quinta-feira, 18 de fevereiro de 2021

ANO B | TEMPO QUARESLMAL | PRIMEIRO DOMINGO | 21.02.2021

A fraternidade e o diálogo são desafios que brotam do amor!

Enquanto recebíamos um punhado de cinza sobre a cabeça, escutávamos contritos e atentos a interpelação: “Convertam-se e acreditem no Evangelho!” Exatamente nessa ordem: primeiro, converter-se; depois, acreditar no Evangelho. A proposta e o caminho aberto por Jesus são portadores de uma novidade tão radical que, para acolhê-la, precisamos mudar nossos esquemas mentais. E o ponto de partida dessa mudança é aquilo que Pedro anuncia: a Aliança que Deus selou conosco em Jesus Cristo.

Marcos nos diz que, logo depois do batismo no rio Jordão, onde faz a experiência de ser filho amado do Pai e servo enviado aos irmãos e irmãs, Jesus é conduzido pelo Espírito ao deserto. Seu batismo assinalou claramente um novo começo, mas, com sua retirada para o deserto esse início parece ser adiado por um tempo. Na verdade, Jesus apenas se retira do palco e se subtrai aos holofotes para aprofundar o sentido da missão recebida no batismo. No deserto, ele é levado ao confronto consigo mesmo e com as diversas possibilidades de viver sua condição de filho amado do Pai e servo da humanidade.

Jesus faz a experiência das tentações que costumam rondar todos aqueles/as que se comprometem com o serviço a Deus e ao seu povo: a tentação das soluções miraculosas e espetaculares (cf. Mc 8,11); a tentação do legalismo e do casuísmo para beneficiar algumas pessoas (cf. Mc 10,2); a tentação de disputar o poder (cf. Mc 12,15); a tentação de identificar a vontade de Deus com os próprios medos e vontades (cf. Mc 14,32-38). As tentações no deserto recordam as que rondaram Jesus em sua missão, vencidas no Espírito. A tentação de rotular a pandemia como castigo de Jesus abusos morais de alguns, de negar a realidade, a fatalidade e a letalidade da Covid-19, ou de aprovar políticas econômicas que, empacotadas no investimento na vacinação do povo, comprometem o futuro do país, precisam ser denunciadas, enfrentadas e vencidas.

Jesus foi ao deserto para clarear o núcleo do Boa Notícia que anunciaria aos pobres. Foi um tempo forte de discernimento e amadurecimento que, de alguma forma, estendeu-se por toda a sua vida. Pois o amadurecimento costuma se oferecer na discrição, no silêncio e na margem, longe da publicidade. E este é também o espírito da quaresma: sair do centro das atenções, deixar de lado os papéis decorados, sair da periferia de nós mesmos, penetrar no núcleo mais secreto do nosso ser, crescer na adesão a Jesus.

O anúncio que Jesus acolheu, aprofundou e reformulou no deserto não contém ameaças nem imposições. É pura Boa Notícia! “O tempo de espera se cumpriu e o Reino de Deus está próximo!” Aquilo que estava distante agora está próximo. É o tempo da graça do Senhor, da assinatura de um novo pacto com seus filhos e filhas, qualquer que seja sua pertença religiosa, política ou de gênero. Jejuamos, rezamos e fazemos penitência para não passarmos ao largo nem relativizarmos a única coisa que vale a pena.

E qual é este bem precioso do qual não podemos abrir mão? É o novo céu e a nova terra, um país sem miséria e sem corrupção, mas também sem injustiças nem desigualdades; uma cultura que enfatiza a relações de respeito e valorização das diferentes confissões cristãs, das diversas gerações, dos diferentes gêneros e grupos sociais, da diversidade de criaturas. E isso mesmo quando nos parece impossível não desconfiar daqueles que divulgam notícias falsas e, usando o nome de Jesus, atiçam a intolerância e o ódio.

Jesus percorre caminhos que o levam do rio Jordão ao deserto e, do deserto, à Galileia. São caminhos que o afastam dos palcos e o aproximam da periferia. São estradas que o levam ao encontro do povo cansado e abatido, para anunciar-lhe a Boa Notícia do Reino de Deus, da renovação da aliança selada com Noé e com Moisés. Eis o rumo que seus discípulos e discípulas precisamos seguir. É apenas um rumo, não uma estrada bem sinalizada. Os caminhos concretos somos nós que devemos inventar, na força do batismo e com uma consciência boa e reta, como nos diz São Pedro. Fraternidade e diálogo são exigências e desafios do amor.

Jesus, voz que clama no deserto! Faz com que a oração traga oxigênio à nossa fé e nos mantenha abertos às tuas promessas. Que a partilha do pouco que temos com os que tem menos ainda seja semeadura de novas relações. Que nossas celebrações e nossa oração pessoal nos mantenham numa atitude vigilante e nos sustentem na necessária conversão. Que o cansaço ou a pressa nos prendam aos velhos hábitos e nos novos muros, impedindo-nos de percorrer os exigentes caminhos da comunhão e da paz na diversidade, pois o Evangelho da graça é força de Deus que derruba os muros levantados pelo preconceito. Amém! Assim seja!

Itacir Brassiani msf

Livro do Gênesis 9,8-15 | Salmo 24 (25) | Primeira Carta de Pedro 3,18-22 |  Evangelho  de São  Marcos 1,12-15

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