quarta-feira, 19 de maio de 2021

ANO B | TEMPO PASCAL | SOLENIDADE DE PENTECOSTES | 23.05.2021

O Espírito renova e revoluciona tudo, começando por nós!

A festa de Pentecostes fecha o ciclo do tempo pascal.  Como a comunidade apostólica dos sagrados começos, pedimos que o Espírito realize em nós a obra do Pai e do Filho, nos dê respiro e vida, nos ensine a testemunhar e anunciar o Reino de Deus na língua das diversas culturas, derrube os muros que os medos e prepotências ergueram, desperte a imaginação e a indignação proféticas, construa pontes de diálogo e colaboração, abra as portas das Igrejas e as coloque em ritmo de saída. Pois é o Espírito de Deus quem cria os vínculos entre as criaturas, suscita e sustenta os processos de libertação e garante a liberdade e a criatividade.

Escrevendo à comunidade cristã de Corinto, Paulo sublinha: há diversidade de dons, mas o Espírito é o mesmo; diferença de funções mas o Senhor é o mesmo; multiplicidade de ações, mas um só Deus. Por isso, não há como sustentar a supremacia do clero sobre os demais fiéis, dos homens sobre as mulheres, dos católicos sobre os evangélicos, dos crentes sobre os ateus. No bojo da ventania que vem do Espírito de Jesus, caem também os muros que separam religiões pretensamente verdadeiras das assim chamadas simples crenças, como também as escadas que elevam as religiões que se auto definem verdadeiras e rotulam as demais como falsas. E são carimbadas como ultrapassadas todas as ideologias que separam os mundos espiritual e material.

Um dos traços da experiência Espírito que ficou gravada na mente dos apóstolos é o ruído de um vento forte e a imagem de línguas de fogo repousando sobre a comunidade reunida. Vento forte e línguas de fogo remetem a um dinamismo incontrolável, a uma força que move e leva adiante, a uma palavra cálida, forte e mobilizadora. São imagens que lembram o furacão da profecia, a eloquência de homens e mulheres que falam, gritam e agem em nome de sonhos e ideais que pertencem a todos/as. Aquele punhado de gente medrosa e teimosa reunida em Jerusalém passa a falar intrepidamente e a enfrentar autoridades e sistemas constituídos.

É claro que a vida no Espírito se expressa na oração, na adoração, no canto, na consolação e na alegria, mas é mais claro ainda que não se resume nisso. Jesus Cristo é o homem do Espírito, e sua proposta não é a de um guru a serviço do bem-estar individual. Ele é modelo de uma vida descentrada de si, de uma atuação absolutamente voltada às necessidades e à dignidade dos/as outros/as, de uma inserção questionadora e transformadora no palco da história. A obra do Espírito Santo no mundo não se mostra nos templos monumentais ou nas instituições sólidas, mas em homens e mulheres novos, livres e solidários.

O Espírito é o sopro de Deus que faz novas todas as coisas, renova a face da terra. Mas ele costuma começar renovando radicalmente as pessoas que seguem Jesus Cristo, despindo-as da roupagem da indiferença, purificando-as da impureza da dominação, desautorizando aquela “velha opinião formada sobre tudo”, dispersando o pó que se acumulou sobre as doutrinas e leis, abrindo as janelas fechadas pelo medo, fazendo-as renascer no ventre da liberdade e da gratuidade. Assim aconteceu com Jesus, assim são chamados a ser aqueles que nele acreditam e receberam seu divino Sopro.

Por isso, o acontecimento da vinda do Espírito Santo é também o lançamento missionário da comunidade dos discípulos e discípulas de Jesus. “Como o Pai me enviou, eu também envio vocês!” Ele os envia com a missão de tirar o pecado do mundo e arcar com seu custo, como ele mesmo o fez, o Cordeiro de Deus que tira o pecado do mundo. Tirar o pecado do mundo (no singular!) significa, entre outras coisas, combater sem tréguas o vírus da indiferença e do ódio, como combatemos o Covid-19. Como não se preocupar com o fomento interesseiro do ódio a tudo o que possa mudar minimamente a estrutura classista e excludente da sociedade brasileira?

Quem recebe o Espírito de Jesus e por ele se deixa guiar perde para sempre a tranquilidade de quem se esconde atrás dos muros dos condomínios fechados e dos ritos que anestesiam e aprisionam as consciências. O Espírito fere de morte todas as formas de indiferença e de fechamento! Quem hospeda o Espírito e nele renasce fica a quilômetros de distância do imobilismo omisso, pregado em cultos frequentados por multidões sedentas de prosperidade e de cura, e se engaja no caminho ecumênico, sonhando com o dia em que todos seremos um.

A ti, Deus pai e mãe, voltamos nossos olhos e nossas mãos para pedir, com todas as forças: envia sobre nós e sobre a Igreja teu divino Sopro! Sem ele, a missão é apenas conquista; a igreja é mera sociedade de classes; o Evangelho se reduz à lei fria; a moral infantiliza e aprisiona; o ministério se reveste de poder e tirania; a liturgia vira fuga do compromisso. Envia teu Espirito e revitaliza os ossos ressequidos, sacude as democracias vazias e questiona governos autoritários e saqueadores, mesmo se reivindicam o selo de cristãos. Assim seja! Amém!

Itacir Brassiani msf

Atos dos Apóstolos 2,1-11 | Salmo 103 (104) | 1ª Carta de Paulo aos Coríntios 12,3-13 | Evangelho segundo João 20,19-23

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