quarta-feira, 8 de abril de 2020

ANO A | SEMANA SANTA | VIGÍLIA PASCAL | 11.04.2020


Renascidos pelo batismo, construamos uma Igreja em saída!
Como fazemos quando nos despedimos de uma pessoa querida, neste sábado reunimo-nos em vigília para ruminar a dor da perda, recapitular uma história, regar as frágeis sementes da nossa esperança. A escuta atenta e ritmada da Palavra que cria e sustenta a vida e a esperança pode nos ajudar neste tempo de espera vigilante e de decisões responsáveis. As vigílias sempre têm o objetivo de nos ajudar assumir a herança humana e espiritual de quem partiu, a levantar o olhar, a contemplar o horizonte.
Sendo recordação, a vigília é também saudade, espera e vazio: o vazio da libertação perdida, do desejo de plenitude prometida, do futuro que é espera. Por isso, é também um dolorido processo de despojamento dos estreitos conceitos, ambíguas ambições e despóticos senhores, a fim de purificarmos nosso olhar e sintonizarmos a vida com o Divino Mistério. Deus assume esse vazio e nele faz sua morada! No início de tudo, o Espírito pairava sobre a terra informe e vazia! Pelo batismo, fomos sepultados com Cristo!
O vazio da sepultura não comprova a ressurreição, mas ajuda a intuir que os corpos torturados e sepultados dos profetas e sonhadores não são a última palavra de Deus sobre a história. Na sepultura vazia, mulheres e anjos ensinam que o caos do lixo pode dar lugar a uma criação harmoniosa, que o mar ameaçador pode ser atravessado a pé enxuto, que os grupos dispersos podem ser reunidos, que as pandemias podem ser vencidas, que os crucificados caminham rumo às fronteiras, onde novas possibilidades estão em gestação.
É verdade que o Dia ainda não amanheceu plenamente, a liberdade não alcançou todos os seres humanos e a vitória não acontece no ritmo que desejamos. Mas os guardas do sistema tremem diante de mulheres e homens que caminham destemidos. O poder sobre a vida e a morte não está nas mãos deles! Precisamos nos abrir às novas possibilidades escondidas nas pessoas e nos caminhos da história, vibrar de alegria e sair correndo para anunciar aos outros esta Boa Notícia: “Ele não está aqui! Ressuscitou, como havia dito!”
As mulheres madrugadeiras nos ensinam que os sinais palpáveis da ressurreição só podem ser tocados na periferia – “Ele vai à vossa frente para a Galileia. Lá vós o vereis!” – ou numa Igreja em saída – “Ide anunciar aos meus irmãos que se dirijam para a Galileia. Lá eles me verão.” É neste caminho missionário que as duas mulheres reconhecem o Ressuscitado que vem ao encontro delas pedindo que se alegrem e não tenham medo. Não importam mais os lugares onde ele esteve; importa onde ele disse que estará nos esperando!
Como cristãos, somos chamados a completar em nossos corpos os sofrimentos de Cristo, a prolongar os sinais do esvaziamento por amor e a fazer germinar as sementes do Reino de Deus. A ressurreição se multiplica como semente no testemunho e nas iniciativas dos discípulos e discípulas, comunidades e Igrejas, grupos e movimentos. Os sinais são pequenos, mas reais e promissores. Como diz o Papa Francisco: “Não te rendas à noite, pois mundo caminha graças ao olhar de tantos homens que abriram frestas, que construíram pontes, que sonharam e acreditaram” (Texto-Base da CF, § 225).
O batismo, recordado nesta vigília, expressa este dinamismo pascal na vida de cada um de nós e da comunidade eclesial. Nele, dizemos que por Cristo, com Cristo e em Cristo fomos mortos e sepultados para os interesses egoístas e nascemos para uma outra realidade. Mortos para a lei que nos pede para levar vantagem em tudo e fechar os olhos à destruição do meio ambiente, somos livres para começar uma vida nova, no caminho aberto por Jesus Cristo. “Redescobrindo as águas do nosso batismo, as águas da bacia do lava-pés, precisamos colocar em atitudes a beleza de uma Igreja em saída” (Texto-Base da CF, § 169).
Jesus é como uma pedra que os construtores descartaram e foi por Deus transformada em pedra de ângulo, em pedra que sustenta todo o teto em forma de abóbada. Por isso, a Páscoa pede que abramos os olhos e as portas às pessoas e grupos sociais que são descartados como desnecessários ou eliminados como incômodos. Se não os tivermos no coração das nossas preocupações e projetos eclesiais, nossa fé é construção sobre a areia, nosso amor pode virar patologia e nossa utopia se deteriora em ideologia.
Deus Pai e Mãe, aqui estamos com as mãos calejadas nas semeaduras e os corpos grávidos de louca esperança. Não trouxemos perfumes, mas as marcas das lutas que travamos. As testemunhas da primeira hora nos ensinam que teu filho vive e marcou encontro conosco longe dos sedutores centros de poder. Ensina-nos a afagar a terra e fecundar o chão, nesta propícia estação de renascimento. Assim seja! Amém!
Itacir Brassiani msf

Gênesis 1,1-2,2 | Gênesis 22,1-18 | Isaías 51,1-11 | Ezequiel 36,16-28
Carta aos Romanos 6,3-11 | Salmo 117 (118) | Evangelho de São Mateus 28,1-10

Nenhum comentário: