O coração da santidade é a fome e a sede de justiça.
A solenidade
todos os santos e santas é a oportunidade para lembrar que a verdadeira
santidade de Deus que se manifesta na vida das pessoas que ousam sair do
estreito limite dos seus próprios interesses e se se aproximarem dos pobres;
que vão aos rincões mais distantes para levar a bandeira da paz; que são
movidas por uma insaciável sede de justiça; que choram as dores dos povos de
todas as cores, e provam o fel da perseguição; que transformam a terra pela
mansidão.
A recente
canonização da Santa Irmã Dulce dos Pobres não deve nos induzir a esquecer das
santas e santos esquecidos, daqueles que não chegaram aos altares e não têm um
dia especial, que gastaram a vida anonimamente e cujos milagres não cabem nas
estreitas regras que enquadram os milagres; e até de gente que não rezou pelo
nosso catecismo, como Lutero, Martin Luther King, Gandhi, e tantos outros. Hoje
celebramos a memória daqueles que nos antecederam na fé e cujo testemunho
mantém a Igreja e a humanidade no caminho certo, apesar das suas ambivalências.
Mas a
celebração de todos os santos e santas também não deve nos levar a olhar
somente para o passado. É provocação a refletirmos sobre a vocação fundamental
de todos os cristãos. É verdade que a santidade é um caminho estreito e uma
vocação exigente, mas isso não significa que seja reservada a alguns grupos
especiais de cristãos. O Concílio Vaticano II proclama de forma clara, contra a
ideia predominante nas Igrejas, que a santidade não é privilégio dos ministros
ordenados e das pessoas consagradas, ou dos grupos que podem pagar um processo
de elevado custo.
Na passagem
do milênio, o hoje São João Paulo II nos provocava a não contentarmo-nos com
pequenas medidas ou voos rasantes, e pedia que aspirássemos nada menos e nada
mais que à santidade. Este chamado à santidade precisa se transformar em desejo
pessoal e em decisões e ações concretas. Nós somos chamados filhos de Deus e já
o somos desde agora, mas somos desafiados a crescer na identificação com Jesus
Cristo, a gravar no corpo e na mente as marcas da sua vida. “Seremos
semelhantes a ele...” E isso deve ser mais que um simples sentimento.
Jesus Cristo
é o verdadeiro e perfeito santo de Deus e, ao mesmo tempo, o caminho para a
santidade. Não há santidade à margem do seguimento de Jesus Cristo. Trata-se de
refazer o caminho prático trilhado por Jesus: “amar como Jesus amou; sonhar
como Jesus sonhou; pensar como Jesus pensou; viver como Jesus viveu; sentir
como Jesus sentia...” Este é o caminho para que, no meio ou no fim da vida,
sejamos felizes, bem-aventurados, santos/as. O caminho para santidade,
percorrido pelo próprio Jesus Cristo, é pavimentado pelas bem-aventuranças!
Como nos
lembrou o Papa Francisco, as bem-aventuranças apresenta os sinais que indicam o
caminho da santidade. Não se fala de oito grupos específicos de pessoas, mas de
oito características de quem percorre este caminho. Esta via sagrada começa com
a pobreza e termina com a perseguição, que não representa um obstáculo. A
consolação é para os aflitos, a terra é para os mansos, a abundância é para os
famintos, a misericórdia é para os compassivos, a visão de Deus é para os puros
e a filiação divina é para os promotores da paz.
Felicidade e
santidade não significam ausência de dificuldades, mas realização plena e
profunda do ser humano. Mais que perfeição, santidade é perseverança no amor e
no serviço solidário. Passa longe do Evangelho uma santidade que se resuma em
práticas de piedade e devoções. Está distante da essência humana uma felicidade
baseada no sucesso pessoal, indiferente à sorte dos semelhantes. As pessoas que
se vestem de branco e trazem palmas nas mãos são aquelas que vieram da grande
tribulação que encarnaram o Evangelho no mundo e na própria vida.
Deus pai e mãe, fonte de toda santidade: dá-nos a
graça de permanecermos sempre de pé diante do teu Filho, em meio a uma nuvem de
testemunhas, rodeados/as de gente de todas as nações, tribos, raças, línguas,
gêneros e idades. Fica conosco e caminha à nossa frente, para que estejamos
sempre prontos/as a amar e servir. E que a inexplicável alegria em meio às
intermináveis lutas seja nossa arma e nosso triunfo, num país maldosamente
polarizado. E então estaremos vivendo em comunhão com aqueles que te louvam no
céu e na terra. Assim seja! Amém!
Itacir Brassiani msf
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