NÃO NECESSITAMOS DE
DEUS ENTRE NÓS?
Há uma pergunta que todos os anos me ronda desde
que começo a observar nas ruas, os preparativos que anunciam a proximidade do
Natal: que pode haver ainda de verdade no fundo destas festas tão estragadas
pelos interesses consumistas e pela nossa própria mediocridade?
Não sou o único. Ouço muitas pessoas falar da
superficialidade do Natal, da perda do seu caráter familiar e caseiro, da
vergonhosa manipulação dos símbolos religiosos e de tantos excessos e despropósitos
que deterioram hoje o Natal.
Mas, na minha opinião, o problema é mais profundo.
Como pode celebrar o mistério de um Deus feito homem uma sociedade que vive
praticamente de costas para Deus e que destrói a dignidade do ser humano?
Como pode celebrar o nascimento de Deus uma
sociedade em que o famoso professor Lipovetsky, ao descrever a atual
indiferença, foi capaz de dizer estas palavras: «Deus morreu, os grandes objetivos
extinguem-se, mas para todo o mundo é igual, esta é a feliz notícia?
Aparentemente,
são muitas as pessoas para quem é exatamente igual acreditar ou não acreditar,
ouvir que Deus está morto ou que Deus nasceu. A sua vida continua a funcionar
como de costume. Não parecem necessitar já de Deus.
E, no entanto, a história contemporânea já nos está
a obrigar a colocar algumas questões sérias. Algum tempo atrás, falava-se da
morte de Deus; hoje fala-se da morte do homem. Alguns anos atrás, proclamava-se
o desaparecimento de Deus; hoje anuncia-se o desaparecimento do homem. Será que
a morte de Deus não leva consigo inevitavelmente à morte do homem?
Expulso
Deus das nossas vidas, encerrados num mundo criado por nós mesmos e que reflete
apenas as nossas próprias contradições e misérias, quem nos pode dizer quem
somos e o que realmente queremos?
Não precisaremos que Deus nasça novamente entre
nós, que brote com luz nova nas nossas consciências, que abra caminho no meio
de nossos conflitos e contradições?
Para
nos encontrarmos com esse Deus, não há que ir muito longe. Basta aproximar-nos
silenciosamente de nós mesmos. Basta mergulharmos nas nossas interrogações e
desejos mais profundos.
Esta é
a mensagem do Natal: Deus está perto de ti, onde tu estás, desde que te abras
ao Seu Mistério. O Deus inacessível fez-se humano e a sua proximidade misteriosa
envolve-nos. Em cada um de nós, pode nascer Deus.
José
Antônio Pagola.
Tradução
de Antônio Manuel Álvarez Perez.
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