Jesus Cristo é a perfeita expressão e medida do amor cristão.
Amor é uma palavra à
qual damos sentidos muito diferentes. A maioria das pessoas coloca o amor no
âmbito dos sentimentos e, com isso, acaba eliminando sua essência. Se é verdade
que o Evangelho segundo João dá ao amor fraterno um lugar central no anúncio de
Jesus, não podemos esquecer que os evangelhos sinóticos conferem esta mesma
centralidade à prática da nova justiça do Reino de Deus. Por isso, é preciso
escutar com atenção a proposta que Jesus nos faz no trecho do Evangelho do
sexto domingo do tempo pascal.
Um caminho que pode
nos ajudar a evitar as armadilhas do sentimentalismo é compreender o amor mais
como verbo que como substantivo. A questão é como amar, e não o que é o amor.
Quem conjugou o verbo amar em todos tempos, modos e pessoas foi Jesus Cristo.
As primeiras comunidades cristãs compreenderam e expressaram isso de muitos
modos, mas sobressai o que lemos na primeira carta de João: “Nisto se tornou
visível o amor de Deus entre nós: Deus enviou o seu Filho único a este mundo para
dar-nos a vida por meio dele”. Jesus de Nazaré, em suas palavras e ações é como
a vitrine que expõe o amor de Deus no mundo.
Eis como Jesus
concretizou o amor: acolheu pecadores e resgatou a dignidade deles;
compadeceu-se dos famintos e multiplicou pães e peixes em favor deles;
comoveu-se com o sofrimento das pessoas doentes
e deu-lhes condições de plena cidadania;
atendeu às necessidades de pagãos e estrangeiros, dividindo com eles
aquilo que era destinado apenas aos judeus; aproximou-se das pessoas excluídas
e sentou-se com elas à mesa; tomou a defesa de mulheres condenadas
violentamente pelos próprios homens que as usavam; afirmou profeticamente que
os últimos da escala social são os primeiros na perspectiva de Deus.
Tudo isso porque Deus
é amor, e seu amor não se mostra em suspiros e sentimentos superficiais, mas em
ações que garantem a quem é diferente o direito de ser e atendem suas
necessidades sem impor qualquer espécie de condição. Jesus diz que nos ama na
mesma dinâmica e com a mesma intensidade com que é amado pelo seu e nosso Pai.
E é nessa força e nesse espírito que somos chamados e capacitados a amar. O
amor de Deus que se tornou visível em Jesus Cristo se torna em nós dom e
mandamento. “O meu mandamento é este: amem-se uns aos outros assim como eu amei
vocês”.
Como Jesus nos
revelou, a vivência do amor tem mais a ver com decisão e vontade que com
sentimento. O sentimento é involuntário, e se impõe sobre a vontade, enquanto que
o amor é a decisão de fazer-se próximo e servidor/a de quem é diferente e pode
estar precisando de nós, e não mero sentimento. Amar significa bem-querer,
bem-dizer e bem-fazer, tudo ao mesmo tempo. É desejo, palavra e ação. É nessa
linha que João nos interroga: “Se alguém possui os bens deste mundo e, vendo
seu irmão em necessidade, fecha-lhe o coração, como pode o amor de Deus
permanecer nele?” (1Jo 3,17)
No evangelho que
meditamos hoje, Jesus apresenta a si mesmo como medida e referência do amor:
“Amem-se uns aos outros assim como eu
amei vocês”. Com isso, Jesus quer nos libertar da tentação de colocar nossos
desejos como referência essencial para todas as relações. O amor se concretiza
no relacionamento de igual para igual, na abolição de hierarquias, senhorios e
servidões, na atitude de serviço gratuito e irrestrito. O próprio Jesus não nos
trata como servos/as mas como iguais, pois não reserva nada para si mesmo, e
comunicar tudo significa confiar irrestritamente.
Mas o amor cristão tem
múltiplas dimensões, e uma delas é a dimensão social, apostólica ou
missionária. Está muito claro que o amor generoso e intenso com que Jesus nos
ama não tem como finalidade criar um clube de bajuladores ou publicitários que
alardeiam suas qualidades divinas. O
amor maduro frutifica em missão solidária e transformadora, em luta em favor
das pessoas e grupos fragilizados. O
amor de Jesus Cristo se realiza quando renascemos e agimos como pessoas
adultas, capazes de agir orientados pelas próprias convicções e por valores
essencialmente humanos. E a amizade com Jesus se mostra na participação na sua
missão.
Jesus de Nazaré, filho de Deus e filho da humanidade,
fonte e medida de todo amor: faze com que teu amor por nós se transforme em
amor pelos irmãos e irmãs, e converte tua Igreja, hierárquica e desigual, em
comunidade de pessoas amigas e igualmente servidoras. Faze com que, inspirados
em Paulo, deixemos de ser defensores/as infantis das instituições (por mais
“sagradas” que sejam) e vivamos como testemunhas de um amor despojado,
crucificado e renovado. Ajuda nossas autoridades religiosas e políticas, como
também nossas mães, a descobrirem que permanecem sempre e fundamentalmente
humanas, e isso é bom. Assim seja! Amém!
Itacir Brassiani msf
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