quinta-feira, 1 de setembro de 2022

ANO C | TEMPO COMUM | VIGÉSIMO-TERCEIRO | 04.09.2022

O Evangelho nos ajuda a viver com lucidez e liberdade.

Estamos em plena ‘Semana da Pátria’, e sobram apelos vazios ao amor patriota e afirmações cínicas de defesa da soberania nacional. A figura de um presidente tosco e violento que quer continuar governando disfarça um programa de lesa-pátria. E Jesus Cristo, Palavra viva de Deus, chama a nossa atenção para as consequências da palavra dada e para os custos da realização das nossas decisões. Temos mesmo disposição de ir a fundo no seguimento dos seus passos?

Nosso momento cultural não valoriza a prudência e o planejamento. A caderneta de poupança, com seu apelo a economizar, é coisa do passado. Hoje, reina absoluto o cartão de crédito, com seu permanente convite a gastar sem planejamento, a seguir apenas os insaciáveis desejos de consumo. O que se impõe como regra é curtir e saborear a fundo o momento presente, sem preocupação com princípios formulados no passado, nem com aquilo que acontecerá no futuro.

Nesse ambiente, o seguimento responsável e maduro de Jesus Cristo está ameaçado. Precisamos nos perguntar se nossa decisão tem fundamento. É claro que, para a maioria dos fiéis, o início da caminhada na fé cristã não está ligado a uma decisão pessoal, consciente e madura. Recebemos a fé cristã e católica misturada ao leite da mãe, ligada aos hábitos da nossa vizinhança, conjugada com a cultura transmitida pela escola. Seguimos esta estrada porque nos parecia a única, e o fizemos como ovelhas indiferenciadas de um rebanho.

Mas, graças a Deus, crescemos, e os tempos mudaram. O pluralismo das opções que batem à nossa porta ou se oferecem aos nossos olhos todos os dias nos interpelam à aventura noutras estradas, ou a dar razões para permanecer naquela que sempre trilhamos. E hoje sabemos que o Evangelho nos pede prudência e avaliação crítica diante de atitudes e projetos que se travestem de sabedoria e se apresentam falsamente como religiosos. Jesus, com seu projeto de vida para todos, pede uma ruptura radical com a busca de vantagens individuais ou restritas.

Estar com Jesus e seguir seus passos supõe a decisão por uma específica escala de valores: a honra pessoal, a aceitação pública, a segurança dos bens e os próprios vínculos familiares são secundários em relação à prioridade absoluta da solidariedade com as vítimas, à abertura ao outro. A Palavra de Deus, feita carne em Jesus, nos mostra por onde andar. Tomar a cruz e caminhar com Jesus significa estar disposto/a a enfrentar a rejeição dos grandes e poderosos, libertar-se da busca infantil de cargos e honras e contar com a possibilidade do fracasso.

Preferir Jesus Cristo ao pai, à mãe, à mulher ou marido e aos filhos e filhas, à carreira e ao sucesso individual ou grupal significa viver as relações familiares fora dos moldes patriarcais, no horizonte da geração de um mundo de irmãos (como testemunha Paulo em relação a Onésimo e Filemon). É o próprio Jesus quem adverte: “Do mesmo modo, portanto, qualquer um de vós, se não renunciar a tudo o que tem, não pode ser meu discípulo”. Está claro que o problema não é possuir alguns bens, cultivar vínculos de amizade ou consumir de modo maduro e consciente, mas deixar-se dominar totalmente pelos bens e pelo consumo, como se o sentido da vida dependesse disso.

O seguimento de Jesus comporta renúncias e rupturas. A renúncia aos bens é um meio para percorrer com mais autenticidade um caminho que conduz à vida abundante, tanto para si mesmo/a como para os outros. Renunciar a tudo significa limpar a casa, abrir espaço, reordenar as prioridades e orientar-se pela compaixão misericordiosa proposta por Jesus, colocar Deus e o Outro acima de tudo. Jesus é a Palavra de Deus que nos desinstala e chama à conversão. Sua proposta está longe de ser um anestésico barato.

Jesus de Nazaré, irmão maior nos caminhos para uma humanidade irmanada e reconciliada, ensina-nos a avaliar bem as possibilidades e exigências do teu Evangelho. Alimenta-nos e ilumina-nos com a tua Palavra, para que nossa consciência não se anestesie diante dos imensos desafios que a situação do Brasil nos apresenta. Ajuda-nos a compreender as exigências do seguimento dos teus passos e a renunciar a tudo o que possa nos afastar de ti. E que Paulo nos estimule a lançar as sementes da igualdade nas terras de um mundo ainda desigual. Assim seja! Amém!

Itacir Brassiani msf

Livro da Sabedoria 9,13-18 | Salmo 89 (90) | Carta de Paulo  Filemon 4-17 |  Evangelho  de São  Lucas (14,25-33)

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