quinta-feira, 12 de janeiro de 2017

ANO A – SEGUNDO DOMINGO DO TEMPO COMUM – 15.01.2017

Jesus elimina o pecado que fere e aprisiona a nossa liberdade!


Com a festa do batismo de Jesus, celebrada na última segunda-feira, chegamos ao fim o ciclo litúrgico das festas natalinas e iniciamos o ciclo do tempo comum. Neste segundo domingo do tempo comum, a Igreja nos propõe uma espécie de apresentação de Jesus. O pequeno trecho do Evangelho que nos é proposto hoje é rico de imagens, e nos mostra João Batista em maturidade profética, dando testemunho de Jesus e apresentando-o como Cordeiro de Deus e como aquele que, doando-nos o Espírito, elimina o pecado do mundo e arca com suas consequências.
No dia anterior à cena de hoje, ao ser interrogado sobre sua própria identidade, João respondera claramente que ele não era Elias, nem o Profeta, nem o Messias, mas alguém enviado a preparar o caminho para a vinda do Messias, diante do qual reconhecia sua própria pequenez e transitoriedade (cf. Jo 1,19-28). No dia seguinte, vendo Jesus vindo ao seu encontro, declara: “Eis o Cordeiro de Deus, aquele que tira o pecado do mundo.” E completa: “Mesmo tendo vindo depois de mim, ele passou à minha frente, me superou... Quando ele desceu às águas dos penitentes, tudo foi ficando claro para mim...”
Esta imagem de Jesus Cristo como Cordeiro de Deus adquiriu um lugar importante na tradição cristã e é recordada até hoje em cada celebração eucarística. No livro do Apocalipse, essa a metáfora do Cordeiro é aplicada a Jesus e aparece frequentemente. Ele é o Cordeiro ferido mas vitorioso e glorioso, sentado no trono. Mas os cristãos também são chamados de cordeiros (cf. Jo 21,15).  Na imagem do cordeiro vemos quase que espontaneamente a mansidão e a docilidade, ou então a ideia de sacrifício ou de ‘bode expiatório’. Mas, na santa Palavra, o próprio Deus nos adverte que ele não pede de nos sacrifícios e oblações, mas ouvidos abertos à sua voz e aos clamores da criação (cf. Sl 39/40).
É importante ressaltar que, apresentando Jesus como Cordeiro de Deus, João quer apresentá-lo como o Cordeiro pascal da tradição judaica, o sinal de comunhão do povo na memória, no sonho e na luta pela liberdade. O Cordeiro pascal celebrava a história e a utopia libertária do povo de Israel, que, com o passar do tempo, acabou sendo ligada quase exclusivamente a uma etnia, uma nação e uma cultura. Ultimamente, com o processo de privatização da experiência religiosa, a imagem do cordeiro terminou sendo refém de uma espiritualidade intimista e desencarnada.
João apresenta Jesus como o Cordeiro que tira o pecado do mundo. Mas escutemos atentamente: trata-se de tirar o pecado, não de expiar; e o profeta se refere ao pecado no singular, e não a pecados diversos; é algo que existe antes de Jesus, que não se define apenas pela relação com ele. Este ‘pecado do mundo’ se condensa na recusa do projeto de Deus e na submissão aos sistemas que se fecham em torno dos interesses privados e das violências e mentiras que sua manutenção exige. Somente o dom Espírito pode fazer o ser humano uma realidade nova, renascida e capaz de amar e dar a vida, como o próprio Jesus.
Enquanto Servo e Cordeiro de Deus, Jesus leva a sério esta missão sem fronteiras. E começa indo ao encontro das ‘ovelhas perdidas’ ou marginalizadas do povo de Israel. Depois, abre as portas do Reino de Deus a todos as pessoas, classes, povos, etnias e crenças. Nele, com ele e por ele, nenhum povo ou indivíduo é considerado inapto, incapaz ou indigno da vida abundante do Reino. Todas as pessoas, grupos e povos são chamados à liberdade e à vida, a todos é prometido e concedido o Espírito de liberdade e de serviço. É isso que Paulo destaca nas primeiras linhas da sua carta aos Coríntios.
O apóstolo Paulo diz que, em Jesus Cristo, todos os seres humanos, inclusive aqueles que são chamados de pagãos, são chamados a serem santos. Acabaram as hierarquias que privilegiam uns e descartam muitos! Então, acolhendo o anúncio convicto de Paulo e a palavra-de-ordem de João Batista, repetida em cada Eucaristia no convite à comunhão, assumamos alegremente nossa dignidade de filhos, herdeiros e enviados, e engajemo-nos sem reservas na missão de tirar o pecado do mundo, a fim de que o mundo seja cada vez mais a casa comum dos filhos e filhas de Deus.
Jesus de Nazaré, Cordeiro pascal, memória e esperança de uma liberdade radical: confirma-nos como discípulos na escola do serviço despojado e fiel, lúcido e eficaz à plena liberdade dos nossos irmãos e irmãs. Faz do teu Espirito libertário e renovador a lei maior do nosso sentir, pensar e agir. Abre cada dia de novo nossos ouvidos à Palavra que pronuncias mediante os gemidos da criação. E ajuda tuas Igrejas a compreender que não queres sacrifícios, doutrinas e sacramentos, mas amor que serve, palavra que anuncia e estimula, celebração que resgata a dignidade e a grandeza dos pobres. Assim seja! Amém!

Itacir Brassiani msf
(Profecia de Isaías 49,3-6 * Salmo 39 (40) * Carta de Paulo aos Coríntios 1,1-3 * Evangelho de S. João 1,29-34)

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