Via-Sacra: quantas são as estações?
Na Semana-Santa vivida na Vila do Morro aprendi uma prática que
considero muito significativa: rezar e meditar a Via-Sacra de Jesus Cristo, na
Sexta-feira Santa de manhã, nas casas de pessoas idosas e doentes. Estas, contatadas
com antecedência, prepararam pequenos e simples “altares” diante de suas pobres
casas, com “flores tristes e baldias, como a alegria que não tem onde
encostar”.
Começamos bem cedo, às 7:30 da manhã, pois o sol prometia ser
implacável. Começamos com um grupo de umas trinta pessoas, inclusives algumas
bem idosas. Com o passar das horas e estações, alguns deixavam a caminhada e
outros nela se incorporavam. Tudo organizado por eles mesmos. Eu só entrei, na
última hora, como dirigente, pois “o padre sabe”...
Sou da geração que acredita firmemente que a via-sacra de Jesus se
encarna e continua na sagrada via dos homens e mulheres de hoje. Mas percebi de
forma mais viva e profunda que a santa via de Jesus tem tudo a ver com a via-crucis dos doentes e idosos. E isso
tanto no que se refere ao “rosário” de dores que ferem a carne e a alma deles
como em relação aos tantos cirineus e verônicas que os consolam solidariamente.
Mas a Comunidade, sintonizada com a caminhada da Igreja do Brasil, seguiram
a Via-Sacra proposta pela Campanha da Fraternidade, fazendo desfilar diante
destes rostos cansados e corações sofridos, a lembrança do sofrimento ainda
maior das vítimas do tráfico de pessoas humanas. Diante dos nossos olhos e no
pó no qual mergulhavam nossos pés se uniam o sofirmento de Jesus, dos doentes e
das vítimas do tráfico de pessoas humanas.
Estavam previstas paradas em quinze casas, conforme o número das
estações. Mas quantas são mesmo as estações e visitas da caminhada de Jesus ao
calvário das dores humanas? Algumas pessoas idosas, mesmo sem terem sido
contempladas na lista, arrumaram altares diante das suas casas? Como
desconhecer o apelo surdo que eles gritavam e passar adiante como se nada
fosse?
Concluíamos a parada e a meditação diante de cada casa com o pedido de
bênção sobre os idosos e doentes que nelas habitam. Estendendo as mãos sobre
eles, cantávamos “este doente será abençoado, pois o Senhor vai derramar o seu
amor”. E de fato, em muitos casos, as lágrimas dos doentes sinalizavam
materialmente o amor e a bênção que Deus ia derramando, atendendo o pedido do
seu povo amado.
Esta caminhada de fé e solidariedade na sagrada via de Jesus durou mais
de duas horas. O sol começava a queimar quando celebramos a ressurreição de
Jesus em frente à casa de dona Ana, nome com tantas e belas ressonâncias
bíblicas. Deus seja louvado por este povo valente e forte, sensível e humano,
que vive sua fé de modo tão simples, expressivo e solidário!
Itacir Brassiani msf
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