quinta-feira, 19 de dezembro de 2019

O Evangelho dominical (Pagola) - 22.12.2019


NÃO NECESSITAMOS DE DEUS ENTRE NÓS?

Há uma pergunta que todos os anos me ronda desde que começo a observar nas ruas, os preparativos que anunciam a proximidade do Natal: que pode haver ainda de verdade no fundo destas festas tão estragadas pelos interesses consumistas e pela nossa própria mediocridade?
Não sou o único. Ouço muitas pessoas falar da superficialidade do Natal, da perda do seu caráter familiar e caseiro, da vergonhosa manipulação dos símbolos religiosos e de tantos excessos e despropósitos que deterioram hoje o Natal.
Mas, na minha opinião, o problema é mais profundo. Como pode celebrar o mistério de um Deus feito homem uma sociedade que vive praticamente de costas para Deus e que destrói a dignidade do ser humano?
Como pode celebrar o nascimento de Deus uma sociedade em que o famoso professor Lipovetsky, ao descrever a atual indiferença, foi capaz de dizer estas palavras: «Deus morreu, os grandes objetivos extinguem-se, mas para todo o mundo é igual, esta é a feliz notícia?
Aparentemente, são muitas as pessoas para quem é exatamente igual acreditar ou não acreditar, ouvir que Deus está morto ou que Deus nasceu. A sua vida continua a funcionar como de costume. Não parecem necessitar já de Deus.
E, no entanto, a história contemporânea já nos está a obrigar a colocar algumas questões sérias. Algum tempo atrás, falava-se da morte de Deus; hoje fala-se da morte do homem. Alguns anos atrás, proclamava-se o desaparecimento de Deus; hoje anuncia-se o desaparecimento do homem. Será que a morte de Deus não leva consigo inevitavelmente à morte do homem?
Expulso Deus das nossas vidas, encerrados num mundo criado por nós mesmos e que reflete apenas as nossas próprias contradições e misérias, quem nos pode dizer quem somos e o que realmente queremos?
Não precisaremos que Deus nasça novamente entre nós, que brote com luz nova nas nossas consciências, que abra caminho no meio de nossos conflitos e contradições?
Para nos encontrarmos com esse Deus, não há que ir muito longe. Basta aproximar-nos silenciosamente de nós mesmos. Basta mergulharmos nas nossas interrogações e desejos mais profundos.
Esta é a mensagem do Natal: Deus está perto de ti, onde tu estás, desde que te abras ao Seu Mistério. O Deus inacessível fez-se humano e a sua proximidade misteriosa envolve-nos. Em cada um de nós, pode nascer Deus.
José Antônio Pagola.
Tradução de Antônio Manuel Álvarez Perez.

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