Aos olhos de Deus, o que parece pequeno é o mais importante.
No quarto domingo da caminhada do Advento nossa atenção é atraída pelo
encontro entre duas mulheres grávidas. A cena se desloca das margens do rio Jordão
a um ambiente doméstico, e o apelo forte e claro do profeta dá vez à voz da
alegria feminina. Somos convidados a celebrar a grandeza dos pequenos, a
dignidade do corpo e a alegria de crer. Quando mulheres idosas se tornam mães,
quando desertos viram jardins, quando mortos ressuscitam e virgens engravidam,
nada mais é impossível e a esperança vira semente, certeza e festa.
Em geral, fugimos da pequenez e do anonimato, pois eles parecem negar ou
roubar nossa dignidade. Às vezes, sentimo-nos constrangidos quando nos
perguntam de onde somos, pois nossa vila de origem não consta no mapa das
cidades importantes. Quem de nós sabia da existência de Xapuri (AC) antes do
martírio de Chico Mendes, no dia 22 de dezembro de 1988? E quem sabia algo
sobre Anapú (PA), até que Dorothy Stang teve seu sangue derramado pelos
latifundiários em fevereiro de 2004? E quem saberia de Nazaré se não fosse a
prontidão de Maria para se colocar a serviço do projeto de Deus?
Deus gosta de andar pela contramão e celebrar as pessoas humildes e os
pequenos lugares. Eis o que Ele anuncia pela boca do profeta Miquéias: “Mas
você, Belém de Éfrata, tão pequena entre as principais cidades de Judá. É de
você que sairá para mim aquele que há de ser o chefe de Israel”. A carta aos
Hebreus acena para este mesmo mistério quando diz que, ao vir ao mundo, o Filho
de Deus disse: “Tu não quiseste sacrifício e oferta. Em vez disso, tu me deste
um corpo. Holocaustos e sacrifícios não são do teu agrado. Por isso, eu disse:
Eis-me aqui, ó Deus, para fazer tua vontade”.
Sacrifícios e ofertas não são o ponto fraco de Deus. Ele prefere dar-nos
um corpo para que nele e com ele realizemos sua vontade. Grandes ideias,
projetos fabulosos, ideais inflados, sentimentos profundos e construções
majestosas representam pouco diante da beleza e das possibilidades que nos são
dadas com o corpo. O que Deus deseja mesmo é que sua Palavra se faça carne em
nossas mil relações cotidianas. O presente mais precioso que podemos dar a Deus
no Natal do seu Filho é fazer ecoar a voz de uma multidão de homens e mulheres
anônimos: “Eis-me aqui para fazer tua vontade!”
Eis o que representam Isabel e Maria: dois corpos que se dispõem a
acolher o Mistério, duas liberdades prontas a fazer a vontade de Deus, duas
mulheres insignificantes e de lugares desconhecidos que fazem a diferença. No
abraço afetuoso, no grito melodioso e na dança ritmada daqueles corpos
abraçados por Deus, até as pequenas criaturas que elas carregam no ventre se
emocionam e participam. Há algo mais belo que mostrar ao mundo, mediante nosso
próprio corpo, a certeza de que algo novo começou e que a esperança se tornou
realidade?
O encontro entre Maria e Isabel é uma espécie de ampliação do anúncio do
anjo a Maria e de confirmação do sinal por ele oferecido. O que é mesmo que vem
confirmado? Que Deus olha para a humilhação dos seus filhos e filhas e os
escolhe como seus protagonistas; que a humanidade germina em lugares e pessoas
consideradas insignificantes; que para Deus nada é impossível; que a felicidade
brota da ousadia de acreditar. Isabel reconhece em Maria a felicidade própria
das pessoas que ousam acreditar e vislumbra no seu corpo feminino a arca de uma
aliança que está para ser assinada entre Deus e a humanidade.
A cena está cheia de alegria feminina. Em momentos grandes como este, as
palavras parecem incapazes de dizer o significado profundo daquilo que se vive.
Quando tocamos com a mão os pequenos sinais de algo grandioso que começa a
acontecer, nossos lábios se abrem em profecia: ‘Felizes são as pessoas que
ousam acreditar! Felizes aqueles que sonham, pois correm o risco de ver sua
realização! Bem-aventurados aqueles que ensaiam em seus corpos as novas
relações que reivindicam! Bendito seja quem reconhece a pessoa humana como Arca
de Deus! Bendito seja Deus que derruba os poderosos e eleva os humildes!’
Deus,
alicerce da nossa paz e fonte da nossa alegria: na bruma leve das paixões que
vêm de dentro já vemos os sinais da proximidade do teu filho amado. Vem em nosso
auxílio, para que ele não nos surpreenda preocupados apenas com comidas,
presentes e férias. Possamos nós vencer as distâncias que nos separam e
endireitar as curvas que nos afastam de quem necessita de nós. E que
resplandeça em nosso corpo a alegria de quem vive com sede e fome de justiça e
de beleza, presentes preciosos que nos dás no Santo Menino, que quer estender
sua esteira no meio de nós e aqui opermanecer. Assim seja! Amém!
Itacir Brassiani msf
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