“Olhai
para a fé que anima a vossa Igreja…”
Repetimos esta oração em cada santa missa, após a recitação do Pai-Nosso
e antes do abraço da paz e da comunhão eucarística. Todos/as conhecemos a
oração de cor e salteado. Em alguns lugares, o presidente da celebração reza
com exclusividade, noutras a assembléia lhe faz coro.
“Senhor Jesus Cristo, que disseste aos vossos apóstolos: ‘Eu vos deixo a
paz! Eu vos dou a minha paz.’ Não olheis os nossos pecados, mas a fé que anima
a vossa Igreja. E dai-lhe, segundo o vosso desejo, a paz e a unidade. Vós que
sois Deus, com o Pai e o Espírito Santo.”
Já recitei esta oração milhares de vezes, mas hoje, aqui no interior do
Rio Grande do Norte, a oração mexeu comigo. O que me inquietou mesmo foi o
pedido para que Jesus Cristo não olhe para os nossos pecados, mas para a fé que
anima a sua Igreja. Concordo: ele olha a nossa fé, mas nós devemos ter viva
consciência dos nossos pecados eclesiais.
Lembrei-me das
diversas reações de padres e bispos aos resultados da última pesquisa do IBGE
sobre a pertença religiosa do povo brasileiro. A grande imprensa anunciou em
letras garafais (e com satisfação?) a queda do número de católicos, tanto em
termos relativos como absolutos. E chamou padres, teólogos e bispos para
interpretar estes números.
Os
dados são, resumidamente, os seguintes: em 1980, mais de 89% dos brasileiros se
diziam católicos, e hoje são apenas 64%; entre os anos 2000 e 2010 a Igreja
Católica teria perdido 1 milhão e 670 mil fiéis; nesse mesmo período, as igrejas
evangélicas ganharam 16 milhões de novos fiéis, e hoje representam 22% da
população brasileira.
Fiquei preocupado com três tipos de reação da hierarquia católica aos
números da pesquisa. Uns colocam em dúvida a seriedade dos métodos de pesquisa
do IBGE. Um outro grupo esgrima o resultado da pesquisa do CERIS, que evidencia
o crescimento do número de paróquias e de movimentos. E há ainda quem aproveita
os resultados para lançar uma nova ofensiva proselitista para reconquistar
adeptos.
Meu Deus, onde está ‘a fé que anima a nossa Igreja’? Qual é o problema
do crescimento das igrejas protestantes, inclusive das igrejas pentecostais? A
preocupação com este crescimento evidencia o pressuposto de que elas não são
queridas por Deus, que estão desviando o povo do Evangelho. Mas isso é um crasso
erro teológico e sinal de um preconceito inaceitável.
Pergunto-me se a veracidade da fé católica precisa ser garantida pela
manutenção de uma maioria numérica, e respondo que não. Também estou convicto
de que a igreja católica não tem a obrigação de crescer indefinidamente. A
autenticidade da fé se mostra mais da força de coesão, de missão e de transformação
que na massa numérica de fiéis.
Sinceramente, não estou preocupado com o crescimento numérico das
igrejas evangélicas, nem me animo com a multiplicação de paróquias e dioceses.
Alegro-me sim com a notícia de que as igrejas evangélicas estão abrindo portas
para que tanta gente encontre Jesus e seu Evangelho. E me preocupo com o
ressurgimento do integrismo católico e com estratégias pastorais focalizadas na
disputa de fiéis com as demais tradições cristãs.
Como faz falta uma fé cristã, pura, aberta, coerentemente evangélica nas
nossas igrejas... Como é destrutiva uma orientação exclusivista, institucional,
estreita. Junto com a fé autêntica, precisamos buscar de fato paz e unidade,
mas não só nos estreitos limites da instituição católica. Peçamos a paz, a
comunhão e a cooperação entre todas as igrejas cristãs. E assim o Evangelho
será uma força diferenciada e eficaz de humanização e de transformação.
Itacir Brassiani msf
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