Evangelização:
qual é a Boa Notícia?
A Igreja Católica Apostólica Romana está
preocupada com a evangelização do mundo de hoje. Ao lado dos diversos
pronunciamentos do Papa e de bispos a respeito da questão, duas iniciativas
recentes do Vaticano demonstram claramente sua centralidade nas preocupações da
hierarquia da Igreja: criação do Pontifício
Conselho para a promoção da Nova Evangelização (21.09.2010) e a convocação
de um Sínodo dos Bispos (7 a 27 de
outubro de 2012, Roma) para refletir sobre o tema e oferecer linhas
orientadoras para toda a Igreja.
A questão
recolocada na ‘ordem do dia’ não é descrita simplesmente como ‘evangelização’,
mas aparece com o qualificativo ‘nova’. A Igreja quer efetivamente refletir
sobre uma evangelização adequada ao nosso
tempo. E isso é justo, sem dúvida. Mas, para pensar e propor a única e permanente
evangelização de modo novo,
precisamos primeiro delimitar o significado original da expressão
‘evangelização’. O uso universallizado do conceito não garante de per si uma boa compreensão.
Consultemos os
evangelhos, que são os textos que consagraram a expressão. Marcos começa seu
relato testemunhal com as seguintes palavras: “Início do Evangelho de Jesus Cristo, Filho de Deus” (Mc 1,1). Com isso, ele
pretende distinguir a Boa Nova vivida
e anunciada por Jesus de Nazaré dos anúncios das vitórias do Império Romano ou
do nascimento de um novo imperador. Assim, a expressão cristã não faz
referência a qualquer boa notícia, mas àquela encarnada e anunciada por Jesus
Cristo.
Vejamos como a
expressão aparece na boca e nas ações do próprio Jesus. Para ele, a Boa Nova está essencialmente vinculada à
aproximação do Reino de Deus, ou seja, à libertação e à vida plena assegurada
por Deus a todos os seus filhos e filhas, especialmente para os pobres. “Depois
que João foi preso, Jesus veio para a Galiléia, proclamando a Boa Nova de Deus. Completou-se o tempo,
e o Reino de Deus est próximo. Convertei-vos e crede na Boa Nova” (Mc 1,15). Evangelho é literalmente boa notícia.
Lucas segue no
mesmo rumo, apresentando mais detalhes. A primeira Boa Nova é o nascimento de Jesus, Salvador, Cristo e Senhor (cf. Lc
2,11). Mas o próprio Jesus buscará nas escrituras a linguagem e o conteúdo
concreto da sua missão. E encontrará inspiração na pregação profética: “O
Espírito do Senhor está sobre mim, pois ele me consagrou com a unção, para
anunciar a Boa-Nova aos pobres;
enviou-me para proclamar a libertação aos presos e, aos cegos, a recuperação da
vista; para dar liberdade aos oprimidos e proclamar um ano da graça da parte do
Senhor” (Lc 4,18-19).
A expressão Boa-Nova é usada pelo profeta Isaías
especialmente no capítulos 52,7-12 e 61,1-11, mas seu conteúdo aparece
indiretamente também nos capítulos 40,1-11 e 65,17-25. Em todos estes textos, o
conteúdo da Boa-Nova anunciada pelo
profeta em nome de Deus é conforto para os aflitos e libertação para os
oprimidos. As metáforas usadas não deixam margem a nenhuma dúvida. E é neste
campo semântico que Jesus se situa. Ele está longe de espiritualismos vazios e
intimismos perigosos.
Ademais, basta uma
simples olhadela nas ações de Jesus descritas pelos evangelistas para nos dar
uma idéia clara do significado concreto desta Boa Nova: ele ameaça, cala e expulsa os espírito imundos que
despersonalizam o povo humilhado; cura homens e mulheres que, por causa das
muitas doenças, padecem e são excluídos da vida social; purifica leprosos da
temida doença e lhes devolve a plena cidadania; vai ao encontro das pessoas
tidas como pecadoras, se confraterniza com elas e declara que estão
gratuitamente perdoadas por Deus. Isso para ficar apenas com os primeiros capítulos
de Marcos.
Está claro: a Boa Nova/Evangelho não é primeiramente
um substantivo, mas um verbo, um
anúncio cheio de alegria e esperança, prenhe de dinamismo emancipador e
libertador, dirigido aos setores pobres e oprimidos. E isso representa uma novidade absoluta frente às leis e
decretos ameaçadores e opressores que o povo habitualmente escutava das elites
religiosas e políticas. Evangelizar é
anunciar e demonstrar, com palavras e ações, que o Reino de Deus está em ação
na história, trazendo libertação e vida plena, começando pelos marginalizados e
oprimidos. O mundo tem jeito, sim! Este é o Evangelho de Jesus Cristo, razão da nossa alegria e esperança,
chamado à radical mudança de mentalidade.
Itacir Brassiani msf
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