a alegre disponibilidade de Maria e de José, a fim de que preparemos em nós mesmos, em nossas famílias, comunidades e Igrejas, um lugar para teu Filho e um espaço para teu povo. Livra-nos da doce tentação de construir apenas templos e presépios. Desperta em nós a atitude de José, para que sejamos capazes de acolher o bem que é feito mesmo à margem dos nossos planos e fora das nossas Igrejas. E que teu amor e tua fidelidade se renovem nas mil alianças históricas que esperam por nosso sim. Assim seja! Amém!
Itacir Brassiani msf
Profecia de Isaías 7,10-14 | Salmo 23 (24)
Carta de Paulo aos Romanos 1,1-7| Evangelho de São Mateus 1,18-24

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