Com Maria, somos peregrinos de Esperança
Aqui estamos
como romeiros e peregrinos de Esperança. Peregrinos com a Mãe Peregrina.
Peregrinos com uma humanidade peregrina. Peregrinos que caminham juntos.
Aqui estamos
celebrando a solenidade de Cristo Rei. E aos pés da cruz está a Mãe Rainha, e
estamos nós, cidadãs e cidadãos do Reino.
Não podemos
esquecer: nosso Rei é um cordeiro imolado, um homem crucificado entre dois
outros crucificados, excluídos da cidade. É ele o homem digno de receber
sabedoria, força, honra, a glória e o louvor.
Este Deus
que se fez homem, que se fez pobre, que se fez peregrino e irmão de todos e de
todas, é o início e o fim de tudo, o primogênito da criação, o reconciliador.
Ele é a
imagem do Deus invisível: perseguido, condenado, ridicularizado, desafiado por
gente piedosa e por pagãos, compreensivo, acolhedor e solidário com os
condenados.
Ele é a
imagem do Homem Novo: despojado, solidário, próximo, peregrino, livre de medos
e apegos, de ambições e de competições.
É este o
Filho que a Mãe nos entrega. E ela é Rainha, Vencedora e mil vezes Admirável
porque venceu a tentação de querer um filho bem-sucedido, famoso; um príncipe
distante de tudo e de todos, sentado num trono, indiferente à sorte da humanidade,
um príncipe que se recusa a peregrinar porque chegou no topo da pirâmide.
Prestemos a
atenção à cena do Evangelho; não caiamos na tentação de pintá-la com cores
agradáveis. Esta mão é propriamente uma cena de investidura e coroamento de
Jesus de Nazaré como rei.
A cena não
ocorre num palácio ou num templo, num clube ou num salão de festas. É uma cena
de crucificados fora dos muros da cidade, no espaço para onde eram expulsos
aqueles que não agradavam aos reis e senhores.
Rei de quem é
Jesus se ele é recusado, condenado e entregue à morte pelo seu próprio povo?
Que tipo de rei é uma pessoa pregada na cruz entre dois condenados;
ridicularizado pelos pagãos, questionado pelos concidadãos?
Que tipo de
rei é alguém cuja coroa não tem diamantes, mas espinhos? O título de rei dos
judeus, escrito e pendurado na cruz é mais uma acusação e uma gozação que uma
louvação.
Por que se
chegou a isso? Por que impuseram a Jesus Nazareno a ignomínia da cruz? Porque ele
colocou a vida das pessoas acima das leis. Porque trouxe os pobres e excluídos
para o centro da religião.
Porque disse
que a grandeza do império romano é baseada na exploração. Porque acusou os
líderes religiosos de colocar seus interesses no lugar da vontade de Deus, de
serem como sepulturas enfeitadas.
Ele chegou a
isso porque sentou à mesa com os pobres, porque acolheu mulheres consideradas
pecadoras, porque atravessou fronteiras e acolheu os pagãos.
Porque disse
que uma ovelha em perigo é mais importante do que 99 que estão bem, porque
acusou as autoridades de serem pastores mercenários, porque disse que sua mãe e
seus irmãos são aqueles que fazem a vontade do pai.
Este é o
nosso rei, essa é a cabeça da Igreja. E o primeiro a receber o título de
cidadão do seu reino é um dos condenados que lhe fazem companhia.
Não
desprezemos os condenados, não nos afastemos dos desprezados, pois eles entram
no Reino à nossa frente. Quem diz isso é nosso Rei e Salvador.
E Maria, a
quem saudamos como, Mãe Peregrina é Admirável porque é Mãe de um Deus assim
maravilhoso e próximo, despojado de todo sinal de poder.
Nossa Senhora é admirável porque Mãe do
Redentor, daquele que não se envergonha de nos tratar como irmãos e irmãs,
porque é carne da nossa carne.
Nossa Senhora é admirável porque é Mãe dos
cidadãos do Reino, começando por aqueles que estão crucificados e condenados
com Jesus, daqueles que são excluídos e culpabilizados pelos próprios
sofrimentos.
Santo Agostinho nos ensina que Maria acolheu plenamente a vontade do
Pai. Por isto ele é mais admirável e feliz por ser discípula de Cristo do que por
ser mãe de Cristo. Ela é feliz porque, já antes de dar à luz o Mestre, trazia-o
no coração.
Os evangelhos relatam que, quando uma mulher exclamou diante de Jesus
que é bem-aventurado o ventre que
gerou e o seio que o amamentou, ele disse que muito mais felizes aqueles que
ouvem a palavra de Deus e a guardam.
Também aqui, Maria é feliz porque ouviu a palavra de Deus e a guardou.
Guardou a verdade sobre a dignidade humana e a compaixão de Deus mais na mente do
que a carne no seio.
Maria Admirável, Maria Rainha, Maria Vencedora! Tudo isso é verdade, mas
a Igreja é maior que a Virgem Maria, diz Santo Agostinho. Maria é parte da
Igreja, membro santo, membro excelente, mas membro do corpo, cuja cabeça é o
Cristo.
Por isso, com
Maria somos peregrinos de esperança, e demonstramos isso na caminhada simbólica
que acabamos de fazer. Com Maria somos ouvintes e guardiães do Evangelho. Com
Maria reinamos de vencemos a tentação de ser indiferentes, de agredir e
cominar, de competir e derrotar, de consumir e acumular.
Com a Mãe e Rainha somos muitas vezes
admiráveis aos olhos de Deus se formos capazes de caminhar apressadamente para
servir quem necessita e depende de nós; se formos capazes de permanecer aos pés
da cruz daqueles que sofrem enfermidades, de quem não está sem casa e sem
guarida, da natureza devastada e agredida, dos cidadãos tratados como incômodos
que devem ser eliminados.
Com Maria somos vencedores e admiráveis se
não fecharmos os olhos aos miseráveis, se coroarmos de dignidade e
reconhecimento aquelas pessoas que nossa sociedade desigual e violenta insiste
em tratar como perdedores, sem dignidade, sem direitos, sem nada.
É da
contemplação de Jesus crucificado em meio a dois condenados, de braços abertos
e estendidos aos que sofrem com ele, de ouvidos fechados àqueles que o
desprezam e provocam, que brota a Esperança que nos faz peregrinos.
E então, dos
pés da cruz e dos crucificados, caminhamos com ele até a mesa dos peregrinos, a
essa mesa da eucaristia, e escutamos essas palavras que nos confirmam e
empoderam: “Isso é meu corpo, isso é meu sangue. É minha vida dada por vocês; é
a assinatura de uma aliança nova e eterna com a humanidade”.
E nos pede:
“Façam isso em memória de mim”, para que a humanidade seja mais humana, para
que o mundo seja mais justo e igualitário, para que a Esperança ocupe o lugar
do vazio, para que as igrejas e comunidades caminhem juntas, e não paralelas,
concorrentes ou em direções contrárias.
Assim
seremos cidadãos do Reino de Deus e irmãos do Rei Servidor, filhos legítimos da
Mãe Rainha e Vencedora mil vezes admirável e bendita pelo fruto do seu ventre,
Jesus!
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