quinta-feira, 7 de julho de 2022

ANO C | TEMPO COMUM | DÉCIMO QUINTO DOMINGO | 10.07.2022

A compaixão é o segredo da felicidade e da fraternidade.

Por detrás da pergunta sobre como ganhar a vida eterna está a ideia de salvação, de uma vida madura e plenamente realizada. E a discussão que perpassa os evangelhos é sobre o caminho mais dire seguro para salvação. E este caminho não e a submissão à lei, como ensinavam os escribas e fariseus, mas outro caminho, menos rígido, mais humano e misericordioso.

Para Jesus, o caminho da salvação não passa pelo cumprimento escrupuloso da lei mas pela compaixão para com as vítimas e todos os sofredores, mediante ações concretas de solidariedade. Nada de indiferença diante do sofrimento humano. Para ele, o amor pleno a Deus se concretiza na ação urgente e generosa em benefício das pessoas necessitadas.

Esta é a reposta de Jesus à pergunta do doutor da lei. Mas o homem da lei se esconde atrás da discussão sobre quem é o nosso próximo. Jesus não acrescenta mais uma norma ao monte de leis que existiam. Ele estabelece uma perspectiva nova e exigente: a aproximação e o socorro a quem mais necessita. Quem fica perguntando “quem é o meu próximo?”, ou “o que eu tenho a ver com ele”, perdeu o rumo e o ritmo do Evangelho.

Jesus evita cair numa discussão abstrata e infinita em tordo da definição teórica do conceito de “próximo”. O porta-voz do judaísmo sabe muito bem como a lei de Moisés descreve o próximo a quem o judeu deve amor: a pessoa pertencente à família, à tribo, ao clã, à nação; e, eventualmente, o hóspede, fosse ele um escravo ou um estrangeiro peregrino. Aos outros, pode-se mostrar indiferença, desprezo e até ódio.

Jesus prefere abordar essa questão crucial recorrendo a uma parábola. O sacerdote e o levita são personagens que representam claramente o judeu piedoso e correto, dedicado ao templo e ao cumprimento das leis. O samaritano representa todos os grupos étnicos e povos que os judeus desprezam, criticam e excluem, o pecador típico, aquele que vive à margem da lei e a transgride irremediavelmente.

Para Jesus, a solidariedade concreta e desinteressada vale mais que culto e a lei. É ela a motoniveladora que abre largos caminhos para a salvação, a virtude que desvela uma vida madura e plena. E o samaritano – considerado herético, bastardo e impuro pelos judeus – está mais próximo de Deus que o sacerdote e o levita, porque se aproxima da pessoa ferida e é compassivo, enquanto que o sacerdote e o levita, obcecados pelas leis e pelo templo, se afastam dela e se mostram indiferentes.

Jesus inverte a pergunta do escriba e pergunta pelo sujeito e não pelo objeto do amor. Com a parábola, não apresenta apenas um belo exemplo, mas abre uma nova perspectiva. O amor concreto é solicitado e definido pela pessoa necessitada, que pode ser até inimiga. O amor nos faz livres e criativos! O paradoxo é que o protótipo do amor que nos salva e nos redime é a pessoa mais desprezada, e o doutor da lei deve imitá-lo.

Recentemente o Papa Francisco nos brindou com uma profética e interpeladora exortação: Fratelli Tutti. Nela, o Papa argentino toma a cena do samaritano como fio condutor de uma rica abordagem sobre a amizade social e a fraternidade sem fronteiras. E chama nossa atenção para um paradoxo: os personagens mais piedosos são os que mostram maior indiferença e negam a solidariedade que gera um mundo fraterno. São eles que arruínam os mais profundos desejos de uma fraternidade que inclua todas as criaturas e comece pelas mais frágeis.

Jesus de Nazaré, divina humanidade que se aproxima de todos os homens e mulheres assaltados, dominados e abandonados mais mortos que vivos nas sarjetas do mundo: nós te agradecemos porque não tomas distância nem fazes volta para desviar de nossa bela e chagada humanidade. E te pedimos a graça de ser semelhantes a ti, visceralmente humanos e iluminadamente divinos, pois é isso que nos proporciona a vida eterna. Assim seja! Amém!

Itacir Brassiani msf

 Livro do Deuteronômio 30,10-14 | Salmo 68 (69) | Carta de Paulo  aos Colossenses 1,15-20 |  Evangelho  de São  Lucas (10,25-37)

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