Contaminemos o mundo com o testemunho de esperança!
Chegamos à festa que
preparamos com tanto empenho nas últimas cinco semanas. Trazemos em nós a
memória agradecida da aliança realizada na última ceia e nas muitas e
solidárias ceias penúltimas. Trazemos nos olhos o sinal luminoso das mãos
perfuradas e dos braços abertos em forma de cruz, prontos a abraçar a
humanidade inteira. Partilhamos com Madalena o vazio de uma ausência querida.
Trazemos na mente e no ventre o trabalho das mulheres e homens, comunidades e
movimentos que, no escuro da noite, prepararam tecidos e perfumes para não
permitir que morram os sutis fios da vida.
A Páscoa celebra o
reconhecimento de Jesus – o profeta perseguido e assassinado, aquele que é
nossa paz, e criou unidade na divisão – como Filho de Deus. Proclama que nele
Deus vence todas as formas de morte, desde a morte física até a morte progressiva
e massiva, resultado das estruturas iníquas e dos poderes indiferentes à
pandemia e à vida de 320 mil pessoas vitimadas. Anuncia que Jesus, considerado
uma pedra sem utilidade na manutenção do mundo velho, foi considerado por Deus
como pedra fundamental na construção de um mundo novo. Afirma que nossa
esperança, mesmo que dance na corda bamba, tem sentido e tem futuro.
A Páscoa de Jesus de
Nazaré e dos cristãos celebra as milhares de possibilidades escondidas na vida
de cada pessoa e na história da humanidade. Afirma que a última palavra não
será sempre do discurso frio daqueles que impõem sua injusta ordem, calam os
profetas, descumprem as regras de precaução e ironizam as vítimas. Proclama que
a ação realmente eficaz e grávida de futuro é aquela que estabelece a absoluta
superioridade do outro necessitado. Evidencia
que a direção certa e o sentido da vida estão na atitude permanente de tolerância,
diálogo e irmandade, no fazer-se tutor/a e cuidador/a da vida do outro.
E essa ressurreição
não é algo que se manifesta apenas depois da morte. Paulo nos surpreende
afirmando que os cristãos já fomos ressuscitados/as! Ele se refere ao dinamismo
pascal do nosso batismo, que possibilita e pede a passagem de uma vida
individualista a uma vida plena e solidária. “Procurem as coisas do alto”,
exorta-nos Paulo. E isso significa assumir um estilo de vida centrado no amor, no
diálogo, no serviço, na superação de todas as formas de intolerância mediante o
diálogo respeitoso e fraterno. O pecado ainda
não perdeu totalmente sua influência, mas está mortalmente ferido, e não manda
mais sobre nós.
A ressurreição de
Jesus não é algo que se impõe com força de evidência, e não vem acompanhada de
manifestações potentes. O dia já havia amanhecido, mas na cabeça de Maria
Madalena e dos apóstolos a experiência do fracasso pairava como escuridão, como
muitos operadores/as de saúde, exaustos nas UTI’s, UPA’s e enfermarias. Só muito lentamente eles foram percebendo que
os lençóis estendidos não estavam lá para cobrir um morto mas para acolher as
núpcias de uma nova aliança. O sudário sim, depois de cobrir a cabeça de Jesus,
agora estava à parte e envolvia totalmente o templo, lugar onde a
morte fora tramada e decidida.
Lembremos que a Páscoa
de Jesus de Nazaré inaugura uma Nova Criação. Ressuscitando e trazendo no corpo
as marcas dos pregos e da lança, ele é o Homem Novo, o Novo Adão, o Irmão
primogênito e solidário de todos os homens e mulheres. Os discípulos e discípulas
nos reunimos em torno da sua memória e organizamos comunidades que continuam
seu sonho e seu caminho. E as pessoas acolhidas nestas comunidades estabelecem
vínculos que formam um Novo Povo de Deus, a comunhão dos grupos e movimentos de
servidores, de gente que luta por vida abundante para todos.
Pedro sublinha que
Jesus andou por toda parte fazendo o bem e agindo sem medo, apesar da violência
que havia levado João Batista à morte. Enfatiza que Deus estava com Jesus de
Nazaré, inclusive no vazio e escuro da cruz, quando parecia havê-lo abandonado.
Ensina que Deus o ressuscitou dos mortos, e transformou em juiz aquele que fora
réu de morte. E lembra que os discípulos e discípulas, apesar da dificuldade de
acreditar nele e da permanente tentação de abandoná-lo, somos constituídos
testemunhas e pregadores dessa Boa Notícia.
Jesus de Nazaré, filho amado de Deus, que derrubaste
os muros que separam e nos destes a Paz! Aqui estamos reunidos para festejar
contigo, para celebrar a festa dos pequenos. É uma festa que não serve os bens
roubados aos fracos e não ostenta a indiferença dos cínicos, assassinos por
omissão. É com alegria que descobrimos que o mistério da vida ressuscitada não
é uma mentira, e se dissemina em tantas pessoas e grupos, inclusive naqueles
que se desdobram dia e noite nos hospitais. Por isso, celebramos nossa páscoa
na tua páscoa, e saímos apressados para testemunhar que a vida é mais forte que
a morte, e que o amor é imortal. Assim seja! Amém!
Itacir Brassiani msf
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