segunda-feira, 4 de junho de 2012

Kalimantan: impressões, emoções e reflexões (5)


A missão em terras equatoriais

Nas terras equatoriais, o barco é sempre indispensavel.
Continuamos realizando nossa visita aos coirmãos que vivem e trabalham na diocese de Palangka Raia. Na verdade, uma das comunidade à qual pertencem os coirmãos que vivem na sede da diocese tem sede em Sampit, cidade portuária situada às margens do rio do mesmo nome, a 4 horas (ou 230 km) de Palangka Raya. (A outra, está na região de Ampah, que conheceremos em seguida). Foi nessa região que a Congregação celebrou seu debut na missio ad gentes em sentido estrito, lá no longínquo 1926. Daqui os missionários provindos da Holanda, da Alemanha e, mais tarde e em menor número, da Polônia, se espalharam pelos territórios de Kalimantan e de Java.
Além do bispo Dom Aloísio Sutrisnaatmaka, vários outros coirmãos das Províncias de Kalimantan e de Java vivem e trabalham nessa região. Entre eles, dois estão diretamente a serviço da diocese e do bispo: Pe. Timóteo I Ketut Adi Hardana, da Província de Kalimantan, que nos acompanha como tradutor e motorista, trabalha como secretário geral da diocese; Pe. Andreas Tri Adi Kumiawan, membro da Província de Java, atua como ecônomo diocesano. Ambos também contribuem, juntamente como o Pe. Garinsingan, do qual falarei mais tarde, como professores na Escola Superior de Formação Cristã mantida pela diocese.
Igreja-matriz de Sampit
 
A poucos passos do centro diocesano de pastoral, a Província de Kalimantan tem uma pequena casa onde residem dois coirmãos: o Ir. Marceltus Mardarman Hasan, natural de Flores, que frequenta o curso superior de formação cristã e, mesmo tendo sido forçado a se tornar irmão por falta de capacidade intelectual, ainda sonha com a ordenação; o Pe. Robertus Belarminus Bethras Reksotomo, que, depois de ter atuado como pároco e conselheiro provincial, hoje se dedica com entusiasmo a um grande seringal que a Província cultiva na região, com a expectativa de um relevante retorno econômico num futuro próximo. O que me parece interessante é que esse coirmão, que já atuou também como missionário em Papua-Nova Guiné, pensa em desenvolver algo como uma pastoral da terra ou dos agricultores, numa perspectiva associativista e ecológica. Iniciativas como essa devem ser apoiadas e estimuladas, especialmente nessa região, onde são raridade.
Nossa visita se desenvolveu num ritmo pouco saudável. Depois de apenas um dia em Palangka Raya, partimos para a visita aos coirmãos que vivem e trabalham nas paróquias de Parenggean e Sampit. Em Parenggean, depois de 5 horas de viagem, parte da qual numa estrada absolutamente intransitável, encontramos nosso coirmão Pe. Aloisius Darmakusuma, que vive e trabalha sozinho nessa pequena cidade cercada de imensas plantações de babaçu. Como tantos, ele vem de família mussulmana, e sua mãe só se tornou cristã alguns anos após sua ordenação.
Como ser verdadeira imagem do Bom Bastor?
Depois de ouvir algo sobre sua vida e seu trabalho, o sentimento é concomitantemente de alegria e de compaixão: alegria por sua dedicação incansável às 32 comunidades dispersas que compõem a paróquia, que distam até 120 km da sede e exigem até 6 horas de viagem, por causa das péssimas estradas; pena e compaixão pelo desgaste físico e emocional que isso significa. Menos mal que ele conta com a presença e a colaboração de algumas religiosas e muitos leigos/as, como o presidente do Conselho de Pastoral, que esteve todo o tempo conosco. Este é um jovem descendente de chineses, cujo pai era confucionista e cuja mãe era evangélica...
Saímos de Parenggean às 17:00, fazendo de novo o trecho precário da estrada que havíamos percorrido, e viajamos em direção a Sampit, onde chegamos às 20:00. Lembro de passagem estávamps pouco abaixo da linha do equador – o que significa que o clima, a umidade e o calor, os rios e a terra arrenosa, a vegetação e os insetos – se assemelham àquilo que encontramos na conhecida Amazônia, particularmente na nossa missão de Carauari e Itamarati. Mas existem algumas diferenças: aqui a mata original já foi destruída há várias décadas pelas madeireiras; a região é bastante populosa; existem estradas surpreendentemente transitáveis.
Em Sampit nos esperava ansioso o Pe. Franciscus Salianus Hendysaputra. Este jovem e simpático coirmão trabalha aqui há menos de dois anos, ajudado por um coirmão da província de Java (Pe. Yosef Prasetya Tjoek) e, a partir da nossa chegada, por um diácono em estágio pastoral. Nasceu nas proximidades de Sampit, que hoje tem mais ou menos 60.000 habitantes, e sua família foi a primeira da vila a receber o batismo. Hoje Pe. Hendy anima uma paróquia com 27 comunidades e aproximadamente 4.500 católicos.
Estudantes da Escola Paroquial de Sampit
O Pe. Hendy recebeu como herança do coirmão Pe. Willibal Pfeuffer, missionário alemão que por aqui fez história e faleceu em dezembro último, uma paróquia bem organizada e com uma grande infra-estrutura. Além de uma ampla e confortável casa paroquial, a paróquia é proprietária de um ambulatório médico que atende mais de 60 pessoas por dia, de uma escola profissional de mecânica e marcenaria e de uma enorme e bela escola de ensino fundamental e secundário, inclusive com internato para os alunos que necessitam. É um sinal vivo do empreendedorismo de uma certa leva de missionários, assim como da antiga e cultivada “devoção a são marcos”. Tudo isso acabou passando às mãos das diocese e agora, com a morte do idealizador desse imenso projeto e com a diminuição das fontes exteriores, o desafio é como mantê-lo.
Fui a primeira pessoa a dormir no quarto ocupado durante décadas e deixado recentemente pelo falecido missionário. O pároco resistia até a entrar nele... De fato, tanto no quarto quanto no gabinete de trabalho, tudo está como ele deixou antes de ser hospitalizado em setembro passado. De todos os modos, dormi muito bem e espero que desta estadia eu possa levar um pouco da coragem e dedicação de um homem que, conservando os limites e ambiguidades que todos compartilhamos como pessoas e cristãos, deixou sua terra majoritariamente cristã e economicamente desenvolvida para se embrenhar neste mundão de maioria mussulmana, construir desde o alicerce a comunidade e as estruturas católicas e, finalmente, entregar a esta gente também seu último suspiro.
Itacir Brassiani msf

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