Jesus marca encontro conosco nas encruzilhadas da vida!
O significado do
acontecimento pascal não se entrega à nossa compreensão de uma só vez. A
realidade viva e esperançosa que o evento da páscoa de Jesus nos abre precisa
de um longo tempo para germinar, crescer, florescer e frutificar. Por isso, com
sua peculiar sabedoria, a tradição cristã prolonga o evento pascal nas sete
semanas que se seguem à páscoa. Este período nos convida a descobrir e acolher
o dinamismo da ressurreição em suas múltiplas facetas, escondida nas tramas da
vida e na luminosidade discreta das liturgias.
Os evangelhos fazem
questão de não esconder as dificuldades a incrível lentidão com que os
discípulos e discípulas vão se abrindo à ressurreição de Jesus Cristo. O
episódio dos discípulos que voltam desolados à aldeia de Emaús é paradigmática.
Lucas diz que eles caminhavam desolados, e pareciam uma dupla de cegos. Eles
não conseguiam tirar da memória a imagem da prisão, do julgamento, da tortura e
da morte de Jesus na cruz. Para eles, o fracasso fora completo e arrasador, e
não havia como conciliar a esperança suscitada pelo ensino e pelo anúncio de
Jesus com um homem pregado na cruz em meio a outros proscritos.
O evangelista registra
que “o próprio Jesus se aproxima e começa a conversar com eles”. E começa
perguntando pelo conteúdo da conversa e pelo motivo da tristeza. Jesus não
chega impondo o tema ou desviando do assunto. Com a sabedoria de mestre, conduz
os discípulos ao núcleo da própria frustração, ao coração da própria dor, ao aspecto
central dos acontecimentos. E o faz caminhando com eles, num caminho de volta
ao passado, no qual dormiam as esperanças. Sem este primeiro momento, o anúncio
e o testemunho da ressurreição poderia cair no vazio ou resvalar para o
cinismo.
Caminhando e
dialogando com os discípulos, Jesus provoca neles a abertura a uma imagem de
Deus despida das marcas do poder e do saber. Obcecados por certa imagem de Deus
e machucados pelo desengano de suas esperanças, eles não conseguem compreender
nada. Mas a perseverança de Jesus acaba abrindo algumas pequenas brechas na terra
seca dos seus pensamentos e sentimentos. Eles se dão conta de que já é tarde e
a noite se aproxima. Percebem claramente que um caminho sem esperanças não leva
a lugar nenhum. E sentem necessidade de um companheiro com quem possam dividir
o pão da dor.
A sede de companhia, somada
ao desejo de repartir o pouco que lhes resta, faz a diferença e abre as portas.
Acolhendo o anônimo companheiro de caminhada e partilhando com ele a vida e o
pão, os discípulos passam da cegueira à visão, da frustração à alegria, da
escuridão à luz. A hospitalidade e a partilha dão a eles a possibilidade de
fazer uma releitura do percurso vivido, compreender melhor o que sentem e
descobrir o significado profundo dos acontecimentos que vivem. Só então eles
dão atenção àquilo que sentiam quando escutavam a Palavra. “Não estava o nosso
coração ardendo quando ele nos falava pelo caminho?”
A seu modo, Pedro
demonstra que os apóstolos também aprenderam esta lição. Com uma coragem
inexplicável, ele se dirige aos habitantes de Jerusalém e aos peregrinos,
convida-os a compreender o sentido do que estava acontecendo naquela manhã em
que o fogo do Espírito abria portas e caminhos, concedia sabedoria e
inteligência, chamava e enviava: aquele Jesus de Nazaré que fora humilhado até
o extremo havia sido exaltado ao máximo. “Não era possível que a morte o
dominasse... Deus o ressuscitou dos mortos e lhe deu a glória...” E nos
acompanha neste tempo em que somos todos migrantes em distanciamento social.
A fé cristã se
fundamenta no testemunho, na experiência pessoal ou dos outros. Cremos porque
há uma corrente de homens e mulheres que deram prosseguimento ao caminho e ao
projeto vivido por Jesus Cristo. Nesta “nuvem de testemunhas” Cristo se mostra
vivo e ressuscitado. Os sacramentos partem dessa realidade e a ela nos conduzem.
Se esta corrente de testemunhas não continuar, os frutos da ressurreição não
chegam à mesa de ninguém. Por isso, cada geração de cristãos precisa recriar o
testemunho do Ressuscitado, discernindo as exigências e oportunidades próprias
do seu tempo.
Deus da vida:
nossos pais e antepassados na fé nos ensinaram a te chamar de pai, mas mostras
que tens um coração de mãe. Tu nos acompanhas nas curvas sombrias dos nossos
fracassos individuais e coletivos, nos confortas no aconchego do teu colo,
seguras nossa mão e guias nossos passos incertos, abres nossos olhos para
encarar a realidade, encorajas à fidelidade criativa e responsável. Vem em
nosso auxílio na aventura de transformar a fé na ressurreição do teu filho em
projeto de uma vida comprometida com os pobres, doada sem reservas e sem
condições. Assim seja, nestes tempos de pandemia e distanciamento social! Amém!
Itacir Brassiani msf
Nenhum comentário:
Postar um comentário