Noventa anos de história MSF em Santo Ângelo
Sinal da presença MSF em S. Angelo: construçao da Catedral |
Os
acontecimentos e personagens do passado nada têm a ver comigo? A partir do
momento em que começamos a fazer da história não uma narrativa fria e distante,
mas dela nos sentirmos personagens ativos, ela começa a tomar vida, movimento,
colorido, e a despertar sentimentos e emoções. E vai tornando-se interessante e
atraente.
Transportando-nos
à Casa-Mãe de Grave, ver-nos-emos
recebendo o abraço de acolhida daquele homem admirável, escolhido por Deus, a
oferecer-nos a venturosa possibilidade de sermos Missionários da Sagrada Família. O dia 28 de setembro de 1895 é dia
memorável de todo discípulo de Berthier. Treze anos depois, naquela manhã de 16
de outubro de 1908, o nosso coração sobe-nos à garganta ao ouvirmos
sobressaltados a notícia: “Notre bon Père est à la mort!... Nosso bom pai
agoniza!...” Nesse momento, assumimos os sentimentos e atitudes, quiçá, de um
De Lombaerde, dando apoio à cabeça do Fundador agonizante em nossos braços.
Se tais
eventos históricos forem considerados parte também da minha e da nossa
história, sentir-nos-emos comprometidos e corresonsáveis com a ‘obra’ de
Berthier – que é a nossa! – assim como um Josef Carl, primeiro Superior Geral,
e como um Anton Maria Trampe, ambos figuras exponenciais da história da
Congregação, particularmente para o Brasil e, em especial, para a nossa
Província.
A nossa
história avança! No dia 8 de janeiro de 1911, às 21h30, aportávamos em Recife,
como missionários pioneiros da Congregação enviados ad gentes, “àqueles que estão longe”. Éramos sete: cinco padres e
dois irmãos. Nos dois anos seguintes, recebíamos ajuda de outros sete. Veio a
grande guerra mundial de 1914 a 1918, e dela somos personagens sofredores,
praticamente sem contato com os coirmãos e Superiores de Grave. E eles, por sua
vez, sem saberem de nossas malárias e peripécias outras que enfrentávamos na
região amazônica.
A tua e a
minha história prossegue! O segundo Superior Geral, eleito em 1920, Pe. Anton
Maria Trampe, desembarcava no porto de Recife no dia 20 de junho de 1920, para
sua primeira visita a nós brasileiros. Enfrentando contratempos de toda ordem,
visitou-nos um a um!... Trazía-nos notícias dos coirmãos da Europa, algumas
tristes e muitas alvissareiras. Com atenção e emoção, ouvia e registrava nossas
experiências missionárias e as injustiças que sofrêramos de autoridades civis e
eclesiásticas.
Nossa
história está cada vez mais perto de hoje! Com calma bertheriana, em busca de
campos vocacionalmente férteis, o Pe. Trampe põe-se em marcha para o Sul, vindo
à nossa procura. Passa pela Bahia, pelo Rio de Janeiro, por São Paulo e por Florianópolis.
Parece Berthier, de lugar em lugar, buscando um canto para os seus futuros
filhos... Penetra no solo gaúcho pelo porto de Rio Grande. Vai a Pelotas, Porto
Alegre, Uruguaiana, Santa Maria e... chega a Santo Ângelo. Volta a Porto Alegre
cansado e desanimado, para não dizer decepcionado, com determinados antístites
da Igreja. Em sua peregrinação penosa, vez por outra chegou a adoecer,
precisando acamar-se por alguns dias. São as dores e náuseas da nossa gestação!
Está próximo o nascimento dos primeiros bertherianos em terras brasileiras.
Nosso
berço, inicialmente, foi Rolante, assumida no mês de fevereiro de 1923. Santo
Ângelo, todavia, havia sido o lugar escolhido para acolher nossos vocacionados.
Aqui será a nossa Grave! É na terra das missões que serão cultivados os
primeiros missionários autóctones! A diocese de Santa Maria dispusera-se a
entregar-nos Ijuí ou Ajuricaba. Dom Hermeto, bispo de Uruguaiana, prometera
confiar-nos Cerro Largo, mas forças que não nos são ocultas levaram Dom Hermeto
a mudar sua decisão. Em troca, ofereceu-nos Santo Ângelo.
Em
encontro pessoal, nosso Superior Geral e Dom Hermeto celebraram, no dia 9 de
novembro de 1922, o seguinte convênio: “Entre a diocese d Uruguaiana e a
Congregação dos Missionários da Sagrada Família, representados pelo bispo
diocesano Dom hermeto José Pinheiro e pelo Superior Geral Pe. Anton Maria
Trampe, pelo presente convenia-se o seguinte: 1) A entrega da paróquia de Santo
Ângelo e São Miguel, pelo espaço de cinco anos; decorrido esse tempo, se o
bispo julgar oportuno, será devolvida ao clero diocesano, ou o contrato será
renovado; 2) O término do prazo para a entrega é o dia 1° de janeiro de 1923;
3) O excelentíssimo prelado diocesano, pelo presente, autoriza a construir, em
lugar de sua escolha, a sua residência canônica, com a respectiva capela. Outrossim,
podem os padres em sua residência abrir uma escola apostólica.”
O nosso
coirmão Pe. Henrique Ofenhitzer foi o primeiro a chegar em Santo Ângelo. Ele
deixou escrito o seguinte: “Aos sete de maio de 1924 cheguei ao meu novo posto
e iniciei meu trabalho com as maiores dificuldades.” No corrente ano (1999),
pois, completam-se 75 anos de nossa presença na ‘capital das missões’. Há 75
anos muitos de nós nem nascêramos, mas capítulos e capítulos da história de
cada membro da nossa Provincia – da sua e da minha história! – já estavam sendo
escritos.
Sinal da presença MSF em S. Angelo: Seminario Sagrada Familia |
Essa
antiga história é parte da nossa história de hoje. Sem aquela, a nossa seria
muito diferente, com certeza. Como poderei narrar a minha vida olvidando-me do
acontecido e dos personagens que me antecederam? Como pode alguém ler a
história do mundo, da salvação, da Igreja, da Congregação, da Província, sem
sentir-se parte integrante e nem personagem de toda uma longa história?
Desde que
assim venho me posicionando frente à história, sinto que crescem meu amor e meu
interesse por Berthier e, em especial, por nossa Província. Meu coração é
tomado de gratidão aos coirmãos, de ontem e de hoje, com os quais venho
construindo minha biografia. É-me significativo retornar, neste ano de 1999, a
Santo Ângelo, exatamente nos 75 anos da nossa vinda para cá. E convido todos os
coirmãos a louvarem a Deus e a renderem graças à Sagrada Família pelo evento
histórico dos 75 anos de nossa vida missioneira.
Pe. Rodolpho Ceolin msf
(Este texto foi publicado em O Bertheriano, Ano XVII, N° 61, março/1999, p. 3-4. O título foi, obviamente, adaptado)
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