A felicidade do Reino
de Deus é profunda e verdadeira!
No quarto capítulo do seu evangelho, Mateus diz que
Jesus percorria a Galileia e ensinava nas sinagogas. No início do quinto
capítulo, proposto para nossa meditação neste domingo, apresenta-nos um resumo
da mensagem que ele anunciava. Numa
rápida introdução, Mateus diz que “vendo as multidões, Jesus subiu à montanha e
sentou-se.” A pregação de Jesus não brota da necessidade de ensinar verdades
abstratas ou condenar erros morais, mas da contemplação compassiva do rosto de
um povo cansado e abatido que o procura como última esperança.
Mateus diz que Jesus ensina sentado. E o faz não
porque esteja cansado, mas porque assume a postura de um mestre que deseja
propor um caminho de sabedoria. Ele senta no chão, e não numa cátedra! Seu
objetivo é ajudar o grupo que se forma ao seu redor a ajustar o olhar e
compreender em que consiste o sentido da vida, ou como é possível alcançar a
felicidade que todos procuram. O movimento de subir a montanha é mais
existencial e espiritual que geográfico: é um percurso ético, um caminho de
amadurecimento humano e espiritual.
Jesus propõe a quem deseja segui-lo um caminho que
leva a uma felicidade tão profunda quanto subversiva. Enquanto ensina, seu
rosto é sério e, ao mesmo tempo, alegre: sério porque anuncia o que há de mais
fundamental na vida humana; alegre porque está falando da felicidade que todos
procuram, de um novo modo de avaliar e conduzir a vida. E não é fora de
propósito imaginar que tanto os discípulos quanto o povo em geral arregalam os
olhos, surpreendidos pelo ensino inusitado que brota do coração e dos lábios
daquele jovem galileu que de repente desponta como mestre.
De fato, a expressão que Jesus usa repetidamente tem
pouco a ver com um contentamento superficial ou com o sentimento de bem-estar.
‘Beatos,’ ‘bem-aventurados’ ou ‘felizes’ são expressões ligadas a uma alegria
tão profunda quanto contagiante, uma alegria que brota da experiência da plena
realização de todas as necessidades e sonhos que fazem alguém viver. Jesus não
fala de emoções, sentimentos ou qualidades morais individuais, mas do favor e
da benevolência gratuita, libertadora e generosa de Deus para com seus filhos e
filhas, essa experiência de tocar com as mãos os próprios desejos e sonhos.
Não pode passar despercebido o caráter inusitado e
subversivo da felicidade suscitada pela chegada do Reino de Deus e pregada por
Jesus. Ele nos ensina e quer nos fazer crer que a felicidade verdadeira
pertence às pessoas pobres e arrasadas, tanto física como espiritualmente; às
pessoas que lamentam a força destrutiva dos poderes imperiais; àquelas que não
recorrem à violência reativa, mas também não renunciam à esperança; às
criaturas que não se deixam embebedar pelas migalhas de bem-estar oferecidas a
poucos pelos dominadores de plantão.
E Jesus não termina aqui a lista dos grupos de
pessoas que recebem como presente a felicidade que todos procuram. Beatas e
felizes são também as pessoas que centram sua vida no atendimento das
necessidades dos fracos, que não têm duas caras ou duas palavras, que semeiam
fartura de vida e de pão nas brechas de um poder que promove a rapina, que são
menosprezadas ou perseguidas por causa deste jeito livre e subversivo de viver.
Convenhamos: não é bem esse o conteúdo e os traços concretos da felicidade que a
maioria das pessoas estão buscando...
É essa boa notícia tão concreta quanto surpreendente
que Paulo tem presente ao escrever à comunidade de Corinto. Relendo a história
do povo judeu e do evento Jesus Cristo, o apostolo de Tarso insiste que, na sua
relação com a humanidade, Deus não leva em conta o conhecimento, o poder e a
nobreza. Ele escolhe o que costumamos considerar loucura, fraqueza e
desprestígio para envergonhar os sábios, abalar os fortes e confundir quem
pensa ser tudo. Assim, naquilo que é, faz e ensina, Jesus é para nós justiça,
sabedoria santificação e libertação que vem de Deus.
Jesus de Nazaré, mestre feliz e venturoso peregrino em
nossas humanas estradas! Inspirados no teu sermão e na vida e nas palavras de
Gandhi, cujo aniversario de martírio recordamos amanhã, te pedimos: Ajuda-nos a
dizer a verdade diante dos fortes e a não mentir para obter o aplauso dos
fracos. Não deixes que nos embriaguemos com o êxito ou nos desesperemos com o
fracasso. Faze-nos compreender que a tolerância é sinal de força, e que o
desejo de vingança é sinal de debilidade. Mas ajuda-nos também a não deixar o
dinheiro matar nossa fome de felicidade e o poder embaralhar nossa razão, o
êxito matar a humildade, e a humildade obscurecer a nossa dignidade. Assim
seja! Amém!
Itacir Brassiani msf
(Profecia de Sofonias 3,12-13 *
Salmo 145 (146) * 1ª. Carta aos Coríntios 1,26-31 * Evang. Mateus 5,1-12)
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