Os pobres podem
contar com Deus e têm futuro!
Escutando
atentamente o Evangelho deste domingo, não podemos contornar uma outra
pergunta, tão importante como a pergunta pela vida após a morte: os pobres e
oprimidos têm futuro, já que a opressão e a escravidão teimam em não
desaparecer e, com o passar dos séculos, vêm se maquiando e reciclando?
Revoluções feitas em nome dos oprimidos, aos poucos esquecem suas promessas e
se fecham em torno dos interesses de uma nova classe hegemônica. O próprio
cristianismo, que lança suas raízes nas esperanças dos pobres e oprimidos, caiu
na tentação da fuga na tranquilidade do culto e na segurança da doutrina.
No breve
texto do Evangelho que ouvimos hoje, Jesus retoma sua pregação inaugural na
sinagoga de Nazaré. Depois de colher trigo em propriedade alheia e em dia de
sábado e de curar um homem que tinha uma mão paralisada, depois de retirar-se
para rezar e de constituir uma comunidade de discípulos, Jesus é cercado por
uma numerosa multidão, profundamente necessitada de ajuda. É neste contexto que
ele ensina seus discípulos, definindo claramente quem é feliz e pode contar com
Deus e quem dá as costas a Deus e caminha para uma vida frustrada. E ele fala
com a força e a autoridade do próprio Deus.
Para Jesus,
os pobres e oprimidos podem sempre contar com Deus, e, por isso têm futuro. Às
pessoas sem segurança material e social, tratadas como últimas nos projetos
políticos, famintas e sofredoras, Jesus não promete riquezas, mas afirma:
“Felizes vós, os pobres, porque vosso é o Reino de Deus! Sereis saciados!
Havereis de rir!” E esta esperança não engana, porque o próprio Jesus veio,
como intuiu Maria, para mostrar a força do braço de Deus, para dispersar os orgulhosos,
derrubar os poderosos, exaltar os humildes e beneficiar os famintos (cf. Lc
1,51-53); e porque ele reúne, forma e envia discípulos e discípulas para
continuarem sua ação.
E os ricos e
opressores têm um futuro, merecem nossa admiração? O peso dos fatos quase nos
obriga a crer que os ricos e poderosos sempre têm a última palavra, riem por
último, riem melhor. “Eles confiam na sua força e se orgulham da sua grande
riqueza” (Sl 49,7). Mas, para Jesus, eles já escolheram sua consolação e,
permanecendo indiferentes e violentos, se auto excluem do banquete do Reino.
“Mas ai de vós, ricos, porque já tendes vossa consolação! Ai de vós que agora
estais rindo, porque ficareis de luto e chorareis!” Com a parábola do pobre
Lázaro e do rico anônimo (cf. Lc 16,19-31), Jesus não deixa dúvidas sobre isso.
Não se trata
de revanchismo barato, mas de justiça de Deus. Deus trata as pessoas e governa
o mundo seguindo o critério da necessidade concreta, e não do mérito. E Jesus
leva isso à radicalidade, começando pela inclusão dos ‘últimos’. Nenhuma
concessão aos ricos, famosos e poderosos. Para o Evangelho, a felicidade que
não fere e não é roubada é aquela que se enraíza na fidelidade a Jesus de
Nazaré e nos engaja na sua missão, a assumir, se for o caso, o ódio e os insultos
que isso traz. Beatos e felizes são os mártires, cuja caravana exultante e
jubilosa atravessa os séculos e provoca instabilidade nos poderes e igrejas.
Jesus
delimita muito bem o caminho e o lugar daqueles/as a quem chama a seguir seus
passos. Precisamos granjear fama e honra a qualquer preço, mesmo que seja o
alto preço do silêncio diante dos opressores? “Ai de vós quando todos falarem
bem de vós, pois era assim que seus antepassados tratavam os falsos profetas.”
A profecia e a perseguição são sinais inequívocos da fidelidade a Jesus Cristo.
“Pois era assim que os seus antepassados tratavam os profetas.” Eles são como
árvores plantadas à beira do rio: suas folhas não murcham, e dão frutos no
tempo certo. Há esperança para sua descendência! (cf. Jr 31,17)
Jesus de Nazaré,
missionário intrépido do Pai: a caravana dos homens e mulheres de boa vontade,
que transforma a possibilidade de um outro mundo possível em realidade se
manifesta em nossas comunidades cristãs, mas as ultrapassa por todos os lados.
Ajuda-nos a tomar consciência de que este mundo está sendo gestado, que somos
chamados a ajudar no seu parto, que nisso reside a verdadeira felicidade,
aquela alegria profunda e verdadeira que ofusca as ameaças advindas das
pandemias e da apoteose dos vencedores de plantão. Assim seja! Amém!
Itacir Brassiani msf
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